Exame Online
Jornalista: Beatriz Correa


Há cinco anos, um negócio de US$ 9 bilhões que prometia revolucionar a medicina a partir dos Estados Unidos acabou se revelando uma chocante fraude. A implosão do projeto do laboratório de diagnósticos clínicos Theranos, fundado em 2003 no estado da Califórnia pela então estudante de engenharia química americana Elizabeth Holmes, deixou investidores frustrados e especialistas da área da saúde decepcionados. Mas deixou, principalmente, uma imensa demanda por rapidez, simplicidade e preços baixos nos exames médicos ainda à espera de ser atendida. É esse público que os empreendedores paranaenses Marcus Figueiredo e Sérgio Rogal estão focando com a Hi Technologies.

A grande inovação prometida pelo Theranos era usar apenas algumas gotas de sangue para fazer mais de 200 testes clínicos em um pequeno aparelho, batizado de Edison. Essa é a mesma quantidade de sangue de que o mini laboratório Hilab, principal produto da Hi Technologies, precisa para realizar 15 exames — que vão desde gravidez e glicemia até sífilis e zika, a um custo de R$ 10 a R$ 95.

A coleta, domiciliar e agendada por meio do aplicativo do Hilab, requer somente um furo na ponta do dedo. O sangue é colocado em uma máquina portátil de 12 centímetros cúbicos, na qual é inserida uma cápsula com uma fita interna que carrega os reagentes específicos para cada teste. “O Hilab nasceu com o conceito de ser um eletrodoméstico da saúde”, diz Figueiredo. Em 25 minutos, o sangue reage quimicamente, processo registrado em uma espécie de imagem enviada por nuvem para um servidor da Hi Technologies. Lá, a reação é analisada por inteligência artificial, em um processo que gera um resultado prelimitar. Os médicos, biomédicos, farmacêuticos, físicos e engenheiros da empresa fazem a análise final da reação. O resultado é enviado ao paciente por SMS ou e-mail e pode ser consultado no aplicativo.

A Theranos nunca divulgou o processo de realização dos exames. Uma reportagem do “The Wall Street Journal” revelou, em 2014, que apenas cerca de 15 testes eram efetivamente feitos no Edison, e o restante era realizado em máquinas de outras empresas, como a Siemens.

No Hilab, as metodologias utilizadas são a imunocromatografia, a imunofluorescência, a química seca e a colorimetria, as mesmas usadas pelos laboratórios tradicionais. “Não inventamos nada do ponto de vista bioquímico, são métodos já consagrados. A inovação do processo é que pegamos os vários métodos diferentes e colocamos em um mesmo equipamento, criamos a experiência do usuário”, afirma Figueiredo. Nos laboratórios tradicionais, os reagentes dos testes são colocados dentro dos tubos que recebem o sangue, por isso são necessárias várias amostras para que cada uma sirva para um exame específico. Mas, no Hilab, a reação química acontece na fita interna do aparelho.

A Hi Technologies recebeu aportes da Positivo, da Qualcomm e do fundo Monashees. Segundo Figueiredo, o Hilab consegue praticar preços baixos porque não exige gastos com estrutura de atendimento ou logística. Desde a sua fundação, em 2004, a Hi Technologies tem crescido a uma taxa de 30% a 40% por mês. “Miramos um público muito maior do que o dos laboratórios, que visam à população que tem plano de saúde”, explica o fundador da empresa.

Democratização da saúde

Por ora, a coleta domiciliar do Hilab está disponível apenas em Curitiba. Pacientes de outras cidades podem usar o mini laboratório em farmácias, que são a grande aposta da Hi Technologies para expandir o serviço. O Brasil tem atualmente 114 mil drogarias. Para a patologista e especialista em estudos de saúde Paula Tavora, esse tipo de serviço é necessário para mudar o mercado brasileiro de exames diagnósticos. “É preciso descentralizar a saúde, e a principal vantagem desses testes é que eles vão transformar um desinformado em um informado sobre seu próprio corpo”, diz Tavora.

Porém, no caminho do avanço do setor, está a atual legislação do país, segundo especialistas. Em maio de 2019, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu o uso do Hilab nas farmácias, alegando que a máquina deveria ter uso apenas profissional e que aos farmacêuticos a única coleta permitida é a destinada aos testes de glicemia. A decisão da Anvisa foi revertida por uma determinação judicial. Agora, o equipamento é regularizado pela agência. Uma revisão das regras de funcionamento de laboratórios clínicos e postos de coleta laboratorial está a caminho, mas não tem prazo.

Para Francisco Neri, doutor especialista em informática da saúde pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o Brasil é um país atrasado na legislação refrente a novas tecnologias. Ele defende que as regras precisam permitir pelo menos a compreensão das inovações. “A legislação não acompanhou o avanço tecnológico. A Anvisa decidiu sobre o Hilab porque não era um aparelho bom para a população ou porque tinha uma portaria determinando algo? As leis estão sempre em descompasso com a tecnologia”, diz.

Enquanto planeja o crescimento da operação no Brasil, a Hi Technologies também estuda lançar o Hilab pela América Latina. “Não dá para pegar um prédio e levar para outros lugares. Com o Hilab eu consigo empacotar o laboratório e mandar pelo correio para o resto do mundo”, afirma Figueiredo.

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