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Home office; empresas tornaram-se mais abertas ao trabalho remoto durante a pandemia
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil / Estadão

 

Trabalho remoto é preferido por funcionários com carreiras estabelecidas; para quem está começando, ficar isolado pode tornar mais difícil o processo de se encaixar em uma organização

 
Corinne Purtill
 
 

Durante seu estágio em um banco importante no verão passado, Costa Kosmidis passou a maior parte do tempo trabalhando de forma remota. O banco fez o possível para ajudar os estagiários a diminuir a distância, disse ele, inclusive colocando em prática "uma política de 'porta virtual' aberta" que fazia com que os funcionários mais experientes estivessem prontamente disponíveis por telefone ou e-mail para consultas relacionadas ao trabalho e para conselhos de carreira.

Entretanto, quando Kosmidis, 22 anos, começou a trabalhar no mesmo banco depois de se formar na Universidade Fordham este ano, ele esperava passar mais tempo no escritório. "Você consegue sentir melhor a energia das pessoas quando está perto delas", disse Kosmidis. Avaliar a disponibilidade de alguém, por exemplo, é mais complicado de longe: "Quando você está no escritório, basta dar uma olhada rápida, mas à distância, não dá para saber com certeza o quanto o outro está ocupado".

O trabalho remoto com frequência é preferido pelos funcionários com carreiras estabelecidas que conhecem seu gestor, sentem-se confortáveis em seu cargo e desejam equilibrar o trabalho com as responsabilidades familiares ou outras obrigações pessoais. Para aqueles que estão apenas começando suas carreiras, trabalhar isolado pode tornar mais difícil se encaixar em uma organização - e, em algum momento, avançar no nível hierárquico.

As empresas tornaram-se mais abertas ao trabalho remoto durante a pandemia. Agora, à medida que elas planejam como será o trabalho daqui para frente, estão prestando mais atenção ao que significa construir uma carreira sem as oportunidades tradicionais de networking, mentoria e visibilidade que vêm com um escritório físico em tempo integral. Alguns de seus funcionários também estão ponderando mais o que o trabalho remoto ou em esquema híbrido de longo prazo pode significar para seus futuros.

 

"Estamos começando a ouvir dos funcionários, sobretudo dos funcionários jovens que eles estão - acredite ou não - preocupados", disse Johnny C. Taylor Jr., CEO da Sociedade de Gestão de Recursos Humanos (SHRM, na sigla em inglês)

Prithwiraj Choudhury, professor da Escola de Negócios de Harvard, que pesquisa a mudança da geografia do trabalho, disse ter visto três práticas comuns em empresas que gerenciavam o trabalho remoto com sucesso. Essas empresas reservaram um tempo para compilar informações e práticas em manuais ou guias que os funcionários podem consultar de qualquer lugar; fizeram a ponte entre trabalhadores remotos com mentores fora de seu departamento para que pudessem conversar de maneira franca sem colocar em risco os relacionamentos da equipe; e criaram o que ele chamou de "a hora do cafezinho virtual".

Em um estudo, Choudhury e seus colegas escolheram de forma aleatória alguns estagiários em um banco global para participar de videoconferências individuais com executivos seniores. Outros se encontraram virtualmente com colegas estagiários, e alguns não participaram de nenhuma reunião extra. Aqueles que se reuniram com funcionários mais experientes tiveram melhores avaliações de desempenho no final do verão e tinham mais chances de receber ofertas de emprego.

Se gerenciado de forma eficaz, o trabalho remoto pode levar a conversas mais profundas, disse Choudhury.

"Quando as pessoas falam das conversas nos corredores e na hora do cafezinho, a realidade é que elas são muito limitadas", disse ele. Trabalhar remotamente obriga as pessoas a se esforçarem para que esses encontros aconteçam e coloca todos em condições de igualdade. Nos encontros virtuais, "você vê o cachorro do gerente-geral passar", disse ele. "Você não veria isso no escritório tradicional."

Algumas empresas também começaram a treinar gestores para ajudar os trabalhadores remotos a trilhar suas carreiras. A Nationwide Insurance, que no início da pandemia fez com que a maioria de seus 25 mil trabalhadores passassem a trabalhar permanentemente em esquemas híbridos ou de casa em tempo integral, treinou gestores para facilitar o planejamento de evolução de carreira de trabalhadores menos experientes, criando modelos para conversas a respeito de habilidades e interesses dos trabalhadores e formando duplas com mentores ou recursos da empresa para ajudá-los a alcançar seus objetivos. A Nationwide também criou um curso de liderança totalmente virtual de quatro semanas que está disponível para trabalhadores em todos os níveis hierárquicos da organização.

