Valor Econômico
Jornalista: Victor Mallet
06/05/20 - A covid-19 pode ter infectado pessoas na França semanas antes de ter sido oficialmente detectada na Europa, possivelmente até antes de os primeiros casos da doença terem sido anunciados na China em dezembro, segundo cientistas e médicos que analisaram amostras do vírus.
Num hospital no norte de Paris, amostras de pacientes com sintomas parecidos ao de pneumonia voltaram a ser testadas e foi encontrado um caso positivo de coronavírus num paciente atendido no fim de 2019. Os trabalhos foram descritos num estudo publicado nesta semana no “International Journal of Antimicrobial Agents”.
“Tivemos um caso de covid-19 positivo em 27 de dezembro, que foi internado no [hospital] Jean-Verdier”, afirmou Yves Cohen, chefe de terapia intensiva em dois hospitais em Seine-Saint-Denis (região ao norte de Paris) e um dos colaboradores do estudo, à rede de TV francesa BFMTV.
“Não é de surpreender quando você considera que Organização Mundial da Saúde [OMS] anunciou que [o vírus] estava circulando na China desde ao menos 8 de dezembro. Em vista do volume de viagens, é normal que o vírus tenha logo aparecido na França.”
A França registrou a primeira morte por covid-19 na Europa Ocidental em 15 de fevereiro, quando um turista chinês de Hubei morreu em um hospital de Paris após chegar ao país em 25 de janeiro.
Já a Suécia pode ter tido seu primeiro caso de coronavírus em novembro, segundo o epidemiologista-chefe do país. Viajantes de Wuhan, cidade chinesa onde se acredita que surgiu o vírus, provavelmente visitaram o país em novembro ou dezembro, disse Anders Tegnell à mídia local. “Não seria de forma alguma estranho [que tivessem o vírus].”
O primeiro caso oficial na Suécia, uma mulher de 20 anos voltando de uma viagem a Wuhan, foi registrado em janeiro.
A Organização Mundial da Saúde pediu ontem a todos os países que investiguem possíveis casos anteriores de coronavírus.
O paciente francês de covid-19, cuja infecção foi confirmada em dois tipos de teste genético, é um homem de 42 anos, nascido na Argélia, que havia viajado ao exterior pela última vez em julho de 2019, mas que tinha um filho com sintomas de gripe. Ele se recuperou.
“Identificar o primeiro paciente infectado é de grande interesse epidemiológico, já que muda drasticamente nosso conhecimento sobre o sars-cov-2 e sua disseminação no país”, diz o estudo. “Além disso, a ausência de ligação [do paciente] com a China e de viagens recentes sugerem que a doença já estava se disseminando entre a população francesa no fim de dezembro de 2019.”
Mais de 25 mil pessoas morreram de covid-19 em hospitais e asilos para idosos na França desde 1º de março, embora a disseminação tenha diminuído muito desde a imposição de medidas de confinamento, em 17 de março. Seine-Saint-Denis e Paris estão entre as áreas mais atingidas.
Outro estudo de cientistas do Instituto Pasteur, da França, também concluiu que o coronavírus pode ter circulado no país em fevereiro, antes do aparecimento de uma série de surtos que foram controlados subsequentemente por meio de testes e quarentena.
Os autores dizem que os dados do genoma “implicam a circulação local do vírus em infecções não documentadas anteriores à onda de casos de covid-19”.
As análises de diferentes cepas de covid-19 os levaram a inferir “que o vírus estava circulando silenciosamente na França em fevereiro”.
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