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Startups precisam fazer parte da solução dos grandes problemas sociais. Mas por que poucas conseguem escalar seus serviços?
by Thomaz Srougi* | Época Negócios
No início de maio, participei de um evento no qual eu deveria mostrar como estamos trabalhando para democratizar a saúde no Brasil. Todos sabem que 20% dos brasileiros têm plano de saúde, e que 170 milhões não têm condições de ter um plano e dependem do sistema público ou pagam do bolso. O problema de não ter plano privado é que não é incomum esperar anos por exames ou cirurgias, porque as clínicas e hospitais do governo estão sobredemandados.
A cada semana, cerca de quatro mil brasileiros viram idosos e precisam de mais saúde. A população com mais de 60 anos representa 10% do total, e até 2050 será 30%. Estamos envelhecendo rápido em relação aos outros países. E à medida que amadurecemos, consumimos mais cuidados de saúde. Com 25 anos, visitamos nossos médicos menos de duas vezes por ano em média; com mais de 60 anos, a frequência aumenta para sete vezes. Essa demanda adicional gera maior pressão num sistema já estressado e com parcos recursos.
Além do envelhecimento da população, na prática, milhões de pessoas só buscam o médico quando descobrem uma doença já em estado avançado, quando muitas vezes não há mais solução. Perderam a chance de se prevenir pela falta de acesso ou por não caber no bolso. Além do sofrimento desnecessário, há custos desnecessários.
Essa dinâmica descontrolada e perversa incentiva um número crescente de empreendedores em saúde a tentar fazer algo diferente. Sugiro a todos que adotem propósitos ambiciosos: oferecer cuidados preventivos, tirar as pessoas das filas da saúde, ampliar o acesso, acelerar diagnósticos, obter assertividade clínica, reduzir custos. Há muito a fazer.
Ir ao médico era uma experiência analógica, liderada por humanos. Os agendamentos eram feitos por telefone, o prontuário era físico em papel, o pagamento era em dinheiro ou cheque, havia desconexão entre rede de saúde, centros de diagnóstico e hospitais e empregadores e pacientes. Analógico é caro, exames são feitos sem necessidade e diagnósticos não incorporam todo conhecimento médico gerado a todo instante.
É necessária uma visão diferente. Se houver mais automação e modelos de decisão clínica personalizada e alavancados por bancos de dados clínicos, é possível ser mais proativo, com
menos sofrimento e menos gastos e, portanto, mais acesso.
No dr.consulta, escolhemos um caminho -- começamos por eliminar custos desnecessários em clínicas, passamos pela redução de custos para o paciente, chegamos à digitalização e automação de processos, armazenamos uma quantidade colossal de dados clínicos e operacionais, investimos tempo e recursos na criação de modelos matemáticos de suporte clínico, gestão clínica e até operacional.
Certamente há outros caminhos possíveis. Cada empreendedor deve procurar o seu, sem perder de vista que saúde é uma questão de longo prazo, clinicamente, operacionalmente e economicamente.
Voltando ao evento que participei, alguém me perguntou que conselho eu daria para outros empreendedores. É este: empreender é menos arriscado que trabalhar numa grande empresa, porque você está no controle. Empreender em saúde exige visão, resiliência, ousadia, paciência e se cercar de pessoas muito melhores que você e alinhadas no propósito. Portanto, comece agora. Assuma riscos. Seja generoso, compartilhe sucesso e conhecimento com os outros. Priorize os pacientes e médicos acima de resultados financeiros, seja obcecado em resolver os seus problemas. Mesmo no setor de saúde, há muitas frentes de trabalho em que é possível testar e errar. Com os cuidados certos, não tenha medo de errar. Porque se não errar, nunca vai aprender para acertar, e nunca salvará vidas em escala.
*Thomaz Srougi é fundador e presidente executivo do conselho do dr.consulta. É mestre em Políticas Públicas pela University of Chicago Harris School of Public Policy, MBA pela University of Chicago Booth School of Business, concluiu o GMP da Harvard Business School e é um Kauffman Fellow
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