A Hora da Ciência: Onda nova, erros velhos

O Globo
Colunista: Natalia Pasternak

O número de casos e hospitalizações por Covid-19 subiu na Europa. Subiu também nos EUA. Na Itália e França, hospitais lotados sinalizam a necessidade de medidas drásticas de quarentena. Mas aqui no Brasil, seguimos com vida normal, acreditando que nada acontecerá: porque somos mágicos. Ou, de forma fatalista, que o que tiver que ser, será, todos vamos morrer um dia, toca pra frente. Essas notícias e sentimentos soam atuais, mas na verdade são dos jornais de março passado.

No início da pandemia, vimos o crescimento de casos e mortes na Europa. Vimos o sistema de saúde da Itália desmoronar. Lemos relatos chocantes de médicos forçados a escolher quem teria acesso a respirador e quem seria deixado para morrer. E, assistindo a tudo isso, não nos preparamos, porque afinal, somos mágicos. A pandemia não ia chegar aqui.

Se chegasse, não seria tão forte. Aqui faz calor. O país é muito grande. Até chegar, já vai ter remédio. Imagina, cancelar o carnaval!

E o vírus chegou. Veio para ficar, e sem pressa de ir embora. Ele concorda conosco, o país é grande. Gostou daqui. O número de casos foi subindo, e o de mortes também. Alguns estados adotaram medidas de contenção, outros, não. O presidente falou “e daí”, e mandou encararmos a pandemia como homens. E o remédio não veio.

Como é típico de pandemias, com o tempo os casos foram diminuindo. Dependendo da adesão da população às medidas preventivas, os casos e mortes caíam mais ou menos depressa. Na Europa, tudo parecia controlado. Era a primeira onda chegando ao fim. A Europa foi reabrindo. E a população, cansada de tantas regras, relaxou. Veio o verão. Os jovens viajaram, foram a bares, restaurantes. E veio a segunda onda. Hospitais começaram a lotar. A França, novamente com suas UTIs lotadas, já pensa em mandar pacientes para a Alemanha. Itália implementa quarentena rigorosa.

Aqui no Brasil, a primeira onda nem acabou. A epidemia atingiu um platô que parece se estender indefinidamente. E pensamos: a segunda onda não vai acontecer aqui. Temos imunidade de rebanho. Aqui é verão, lá é inverno. Já reabrimos faz mais de um mês e não aconteceu nada. E daqui a pouco tem vacina.

Enquanto alguns sonham com a Fada do Vermífugo, UTIs lotam de novo. Mesmo com a subnotificação, o número de casos cresce desde outubro. E vacina, só no ano que vem. Estamos no verão sim, igualzinho à Europa, antes da segunda onda. E aqui, junto com o verão, temos as festas de fim de ano. Imagina, cancelar o réveillon!

Aprendemos muito desde março. É absurdo errar tanto outra vez. Certamente todos estão cansados desta quarentena prolongada. E é possível escapar um pouco, mas com responsabilidade: usar espaços abertos, sempre de máscara. Evitar aglomerações. Precisamos de mais parques e menos bares e shoppings. E, quem puder, trabalhe de casa.

É hora de ouvir o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom: “Nós estamos cansados do vírus, mas o vírus não está cansado de nós”.

Enviar-me um e-mail quando as pessoas deixarem os seus comentários –

DikaJob de

Para adicionar comentários, você deve ser membro de DikaJob.

Join DikaJob

Faça seu post no DikaJob