Jornalista: Denise Neumman
01/11/19 - No ano 2001, a Cristália foi o destaque setorial na indústria farmacêutica, na primeira edição do anuário “Valor 1000”. Naquele ano, a indústria que nasceu dentro do setor de serviços — foi fundada por um grupo de médicos donos de um hospital em Itapira, a 200km de São Paulo — ocupou a 663 posição entre as mil maiores em presas do Brasil. Enquanto frequentou a lista das melhores em 15 das 19 edições do anuário, a empresa cresceu e entrou também no restrito grupo dos dez maiores fabricantes de medicamentos do país.
O caminho traçado pela Cristália, no entanto, foi como andar na contramão do setor e da indústria brasileira. A empresa investe em média 4% do seu faturamento líquido em inovação, tem 107 patentes registradas (mas mais de 300 depositadas), 54% da sua receita vem de matérias-primas feitas no Brasil e, enquanto grandes farmacêuticas anunciam o fechamento de suas plantas no país, ela acabou de inaugurar mais uma fábrica.
A Calçados Beira Rio também foi o destaque do setor Têxtil, Couro e Vestuário há 18 anos. Desde então, passou de 8 para 12 fábricas, todas no Rio Grande do Sul, e de 5 mil para 11 mil funcionários, período em que ampliou o peso das exportações para 17% do faturamento.
Também em rota contrária a do setor em que atua, que encolheu pressionado pelas importações e pela falta de competitividade na exportação, a Beira Rio hoje mantém uma equipe exclusiva para pesquisar o que os consumidores e os influenciadores estão dizendo nas redes. Com base nesse acompanhamento e ancorada na agilidade de produção que montou nos últimos anos, faz lançamentos quinzenais para entregar aquilo com que o consumidor apenas começou a sonhar.
As duas empresas não só se mantiveram no grupo das melhores indústrias em operação no Brasil com o galgaram mais de 300 posições no ranking das mil maiores entre 2001 e 2019 (respectivamente, resultados de 2000 e 2018). São estratégias que se destacam em tempos de forte desindustrialização. Atualmente, apenas R$ 11 de cada R$ 100 gerados no país todos os anos vêm da indústria de transformação.
Entre as mil maiores empresas em operação no país, retratadas anualmente no ranking do Valor, o maior drama da indústria não está na perda de tamanho, mas no seu empobrecimento tecnológico. Entre as mil maiores de todos os setores, o peso da indústria (sem Petrobras) passou de 48,1% em 2000 para 45,7% no ano passado (edição 2019 do ranking).
Mas, olhando para dentro da indústria, hoje, nada menos que 36,8% da receita vem de alimentos, bebidas e fumo, peso que era de 20,2% no ano 2000, enquanto a contribuição do setor eletroeletrônico encolheu quase 5 pontos, caindo de 8,3% para apenas 3,8% ao longo desse período, sem falar no quase sumiço da indústria de informática. Também perderam espaço a indústria de veículos e peças e setores tradicionais como têxtil, vestuário e calçados, enquanto a indústria relacionada à exploração de commodities avançou.
Se em 2000 o terceiro maior faturamento entre todas as empresas brasileiras era da Volkswagen, a maior montadora de automóveis do país hoje ocupa apenas a 3 4 -posição nesse ranking. Antes dela, desfilam alguns “campeões nacionais”, como a JBS, segundo maior faturamento em 2018, mas que detinha a 382 â posição em 2000, ainda com o a modesta Friboi, e a Braskem, 7 - no ano passado e que foi formada em 2002 com a fusão de seis empresas que estavam, individualmente, entre as mil maiores no primeiro anuário, a começar pela Copene, naquele ano ainda uma estatal, mas que no ano seguinte foi comprada pela Odebrecht.
Como resultado do movimento de consolidação no setor industrial — uma entre várias estratégias de sobrevivência e de aumento de eficiência e produtividade adotadas nas últimas duas décadas —, o peso das cinco maiores indústrias de transformação no ranking das mil maiores passou de 8,4% da receita líquida do setor industrial para 23% entre 2000 e 2018.
Parte dessa mudança também reflete a nova metodologia no ranking do “Valor 1000”, pois em 2000 as informações apresentadas eram oriundas dos balanços individuais das empresas e em 2018, preferencialmente de balanços consolidados, quando existentes. Mas não foi só o tamanho das empresas que mudou, pois o perfil também é completamente diferente e de novo reflete a comoditização da indústria brasileira.
