Especial Saúde: Consulta on-line é tendência irreversível

Valor Econômico 
Jornalista: Marleine Cohen

27/08/20 - Ano de 1969: distantes mais de 300 mil km de casa, os astronautas americanos que pela primeira vez sondavam a Lua apresentaram sinais alterados de frequência cardíaca, pressão arterial e temperatura corporal. Era imperioso que os cientistas da Nasa encontrassem formas de monitoramento remoto das funções fisiológicas desses viajantes espaciais submetidos à gravidade zero. Assim teve início a telemedicina. Desde então, a prática se difundiu pelo mundo, com novas tecnologias e protocolos que sofisticaram a perícia médica, apoiando melhores diagnósticos.

Em ano de pré-pandemia, cerca de US$ 18 milhões foram investidos no segmento, no Brasil, segundo dados do relatório do Distrito HealthTech Report - o que corresponde a quase 8% dos recursos injetados em healthtechs em 2019.

Regulado pela resolução 1.643/2002 do Conselho Federal de Medicina (CFM), o exercício da medicina a distância no Brasil ganhou fôlego a partir de março, quando a adoção, em caráter excepcional, de modalidades de atendimento on-line foi reconhecida pelo Ministério da Saúde através da portaria 467.

No centro das discussões, a telemedicina começou então a dividir opiniões: se por um lado, era ferramenta suficientemente ágil para viabilizar o distanciamento social preconizado nos primeiros meses da pandemia, por outro suscitava dúvidas quanto à qualidade da consulta.

Enquanto isso, jovens startups e empresas tradicionais se amoldavam à febre por atendimento a distância que tomou conta do país, investindo energia e dinheiro em igual proporção ao número de potenciais usuários da telemedicina: se a faixa etária de maior risco para a covid-19 era a terceira idade, a Prevent Sênior, que opera junto a 485 mil conveniados com cerca de 68 anos, reforçou suas frentes de operação, elegendo como principais credenciais dos serviços remotos a consolidação do prontuário eletrônico do paciente, a certificação digital do médico, a teletriagem a cargo de enfermeiros, o follow-up ativo e uma tecnologia israelense de aferição dos sinais fisiológicos do doente por algoritmo.

“As quase 2 mil consultas diárias de triagem a distância resultaram em apenas 4% dos casos encaminhados para atendimento presencial”, informa o diretor executivo da operadora, Pedro Benedito Batista.

O Hospital Israelita Albert Einstein mostrou que o atendimento médico especializado podia chegar remotamente até os confins do Alto Rio Negro, Amazonas, onde vivem cerca de 3 mil pessoas, entre comunidades indígenas e militares de fronteira. Hoje, além desse projeto-piloto, o HIAE mantém uma base de 1,95 milhão de usuários estabelecidos em mais de 1.200 cidades brasileiras ou em trânsito por 20 países estrangeiros, e oferece novos serviços como a “telecessação do tabagismo”, programa para quem deseja parar de fumar.

Ao todo, o Einstein contabiliza 66.917 consultas de pronto-atendimento apenas no primeiro semestre, um aumento de 75%. Para alcançar a marca de 13 minutos em maio - tempo decorrido entre o acionamento do serviço e a prescrição da receita -, ele já investiu mais de R$ 25 milhões, iniciativa contemplada com “uma aceitação bastante positiva, com mais de 90% dos usuários considerando o serviço bom ou ótimo”, afirma Sidney Klajner, presidente do hospital.

A healthtech dr.consulta vem investindo pesado em tecnologia para se diferenciar na corrida da telemedicina. Até o fim do ano, a startup planeja investir R$ 3 milhões e, para 2021, a previsão é aportar mais R$ 5 milhões.

Entre 11 de março, quando ingressou na prestação de serviços on-line, e início de agosto, foram realizadas 60 mil consultas. Além de preconizar uma prática que o CEO Renato Velloso chama de “telemedicina humanizada” - baseada na ideia de que o paciente deve poder passar com o mesmo profissional tanto na consulta presencial como na remota -, o dr.consulta ajustou seu foco na escala médica “para otimizar a agenda de quase 300 especialistas com certificação digital e proporcionar conveniência a uma base de 1,8 milhão de pacientes”.

“Trata-se de uma evolução da medicina em direção a uma nova realidade social”, avalia o prof. dr. Chao Lung Wen, chefe da disciplina de Telemedicina da Faculdade de Medicina da USP. “Quem um dia olhar para trás, achará estranho que sua aplicação tenha sido questionada, assim como hoje parece estranho questionar o uso do Waze ou do Google Maps em proveito do Mapa Guia.”

Para o dr. Chao, este é “um movimento irreversível” quando se avaliam as vantagens: “O atendimento no domicílio é relevante pois minimiza erros médicos, quando há a possibilidade de interação entre especialistas durante a consulta on-line”.

Para Fábio Tiepolo, CEO da Docway, plataforma de intermediação do atendimento domiciliar de médicos, “outra vantagem é a facilidade de acesso a serviços após o horário normal de funcionamento”. Focado em atendimento nas áreas de pediatria, clínica geral, geriatria e médico da família e com uma carteira de 6 mil profissionais, a Docway busca se firmar junto ao contingente de 10 milhões de vidas que, segundo Tiepolo, têm direito ao serviço via operadora.

Um levantamento do CFM apontou que o país tem 2,5 médicos por 1000 habitantes, superando em proporção a Coreia do Sul (2,3) e até mesmo o Japão (2,4). O problema está na distribuição geográfica: em regiões como o Norte e o Nordeste, esse índice cai pela metade.

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