Gestão inadequada faz do Peru o campeão de mortes na epidemia

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O Peru tem 932 mortes por milhão de habitantes, seguido no ranking por Bélgica (867) e Espanha (629)

Por Marsílea Gombata — De São Paulo

Um dos primeiros países da América Latina a implementar lockdown, o Peru tem hoje o maior número de mortes por coronavírus em relação à população. Nas últimas semanas, o país tem visto a pandemia acelerar, com recordes diários de novos casos. Segundo especialistas, autoridades falharam em controlar a epidemia no início da quarentena, com testes em massa e rastreamento. Hoje, o governo está pressionado pela queda brutal da economia, que desestimula um novo confinamento.

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O Peru tem hoje 932 mortes por milhão de habitantes. Foram 29.838 mortes por covid-19 confirmadas até o dia 6, em uma população de 32 milhões. O país é seguido no ranking por Bélgica (867 mortes por milhão) e Espanha (629).

O Peru é o quinto país com mais casos de covid-19 no mundo. Com cerca de 690 mil casos, fica atrás somente dos EUA, Brasil, Índia e Rússia. Em termos de casos por milhão de habitantes, o Peru é o quarto no ranking mundial.

Segundo especialistas ouvidos pelo Valor, implementar um lockdown nacional, como fez o Peru, mas sem medidas adicionais é insuficiente para conter a epidemia

“O problema é que são necessárias outras medidas além de uma quarentena. É preciso identificar os infectados, isolá-los e rastrear os contatos”, afirma Ernesto Bustamante, ex-diretor do Instituto Nacional de Saúde do Peru.

Bustamante diz que, no início da pandemia, o governo comprou testes sorológicos, que detectam quem já teve o vírus e se recuperou, e não os moleculares (ou PCR), que indicam quem está infectado. “Se alguém foi contaminado e se recupera, demora de dez a quinze dias para aparecer no teste sorológico. Isso faz essa identificação ser falha, pois vem com atraso, assim como o rastreamento de contatos”, diz.

Segundo dados do Ministério da Saúde peruano, foram comprados 5,2 milhões de exames sorológicos e só 397,4 mil PCR. Até o dia 6 de setembro, haviam sido aplicados 3,3 milhões de testes. Estima-se que 40% dos casos no Peru sejam assintomáticos.

“Uma epidemia é controlada antecipando-se e eliminando contágios, e não apenas curando doentes. Sem isso, quando as pessoas saem da quarentena, o vírus as está esperando do lado de fora”, acrescenta Bustamante.

O governo peruano decretou lockdown nacional em 14 de março e o prorrogou até 30 de junho. Com a alta de novos casos diários - em 16 de agosto foram 10.143 - o governo reimpôs medidas restritivas no mês passado. Reuniões familiares foram proibidas aos domingos, quando o toque de recolher vigente das 22h às 4h passou a valer para o dia todo. Hoje 36 regiões do país estão sob quarentena estrita, entre elas Cuzco e Puno.

Além de não ter feito massivamente testes para identificar infecções ativas e rastrear contatos, autoridades falharam na provisão de oxigênio para pacientes, afirma Luis Solari, ex-ministro da Saúde do Peru. “Quando os casos passaram das áreas mais ricas para as mais populosas e para o interior, a grande preocupação do Ministério da Saúde eram leitos de UTI e ventiladores, mas a maioria dos infectados que vai para hospitais não precisa de tratamento intensivo, e sim de oxigênio”, argumenta.

Dos 11.327 hospitalizados por covid-19 no Peru hoje, 13% estão em UTI com ventilador, e o restante é tratado com oxigênio. O país tem 1.721 vagas de terapia intensiva, das quais 87% estão ocupadas.

O lockdown no segundo trimestre resultou numa contração de 27,2% do PIB peruano - uma das maiores em todo o mundo. Para mitigar os efeitos da crise o governo lançou mão de pacote fiscal de cerca de 7% do PIB, segundo o Fundo Monetário Internacional.

Dentre as medidas está ajuda emergencial de US$ 214 para famílias mais vulneráveis, que em alguns casos foi paga em duas parcelas. Bustamante afirma, no entanto, que a ajuda foi insuficiente, o que contribuiu para as pessoas descumprirem a quarentena.

“Cerca de 70% dos peruanos trabalham no mercado informal e vivem com o que ganham no dia”, diz. “Não têm poupança ou cartão de crédito. Podem aguentar alguns dias, mas não meses. No fim, preferem correr o risco de se contaminar a passar de fome.”

A aceleração da pandemia depois de uma quarentena longa e com medidas restritivas ainda em vigor vêm desgastando a imagem do presidente Martín Vizcarra. Em 21 de março, uma semana após o início da quarentena, sua aprovação chegou a 87%. No fim de agosto estava em 60%, segundo pesquisa Ipsos Apoyo.

“No início, as pessoas acreditavam que a quarentena iria protegê-las do coronavírus, mas, no fim das contas, foi um desastre monumental”, afirma Fernando Rospigliosi, diretor da FRC Consultores, em Lima. “O Peru tem a maior taxa de óbitos por milhão de habitantes do mundo, a pior contração do PIB no segundo trimestre e mais de 6 milhões de desempregados pela quarentena. A conta disso uma hora chega.”

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