Entre as maiores, saíram as montadoras e a Embraer, e entraram empresas de alimentos, bebidas e processadores de commodities. Os economistas chamam esse movimento de “especialização regressiva” da indústria brasileira e ele é geral e ainda mais pronunciado no conjunto do setor do que entre as m il maiores empresas do país.
Se o movimento de consolidação no setor industriai impediu uma queda pronunciada do peso do setor entre as maiores empresas, no conjunto do Produto Interno Bruto a perda é muito mais pronunciada. Em 2018, a participação da indústria de transformação foi de apenas 11,3%, o menor patamar desde que o PIB começou a ser medido de form a regular e abrangente.
A perda de densidade da indústria começou no fim dos anos 80. Em meados dessa década, a participação bateu nos 35%, depois caiu fortemente e quase sem parar até a virada dos anos 90 e 2000, quando atingiu a marca de 14%. Aí se recuperou um pouco, voltou a quase 18% em 2004, para voltar a cair.
Dois economistas do Núcleo de Economia Regional e Urbana da Universidade de São Paulo (Nereus-USP) compararam essa trajetória de desindustrialização local com a de outros 30 países, que juntos representam cerca de 90% da indústria mundial e concluíram que o Brasil é o caso mais grave desse grupo. Não foi o único país onde a indústria perdeu espaço, mas em nenhum dos outros a perda de valor foi tão intensa quanto aqui, concluíram Paulo César Morceiro e Milene Tessarin.
Em 1980, o Brasil era o sexto maior produtor de bens industriais do mundo e respondia por 4,1% da produção dos maiores fabricantes mundiais. Na ocasião, a China estava bem atrás do país, com apenas 1,65% dessa produção. N o ano passado, a China estava no topo da lista, concentrando 24,2% da produção dos 30 maiores países, e o Brasil já detinha apenas 1,86% do total.
Morceiro aponta algumas situações que ajudam a explicar a brutal desindustrialização brasileira: primeiro, a saída do Estado com o indutor e investidor em alguns setores industriais e em infraestrutura (ele lembra que já nos anos 80 a economia foi marcada por uma forte queda dos investimentos públicos), uma abertura comercial malfeita (sem estratégia) nos anos 90 e depois o fracasso das tentativas de política industrial (já nos anos 2000).
Elas falharam porque não foram focalizadas na inovação, não apostaram na exportação e criaram os campeões nacionais “errados” porque a maioria das apostas foi em setores de pouca densidade tecnológica, como alimentos e petroquímica, resume o economista. A Coréia do Sul, pondera, também teve uma política industrial que apostou na formação de grandes empresas, mas o projeto resultou em companhias com o Samsung e Hyundai. Além disso, desde os anos 80 o país asiático conseguiu aumentar de 1% para 4% do PIB o investimento em pesquisa e desenvolvimento, percentual que no Brasil mal se mantém em 1,2% ao ano.
Depois de ter ensaiado uma recuperação no começo dos anos 2000, a indústria retomou a trajetória de encolhimento em 2005. A o longo dos últimos 14 anos, o câmbio apreciado foi uma realidade constante. Olhando por trimestres, desde o fim de 2005, em mais de 75% do tempo o dólar esteve mais de 10% acima daquele que poderia ser considerado de equilíbrio para a indústria, segundo metodologia desenvolvida pelo Centro de Estudos do Novo Desenvolvimento da Fundação Getulio Vargas (CND-FGV). N o decorrer desse longo período de apreciação cambial, a indústria acabou por aumentar muito a importação de matérias-primas e componentes.
Nelson Marconi, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp) da FGV, pondera que do ponto de vista da estratégia individual das empresas, dá para entender o aumento da importação de insumos com o uma reação aos efeitos do câmbio apreciado por um longo tempo, mas o resultado é uma bola de neve negativa.
Ele observa que 50% das vendas industriais são intraindústria, então o próprio setor compra menos do fabricante nacional e contribui para seu enfraquecimento. “Como estratégia micro dá para entender, mas isso tem um efeito macro muito ruim, e acabou se tomando uma armadilha. Eu espero que não, mas o Brasil está no caminho de uma indústria mexicana, de apenas montar produtos”, diz.
Com mais três economistas, Marconi começou uma pesquisa a partir da hipótese de que a margem de lucro industrial cairia quando o câmbio estivesse apreciado e aumentaria com o câmbio depreciado, mas os dados mostraram que ocorreu o contrário e indústrias de diferentes setores lucraram mais apesar do câmbio fora do lugar. “Um dos fatores que explica esse resultado foi justamente essa mudança na com posição dos insumos”, diz Marconi.
