Empresários apostam no mercado da cannabis em meio a debate legal

Folha de S.Paulo 
Jornalista: Marília Miragaia

07/06/21 – De olho no mercado externo e em meio ao debate sobre regulamentação, empresários brasileiros investem em negócios ligados à canabis, incluindo aqueles que vão além do setor medicinal —como o têxtil e o de beleza.

Só o mercado de canabis medicinal está estimado até 2024 em US$ 62,7 bilhões no mundo e US$ 6,6 bilhões na América Latina, segundo o documento “The Global Cannabis Report”, produzido pela Prohibition Partners.

No Brasil, uma parte desses negócios já opera, mas existe a expectativa que a demanda seja aquecida caso o país permita o cultivo. Um PL (projeto de lei) que regulamenta o plantio da canabis para fins medicinais e o do cânhamo industrial tem previsão de ser votado nesta terça (8), em comissão especial na Câmara dos Deputados. O texto não prevê o uso recreativo.

Cânhamo é como são chamadas as plantas com baixo teor de substâncias psicoativas, sem efeitos euforizantes. É uma fonte para extração de CBD (canabidiol), componente empregado em tratamentos médicos, e de fibras aproveitadas por diferentes indústrias.

Mesmo que o PL seja rejeitado —o presidente Jair Bolsonaro afirmou que vai barrar a proposta caso o Congresso a aprove—, a pressão de setores interessados nas oportunidades do cânhamo deve fazer com que a pauta seja retomada, diz Thiago Ermano, diretor-presidente da Abicann (Associação Brasileira das Indústrias de Cannabis).

Em outros países, o cânhamo é usado na rotação de culturas no campo e como matéria-prima de diversas indústrias, como a têxtil, de construção e a cosmética. Com boas condições de plantio, o Brasil poderia se tornar um produtor competitivo, afirma Rodrigo Mattos, analista da Euromonitor International.

A sustentabilidade motivou a empresária Renata Lima, 38, a abrir a tecelagem Queen Co. no fim do ano passado, depois de conhecer o cultivo e processamento do cânhamo na Austrália, onde morou.

“Uma camiseta de cânhamo precisa de menos água para ser feita do que uma de algodão e dura mais”, diz ela, que também trabalha com outras fibras naturais.

Por enquanto, Renata importa os fios da matéria-prima. O primeiro lote de tecido de cânhamo fica pronto em julho e foi comprado por uma empresa que buscava um material resistente e ecológico para fabricar bolsas térmicas.

Segundo ela, o cultivo da planta no Brasil reduziria, em dez anos, o preço de venda do tecido de cerca de R$ 200 o metro quadrado para R$ 40.

Outro mercado que vem ganhando destaque fora do país é o de cosméticos com canabidiol. Marcas como a inglesa The Body Shop passaram a incluir o CBD em produtos como cremes e máscaras.

A Avon também conta com uma linha que tem a substância em sua fórmula, vendida no Reino Unido. Segundo estudo da companhia, o CBD tem ação antienvelhecimento na pele.
Esse mercado também despertou a atenção da brasileira Barbara Arranz, 33, que mora em Madri, na Espanha, e está à frente da LCB Global, que atua na Europa com produtos terapêuticos e cosméticos.

Barbara teve contato com o assunto ao usar canabidiol no tratamento de uma síndrome do filho. No ano passado, mudou de país para investir no setor. Hoje, além do óleo de CBD, que exporta para o Brasil, também vende na Europa itens como um tônico facial que leva esse princípio.

A empresária faturou R$ 3 milhões em 2020 e quer abrir unidades físicas em Madri. Caso a regulamentação aconteça, ela cogita investir no Brasil.

Para Marcelo De Vita Grecco, 49, cofundador do The Green Hub, consultoria e aceleradora com foco no setor, não é preciso esperar uma regulamentação para atuar no país, mas é necessário buscar qualificação para entender melhor o mercado e as possibilidades de financiamento.

Além das oportunidades já viáveis, como às ligadas aos setores médico, farmacêutico, científico e educacional, ele afirma que há a chance de atuar no mercado externo.
A agência Jamba Estúdios foi uma das empresas selecionadas para o programa de investimento mantido pelo The Green Hub e apoiado pela divisão Life Science da empresa alemã Merck.

Fundada há um ano, a Jamba trabalha com projetos editoriais e culturais ligados à cânabis e tem marcado para julho o seu primeiro lançamento —a história em quadrinhos de uma mãe em busca de tratamento para o filho.

A agência também quer produzir conteúdo para outras companhias ligadas à cânabis, afirma Luiz Mandara, 35, diretor-executivo. Ainda em processo de aceleração, a empresa faturou cerca de R$ 70 mil no primeiro ano e espera duplicar esse número no segundo, enquanto se prepara para uma possível regulamentação.

Para a empresária Danila Moura, 37, o momento pré-regulamentação é propício para estruturar novos negócios. “É menos difícil começar agora, enquanto grandes players ainda não estão atuando e a concorrência é menor.” Em parceria com Katia Cesana, 47, ela comanda a Xah com Mariaz, que dá consultoria a mulheres que desejam empreender no setor canábico. A empresa é acelerada pela B2Mamy em programa apoiado pelo Google for Startups.

Para Tarso Araujo, diretor-executivo da BR Cann (Associação Brasileira das Indústrias de Canabinoides), o mercado medicinal e farmacêutico demanda grandes investimentos, mas ainda assim tem oportunidades para pequenos empresários.

“Nos próximos anos, poderemos ver o surgimento de empresas para atender o mercado de cânabis. Isso já está acontecendo, mas com o PL a expectativa é que esses negócios se multipliquem”, diz.

A fintech CannaPag foi idealizada para atender empresas do setor e pacientes de cânabis medicinal, que muitas vezes têm transações barradas, diz Mizael Cabral, 49, um dos sócios. Ele afirma que negócios do setor sofrem com a estigmatização e têm dificuldades para ter acesso a crédito.

“Também tivemos problemas para estruturar a fintech. Demorou até que conseguíssemos parceiros tecnológicos.” Em fase final de desenvolvimento, a startup vai oferecer sistemas de pagamento para ecommerce, contas digitais e máquinas de cartão.

“É uma questão de tempo até o mercado se abrir. Estamos nos adiantando a isso.”

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