"Foi intencional criar experiências para que 'fora da vista' não signifique 'deixar de ser lembrado', o que era uma grande preocupação para alguns", disse Erin Pheister, vice-presidente sênior de talento e eficácia organizacional da Nationwide.

A desenvolvedora de software HubSpot, com sede em Massachusetts, treina gestores para trabalhar com equipes de funcionários espalhados pelo mundo, com ênfase nas conversas que criam coesão de grupo e constroem relacionamentos pessoais, disse Katie Burke, diretora de recursos humanos da empresa. Isso significa ser muito claro de antemão quanto a como a equipe deve trabalhar em conjunto e incentivar as pessoas a conversar sobre seus interesses e passatempos fora do escritório.

A HubSpot também encoraja os gestores a adotar o que Katie chama de "intencionalidade" em sua estratégia para os eventos de equipe. Oportunidades para criar vínculo como happy hours virtuais são ótimas, por exemplo, mas se forem anunciadas de última hora, as pessoas em fusos horários diferentes ou com responsabilidades de cuidado geralmente não podem participar.

A esperança é que as inicativas intencionais para incluir os trabalhadores remotos possam ajudar a combater a tendência dos gestores de favorecer aqueles que trabalham no modo presencial. Quando a SHRM entrevistou gerentes a respeito do trabalho remoto no ano passado, 42% relataram que muitas vezes ignoravam os trabalhadores remotos ao distribuir tarefas - não por razões punitivas ou intencionais, disse Taylor, mas porque simplesmente se esqueciam deles.

Entre os funcionários com maior probabilidade de preferir o trabalho remoto estão mulheres e pessoas não brancas, que mesmo antes da pandemia muitas vezes relatavam se sentir sub-representadas e isoladas no local de trabalho. Trabalhar remotamente sem o apoio adequado pode criar um ciclo vicioso que exacerba essa sensação de isolamento, ao mesmo tempo em que diminui a chance de esses trabalhadores serem lembrados para projetos que favorecem o crescimento na carreira - e da motivação.

Sensível a essa tendência inconsciente, que os psicólogos organizacionais classificaram como de "viés de proximidade", a HubSpot avaliou todos os cargos da empresa e determinou quais deles devem ser exercidos no escritório por razões comerciais legítimas.

"'Eu apenas prefiro quando posso ver pessoas na minha equipe' - isso não é uma boa razão profissional", disse Katie.

No fim das contas, menos de 5% do total de cargos da empresa atendia a esse requisito, entre eles recepcionistas e funcionários de segurança. A grande maioria dos cargos da empresa agora são oficialmente identificados como empregos para se "trabalhar de qualquer lugar". Trabalhar fora do escritório não é encarado como uma exceção ou privilégio especial, mas como uma parte do trabalho, e os gestores são treinados para pensar em suas equipes como uma unidade, independentemente da localização.

Em breve, a HubSpot começará a monitorar a localização do trabalho junto com outros dados de diversidade para garantir que a preferência de local de trabalho não esteja interferindo nas chances de promoção.

Embora as empresas estejam tomando medidas para criar oportunidades para os funcionários remotos crescerem na carreira, talvez também seja útil que os trabalhadores reflitam se vão se encaixar no trabalho remoto antes de optarem por deixar o escritório, disse Kyle Elliott, coach de carreira para executivos na Califórnia.

Segundo ele, os trabalhadores remotos "realmente precisam se esforçar e ser estratégicos na intenção de conseguir encontros presenciais" com gestores e colegas. Mas ele também reconhece que mesmo deixar claro e buscar oportunidades de forma proativa terá limitações se a cultura da empresa não for compatível com o trabalho remoto.

"Se muitas decisões são tomadas por meio de conversas paralelas, indo até o escritório de alguém, durante conversas no corredor, reconheça que, apesar de ser muito bom em enviar e-mails e se comunicar pelo Slack, você ficará de fora das conversas que acontecem de forma orgânica no escritório", disse Elliott. "O Zoom simplesmente não é capaz de substituir todas essas conversas paralelas." / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

 

Estadão

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