Hoje, a série histórica da taxa de câmbio mostra que desde meados do ano passado ela já está em uma situação de maior equilíbrio do ponto de vista industrial. Mas agora os empresários já estão tão dependentes da importação “que preferem a redução das tarifas sobre bens importados e a própria abertura”, acrescenta Marconi. O trabalho concluiu que a troca do fornecedor local pelo do exterior foi mais intensa nos setores de alta tecnologia. “Então, o problema não é só de redução da demanda, mas de perda de conteúdo tecnológico, de densidade da produção local.”
A balança comercial brasileira mostra a deterioração entre exportação e importação de bens manufaturados. Em 2000, a balança comercial dos bens de alta e média tecnologia foi negativa em US$ 15 bilhões, valor que subiu recorrentemente até virar um déficit de US$ 93 bilhões em 2014 e recuar na esteira da recessão brasileira, mas já voltou a crescer e foi de US$ 57 bilhões no ano passado.
O problema, diz Marconi, não é importar, mas não exportar, pois a indústria no mundo se organiza em cadeias globais de valor, e o Brasil não deveria ficar só na ponta que importa, sem agregar valor e sem exportar. Um dos setores mais deficitários é o farmacêutico, com importações de US$ 8,4 bilhões e exportações de apenas US$ 1,4 bilhão em 2018. N o setor, mais de 90% dos insumos são importados.
A Cristália se orgulha de ser “diferente” nesse setor. Ogari Pacheco, presidente do conselho de administração da farmacêutica, diz que não gosta de ditar regras, nem pretende ensinar ninguém, mas atribui o crescimento constante da empresa nas últimas décadas ao fato de 54% do faturamento ser ancorado em produção de matérias-primas feitas no Brasil.
“Esse é certamente um diferencial que nos protegeu das oscilações do dólar”, diz ele, listando também a decisão “desde sempre” de distribuir apenas 10% do lucro aos acionistas com outra regra que fez diferença na estratégia da empresa. Com o restante do lucro fica no caixa, ele foi usado para bancar investimentos, ampliações, aquisições ao longo dos anos. “Do BNDES só pegam os R$ 13 milhões para uma fábrica que custava R$ 200 milhões”, diz Pacheco, reforçando que nunca deveu dinheiro para banco algum.
A Cristália investe em tom o de 4% do faturamento líquido em inovação. A em presa já tem 107 patentes registradas e mais de 300 depositadas (a aprovação é uma longa espera). Diferentemente das outras grandes farmacêuticas de capital nacional, cuja produção é ancorada em genéricos, a companhia apostou em desenvolver seus próprios insumos. Na fábrica inaugurada em agosto, a companhia vai produzir seis insumos para tratamento do câncer — no Brasil, até hoje, 100% da matéria-prima necessária para a oncologia era importada.
Infelizmente, a aposta da Cristália em agregar valor à sua produção não é regra entre a indústria brasileira. O professor David Kupfer, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), recorda que o movimento de desindustrialização não é deste século. O processo de industrialização d o Brasil foi interrompido no fim da década de 70 e piorou com a crise dos anos 80. “E o Brasil nunca mais conseguiu se recuperar e retomar o processo de desenvolvimento dos ramos industriais de maior valor adicionado e que dão sustentação ao crescimento”, avalia.
Desde a década de 90, com a rodada de liberalização comercial, “o que se observa é o que na literatura se convencionou chamar de especialização regressiva, em que os setores mais graduados foram ou vêm aos poucos desaparecendo, com o retomo aos produtos mais básicos, aos produtos iniciais das cadeias produtivas, baseados em commodities”. Kupfer vem insistindo na ideia de que há uma doença industrial no Brasil. “A indústria não consegue evoluir nem no ritmo da economia brasileira, que está estagnada. A indústria está involuindo”, resume.
O professor da UFRJ aponta que entre os setores que o Brasil perdeu densidade estão o segmento automotivo (que chegou a ser um quinto da produção brasileira, considerando matéria-prima, autopeças e as montadoras), a mecânica (especialmente bens de capital sob encomenda) e o químico, enquanto o setor eletroeletrônico, também ausente, nunca existiu de fato no país. O Brasil, diz ele, ainda mantém uma indústria tradicional bastante grande, com problemas de competitividade diversos, especialmente porque é a que mais enfrenta a competição asiática — setores têxtil, de vestuário e calçados.
A Calçados Beira Rio é um representante desse segmento, mas apostou em uma estratégia de consolidação de marca junto aos consumidores (consumidoras, principalmente) para diferenciar seu produto. “Aliamos design, moda, conforto e preço competitivo”, explica a diretora comercial e de marketing, Maribel Silva.
