A Hora da Ciência: A vantagem das variantes

Entenda como surgem as variantes dos vírus e por que, na pandemia de Covid, a Delta preocupa | Fantástico | G1

O Globo 
Colunista: Natalia Pasternak

Por que certas variantes do vírus Sars-CoV-2 se tornam prevalentes em uma população? E por que isso é preocupante? Mutações em vírus são comuns, ocorrem ao acaso e podem ou não trazer vantagens (para o vírus). Em geral, não fazem diferença. Muitas vezes, são prejudiciais, e os vírus que as carregam desaparecem. Poucas vezes, oferecem alguma vantagem: melhor capacidade de infectar a célula, um dom especial para evitar anticorpos. Essas vantagens acabam colocando o vírus da variante sortuda à frente na corrida com as demais. Mutações ocorrem ao acaso e o tempo todo, logo sempre temos diversas variantes circulando ao mesmo tempo, inclusive dentro de uma mesma pessoa. Mas a que tem vantagens passa na frente.

A entrada na célula é uma etapa importante da corrida. Quem conseguir entrar mais rápido, e em mais células, ganha a competição e deixa mais descendentes, que, por sua vez, têm as mesmas vantagens. No caso do Sars-CoV-2, a entrada depende da famosa proteína S. Ela é a “chave” que dá ao vírus acesso à célula. Mas, para abrir a fechadura, essa chave precisa estar preparada.

Em vez de pensar em chaves mecânicas, vamos imaginar que as proteínas S são cartões magnéticos, como os usados em quartos de hotel. Quando o vírus está sendo montado dentro de uma célula infectada, várias proteínas S — os cartões — são postos em sua superfície. Mas um cartão só funciona se estiver programado para ser lido pelo sensor que vai destravar a porta (no caso da célula humana, esse sensor é a proteína TMPRSS2). Ou seja, as diversas chaves precisam ser programadas, e só então uma outra proteína as aceita e permite que abram a porta da célula.

Essa etapa de programação é onde as mutações parecem estar ajudando as variantes. É como se as proteínas S viessem, “de fábrica”, desativadas, ou desprogramadas. Se uma mutação faz com que mais chaves se ativem, o potencial de infecção aumenta, o vírus tem mais chaves prontas para infectar.

De acordo com pesquisas ainda preliminares, o Sars-CoV original, aquele da epidemia de Sars de 2002, costuma vir de fábrica com 10% das suas proteínas S corretamente programadas. Já o nosso Sars-CoV-2 vem com 50%. E a variante Delta, com 75%. Essa é uma explicação para a maior infectividade dessas variantes, mas não a única. Ainda pode ser que elas também consigam escapar do sistema imune, e que tenham outras vantagens durante o ciclo de replicação. Ainda não se sabe quantas proteínas S ativadas são necessárias para uma infecção bem sucedida, ou quando elas são reconhecidas pela proteína que facilita a fusão de membrana — o momento onde a chave é aceita pelo sensor e abre a porta da célula.

Mas certamente ter mais chaves preparadas para abrir a fechadura já garante uma capacidade de contágio bem maior. As vacinas parecem estar dando conta da variante Delta, mas o fato de termos um vírus que se espalha mais facilmente ainda do que o original que começou esta pandemia não deve ser negligenciado. É mais um motivo para vacinarmos rapidamente, e não relaxarmos as medidas preventivas.

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