Uso de cigarro eletrônico não ajuda a largar o vício | VEJA

 

O Globo 
Jornalistas: Matt Richtel e Sheila Kaplan, do New York Times

 

15/10/21 - A Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos Estados Unidos, autorizou pela primeira vez, nesta terça-feira, a venda de um cigarro eletrônico no país, uma mudança significativa em um dos debates mais controversos de saúde pública em décadas.

Ao dar o sinal verde para um aparelho e para cartuchos com sabor de tabaco comercializados pela R.J. Reynolds, sob a marca Vuse, a agência sinalizou acreditar que a ajuda oferecida por alguns dispositivos vaporizadores (conhecidos como vapes) para que fumantes deixem os cigarros tradicionais é mais significativa que os riscos de viciar uma nova geração.

— Os aerossóis dos produtos autorizados são significativamente menos tóxicos que os cigarros de combustão, baseado em dados disponíveis — disse a FDA em comunicado anunciando a decisão.

O comunicado concluiu: “a FDA determinou que o potencial benefício para fumantes que trocaram completamente, ou reduziram de forma significativa, o uso do cigarro superaria o risco para a juventude”.

A decisão histórica pode abrir caminho para a autorização de outros cigarros eletrônicos a permanecerem no mercado, incluindo aqueles da fabricante que já foi dominante, a Juul. Por mais de um ano, os produtores de cigarros eletrônicos têm mantido um padrão de espera — a maioria de seus produtos estão no mercado, mas aguardando autorização oficial — enquanto a FDA investigava se eles eram um benefício ou um perigo para a saúde pública.

— A importância de a FDA autorizar um dispositivo vaporizador como “apropriado para a proteção da saúde pública” não deve ser minimizada — disse o presidente da Associação Americana de Vaping, um grupo industrial, Gregory Conley, que acrescenta: — Agora que a FDA agiu, nós estamos esperançosos que os consumidores adultos e comunicadores de saúde começarão a entender os benefícios na redução de danos oferecidos por esses e outros produtos smoke-free (livres de fumo)”.

Durante os últimos meses, como parte da sua análise, a agência também ordenou que milhares de dispositivos vaporizadores fossem retirados do mercado, incluindo os de uma marca que havia ultrapassado a Juul como a favorita entre adolescentes pelos seus sabores de frutas e doces, a Puff Bars. Na terça-feira, a FDA também rejeitou 10 outros produtos saborizados da Vuse, mas não disse quais foram.

Decisão não é consenso

A condenação sobre a decisão da agência de autorizar alguns produtos foi rápida.

— Isso joga os jovens para debaixo do ônibus — disse a vice-presidente de assistência nacional de defesa da Associação Americana de Pulmão, Erika Sward. Ela disse que a preocupação era tanto com a lógica mais ampla endossando esses produtos, como com a Vuse, que foi considerada uma das marcas de vaporizadores mais populares entre os jovens na pesquisa mais recente do governo sobre o uso de tabaco por essa população.

R.J. Reynolds, dona da Vuse, é uma das maiores empresas de cigarros no mundo. Outro grande nome no ramo, Altria, tem uma participação de 35% na Juul, fabricante de cigarros eletrônicos.

Erika Sward disse que uma indústria que mentiu sobre envolver gerações em um produto fatal que matou milhões agora está posicionada para controlar a próxima renovação do mercado da nicotina.

— A indústria estava esperando pela próxima grande coisa, e eles a encontraram com os cigarros eletrônicos — disse.

Porta-voz da Reynolds American, empresa controladora da R.J. Reynolds, Kaelan Hollon disse que a decisão “representa um importante momento para a Reynolds” e que ela mostra que os produtos autorizados “são apropriados para a proteção da saúde pública”.

Legislação
Os cigarros eletrônicos chegaram ao mercado americano no início dos anos 2000 como dispositivos projetados para dar aos fumantes a dose de nicotina pela qual ansiavam sem os cancerígenos advindos da queima dos cigarros. Mas, cerca de seis anos atrás, com o lançamento dos elegantes produtos da Juul com sabores de frutas e doces, o uso de cigarros eletrônicos entre os adolescentes dispararam, e as autoridades de saúde pública temeram que uma geração de não fumantes estivesse ficando viciada em nicotina.

Alguns especialistas em saúde pública acreditam que permitir certos dispositivos vaporizadores a permanecerem no mercado como uma alternativa ao fumo tradicional pode tornar mais fácil para o governo impor uma regulamentação mais rígida sobre os cigarros tradicionais, cujos vapores podem causar câncer e desempenham um papel em mais de 400 mil mortes por ano nos Estados Unidos.

Depois de resolver o problema com os vaporizadores, a divisão de tabaco da FDA avançará em um plano para reduzir a quantidade de nicotina nos cigarros por combustão. Em sua estratégia de controle do tabaco, anunciada em julho de 2017, a FDA disse que tentaria forçar as empresas a reduzirem a nicotina em seus produtos para níveis não viciantes. A indústria do cigarro se opõe ao movimento.

A FDA também está trabalhando em seu plano para eliminar cigarros mentolados do mercado, uma perspectiva que a indústria do tabaco está fazendo um forte lobby contra.

O diretor da Rede de Pesquisa em Tabaco da Universidade de Michigan, Clifford Douglas, disse que a autorização do Vuse foi “uma boa notícia inicial em termos de a agência deixar claro que seu foco é em providenciar alternativas bem avaliadas de redução de danos para adultos”.

— Essa decisão deixa claro que o entendimento científico da FDA é de que os cigarros eletrônicos são intrinsecamente e significativamente menos perigosos que os produtos de tabaco à combustão — disse Douglas, e acrescenta: — E torna igualmente claro que esses produtos podem ser bons para a proteção da saúde pública e, portanto, potencialmente ajudar milhões de fumantes adultos viciados a pararem de fumar.

Os produtos específicos que receberam a autorização da FDA são o Vuse Solo Power Unit e dois cartuchos de reposição com sabor de tabaco, cada um com cerca de 5% de nicotina.

Risco para os jovens

Em seu anúncio, a FDA disse que estava ciente do alto uso dos produtos Vuse pelos jovens, mas que estava aprovando “sabores de tabaco”, que são menos atraentes para os adolescentes. A agência também disse que estava impondo restrições às propagandas digitais, no rádio e na televisão, enquanto os críticos argumentam que a FDA pareceu deixar muito espaço para outros tipos de marketing que podem afetar os jovens.

— Eles são simplesmente inadequados — disse um ex-funcionário da política de tabaco da FDA e pesquisador sênior no Instituto para Legislação de Saúde Nacional e Global O’Neill, da Universidade de Georgetown, Eric Lindblom.

Ele questionou as restrições à propaganda na televisão, que só permitem a exibição de comerciais em programas com um baixo percentual de usuários adolescentes. Lindblom disse que os adolescentes ainda podem ver os anúncios da Vuse, seja na televisão ou se forem copiados e colocados no YouTube, como aconteceu com a Juul.

— Eles estão permitindo propaganda por meio de parcerias, celebridades e embaixadores de marcas. Isso é um problema real — disse.

Entre as questões chave que a FDA não resolveu na terça-feira, estão quais são os planos da agência sobre cigarros eletrônicos com sabor mentolado, os quais críticos dizem ser atraentes para os jovens e defensores dos cigarros eletrônicos dizem que ajudarão a convencer fumantes atuais a deixarem o cigarro a combustão. A agência disse que ainda “está avaliando” a solicitação da Vuse para os mentolados.

Reynolds, em seu próprio comunicado, disse que poderia "ainda vender legalmente" os produtos que permanecem sob análise.

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