A nova onda das fusões

72-3.jpg?profile=RESIZE_710x

APETITE: Ritmo de compras de empresas em solo brasileiro continua na americana DaVita, comandada por Bruno Haddad. (Crédito: Claudio Gatti)

Enquanto o mercado de aquisições e integrações está quase congelado, algumas empresas saem às compras. No pós-crise, o atual represamento de transações poderá resultar num boom?

Carlos Eduardo Valim

Isto É Dinheiro

O mundo mudou. A frase ouvida, e sentida, por quase todos nas últimas semanas faz ainda mais sentido para quem estava em qualquer uma das pontas da mesa de negociações de alguma fusão ou aquisição logo antes da avassaladora chegada das contaminações com o novo coronavírus. O aumento da incerteza, causada pela volatilidade dos mercados e pelas previsões contrastantes sobre o tempo necessário de isolamento social, fez diversas transações serem interrompidas temporariamente ou canceladas de vez. Há quem, no entanto, mantenha o ritmo de compras durante a pandemia. Mesmo que de forma muito diferente do que fazia antes, as aquisições continuam fazendo parte da rotina de Bruno Haddad, presidente da operação brasileira da DaVita, empresa americana especializada em serviços de diálise e dona de faturamento anual de US$ 11,4 bilhões. “Em média, contratamos entre 60 e 90 funcionários todo mês e ainda fazemos pelo menos uma aquisição de clínica”, diz o executivo. “A nossa expectativa é continuar com o nível de investimentos e de crescimento por este ano.”

A meta de atingir a marca de R$ 1 bilhão de faturamento no Brasil até 2022 não mudou. Para isso acontecer, o plano de crescimento de 60% ao ano está inalterado. Desde que a empresa comprou a sua primeira clínica no Brasil, em 2016, aproveitando a abertura do mercado de saúde para companhias estrangeiras, a DaVita foi consolidando o mercado. Em 42 meses, adquiriu 55 operações, para chegar ao porte atual de 48 clínicas e seis unidades de atendimento intra-hospitalar, além de um centro de acesso vascular.

Nos primeiros 100 dias de 2020, parece até que o mundo não mudou para a empresa: foram cinco aquisições. Ao todo, o investimento foi de R$ 100 milhões em expansões, considerando também a compra de máquinas. Duas das aquisições aconteceram em mercados novos para a empresa – Natal e Goiânia –, a última delas na segunda-feira 13. “O número de clínicas avaliadas para aquisição até aumentou com a crise”, afirma Haddad. “A demanda atual gera um desafio claro para as clínicas menores, que não têm grande capacidade de investimentos, e elas reveem os seus planos de continuarem independentes.” De fato, um dos efeitos do tratamento de doentes graves da Covid-19 é o aumento do uso de máquinas de hemodiálise, por conta de falhas nos rins de diversos pacientes. A DaVita já percebeu aumento de cerca de 20% na demanda intra-hospitalar desde o início da epidemia.

Com a necessidade de isolamento, o que mais mudou na rotina de Haddad e de sua equipe de aquisições foi a intensificação do trabalho a distância. Os processos de compras ainda levam o tempo usual, entre quatro meses a um ano, desde a auditoria prévia ao fechamento da transação. “A grande dificuldade está em estruturar uma forma de fechar aquisições a distância”, diz Haddad. Finalizada a compra, começa a fase de integração, que precisa ser feita presencialmente. Na compra da clínica de Goiânia, um pequeno grupo gestor foi deslocado de Brasília para evitar viagens aéreas. O desafio é aprender rapidamente como se adaptar aos novos processos em épocas de pandemia. Isso serve para todos os envolvidos. Não só para os negociadores das empresas, que ficam sem a possibilidade de fazer presencialmente o jogo de cena de cena de mostrar desinteresse para conseguir um acordo mais favorável, mas também para os advogados responsáveis pelos contratos e consultores especializados em fusões. José Diaz, sócio de fusões e aquisições do escritório de advocacia Demarest, diz que mudou o dia a dia. “Em vez de ficarmos cinco dias trancados numa sala com um monte de papel e sem dormir, levamos dez dias em conversas por videoconferência”, afirma. “Estamos aprendendo a ganhar mais eficiência. Trancado numa sala é mais rápido. Agora, o documento vai e volta, mas no fim chegamos no mesmo lugar.” O escritório atende a DaVita em seus processos de aquisições, mas também foi responsável pelo negócio que talvez tenha sido o mais relevante ocorrido no Brasil nas primeiras semanas de abril. A canadense Nutrien, uma das maiores empresas de fertilizantes do mundo, anunciou a compra do grupo goiano Tec Agro, distribuidor de insumos e dono de uma marca de sementes de soja.

70-3.jpg?profile=RESIZE_710xDivulgação

A transação avaliada em torno de R$ 600 milhões praticamente dobrará o tamanho da Nutrien no Brasil, para um faturamento anual de cerca de R$ 2 bilhões. “Alguns setores se mostram mais resilientes”, afirma Diaz. “Na agricultura, contando a área alimentar e florestal, as negociações continuam acontecendo como se não houvesse essa crise toda.” Além do campo, as discussões continuam entre empresas de tecnologia, de educação a distância e em áreas de saúde que não estão sendo diretamente impactadas pela explosão de pacientes da Covid-19 – como diz uma fonte do setor, alguns empresários da saúde têm os recursos e as oportunidades para fazer as aquisições agora, mas estão sem tempo ou cabeça para cuidar disso. Na quinta-feira 23, foi a vez do UOL anunciar a venda de sua operação de centro de dados, UD Tecnologia, para o fundo de investimentos americano Digital Colony, num negócio estimado em R$ 1,5 bilhão.

Por outro lado, entre os setores extremamente afetados pela crise estão a indústria, em especial, a de mineração e a petroquímica, e o setor de infraestrutura. Segundo Diaz, “também sumiu aquele dinheiro mais arriscado, para investir em startups.” Grandes processos que estavam no radar estão interrompidos e podem levar muitos meses para serem finalizados – se forem algum dia. São os casos da venda de refinarias da Petrobras (leia mais sobre privatizações na página 24) e da operadora de telefonia Oi. Também interrompeu tratativas o grupo Bloomin’ Brands, que colocou a rede de restaurantes Outback à disposição. O ativo interessava ao fundo Advent e à rede de hamburguerias Madero. A última entrou em processo de demissão de 600 pessoas e parece agora mais preocupada em atravessar a crise que expandir.

Enviar-me um e-mail quando as pessoas deixarem os seus comentários –

DikaJob de

Para adicionar comentários, você deve ser membro de DikaJob.

Join DikaJob

Faça seu post no DikaJob