O Estado de S.Paulo
Por meses, uma geladeira em uma instalação do governo na cidade holandesa de Leiden abrigou cerca de 90 pequenas caixas brancas com milhares de dólares em doses da vacina Oxford/Astrazeneca. Mas, na maioria delas, uma data inviabiliza os imunizantes: elas expiram em agosto de 2021. O problema se repete pelo mundo. Sem que haja um cálculo preciso, casos como na Holanda, nos EUA e na África mostram que são milhões de vacinas desperdiçadas, enquanto apenas 16% da população mundial foi totalmente imunizada, segundo o Our World in Data.
Para Dennis Mook-Kanamori, médico da Universidade de Leiden, que até recentemente administrava vacinas lá, o vencimento de milhares de doses é trágico. O governo holandês está decidido a deixar as doses expirarem, em vez de enviá-las para o exterior, alegando razões legais e logísticas. “É uma atitude elitista e decadente”, disse o médico.
A situação se reflete em inúmeros freezers, geladeiras e centro logísticos em todo o mundo. E, à medida que a demanda diminui em nações ricas como a Holanda, mais poeira se junta. No mês passado, Mook-Kanamori e seus colegas jogaram fora 600 doses. Até o fim de agosto, serão 8 mil. A menos que algo mude, em outubro, todas as 10 mil doses em Leiden terão sido jogadas fora. Os médicos estimam que pode haver 200 mil doses de vacina da Oxford/Astrazeneca na Holanda com destino semelhante.
Grande parte do mundo ainda não viu doses suficientes para vacinar até mesmo os mais vulneráveis. Em toda a África, no fim do mês passado, apenas 2,2% das pessoas haviam recebido pelo menos uma dose, enquanto a Holanda vacinou bem mais da metade de sua população.
“Não há ninguém que monitore as doses expiradas sistematicamente”, disse Prashant Yadav, especialista em cadeias de suprimentos de saúde do Center for Global Development. Em vez disso, a informação gotejou em notícias e declarações oficiais pouco divulgadas.
Em Israel, 80 mil doses vencidas da Pfizer/biontech foram programadas para serem descartadas no fim de julho; 73 mil doses de vários fabricantes foram para o lixo na Polônia; e 160 mil da Sputnik V prestes a expirar foram devolvidas da Eslováquia para a Rússia. Nos EUA, estima-se que apenas o Estado da Carolina do Norte tenha 800 mil doses prestes a expirar. Em todo o país, as estimativas chegam a milhões.
Mesmo quando as doses vão para os necessitados, as datas de validade podem representar problemas. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), aproximadamente 469.868 doses de vários fabricantes haviam expirado na África no dia 9.
A maioria dos países africanos adaptou o calendário de vacinação de acordo com uma janela de entrega de três a quatro meses. Mas os atrasos no embarque forçaram alguns a enfrentar períodos mais curtos entre o recebimento e a aplicação. A Libéria teve 15 dias para distribuir dezenas de milhares de doses de Astrazeneca da União Africana. Cerca de 27 mil expiraram. Benin descartou 51 mil doses em julho. No Malawi, o governo queimou 20 mil doses expiradas da Astrazeneca em maio.
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