A empresa foi destaque no setor no primeiro ranking das melhores do segmento têxtil, couro e vestuário, em 2001, e ficou na segunda posição no anuário de 2019. Ela conta que a empresa tem um amplo mix de produtos e que já não trabalha na tradicional sazonalidade de inverno e verão, sapato fechado e sapato aberto, mas oferece um leque amplo, capaz de atender às demandas de diferentes públicos e culturas. “Com isso, hoje, 17% da produção é destinada ao mercado externo, Antes, era 5%”, lembra.
Junto ao trabalho de marca para fidelizar o cliente — além da própria Beira Rio, a em presa produz os calçados Vizzano e Moleka, entre outros —, a empresa tem feito investimentos para reduzir o custo de produção e também tom ar sua produção “mais verde”, com reutilização da água da chuva, reaproveitamento de materiais (ela usa resíduos para palmilhas e solados novos) e telhas translúcidas em todas as fábricas para poupar energia, entre outras medidas que ao longo dos anos foram permitindo reduzir custos e manter os calçados em um preço competitivo, sem perda de conforto e sem abrir mão do design, diz Maribel.
Paulo Morceiro, Nelson Marconi e David Kupfer não descartam a possibilidade de que a indústria de transformação venha a representar menos de 10% do PIB, mas acham que é possível recuperar uma parte da densidade perdida na última década e meia, embora também não tenham muitas ilusões de que o futuro seja “pujante”. Os três defendem que mecanismos de política industrial são necessários, apesar do desgaste que programas mal desenhados nos últimos anos ocasionaram.
“Houve um desvirtuamento dos instrumentos de política industrial para objetivos que não deveriam ser dela. À medida em que a macroeconomia começou a piorar, muitas medidas de política industrial foram colocadas a serviço de um efeito anticíclico para tentar preservar um certo dinamismo econômico A política industrial não tem, nem pode ter essa função. Isso desgastou os instrumentos, que deveriam ser focados na reestruturação da indústria”, diz Kupfer. “A política de conteúdo local foi sendo posta a serviço de geração de demanda. Não é para isso que ela serve. Ela é uma política de oferta, e não de demanda.”
Paulo Morceiro diz que o longo tempo de desmonte da indústria hoje joga contra sua recuperação. “Ficou mais difícil, a escala de investimentos necessários é muito grande. Não dá para pôr uma pazinha onde os países têm colocado caminhões de dinheiro. O caminho é focar em poucos segmentos, na inovação, procurar nichos dentro de média e alta tecnologia, em setores de serviços empresariais. Software é o cérebro da nova revolução, especialmente junto a máquinas e equipamentos.”
Morceiro e Kupfer concordam que setores onde o Brasil já tem vantagens comparativas — com o a abundância de matéria-prima ou que demandam energia, um insumo que ainda tem no país e que pode ter um preço menor que o atual — podem dar um impulso à retomada. “Em química, petroquímica, setor automotivo, materiais elétricos, por exemplo, a barreira é mais baixa pela história, mas é preciso mapear nichos”, diz Morceiro. Por outro lado, adverte, setores com alimentos, bebidas, têxteis e calçados tendem a perder participação no orçamento das famílias e é preciso ficar atento para essas mudanças.
Marconi também vê falhas nas políticas industriais nos anos 2000. Para ele, faltou foco na inovação e na exportação, e esse deveria ser o caminho agora. Ele não vê o atual governo, contudo, fazendo qualquer movimento nesse sentido, embora veja alguns elementos que podem ajudar a indústria, com o câmbio mais competitivo e juros básicos mais baixos.
Outra ajuda pode vir da reforma tributária. Se ela caminhar no sentido de um imposto sobre valor agregado que desonere a produção, vai ajudar a competitividade do setor, pondera o professor da FGV. Mesmo com uma macroeconomia na direção correta, diz, é preciso ver se o país volta a crescer (há outros elementos jogando contra) e adotar medidas que incentivem os setores corretos. “Mas agora, ao contrário do passado, o governo não tem essa crença [da necessidade de uma política industrial].”
Além de não ter a crença, acredita no contrário, lamenta Kupfer. “É preocupante que, além de não definir boas políticas há muito tempo, o país já não consegue preservar as instituições necessárias. Estamos passando por um preocupante momento de desconstrução da política científico-tecnológica brasileira, por desfinanciamento, por mudança de atribuição de órgãos. Sem alguma capacidade própria de absorção de tecnologia, de conhecimento, não vamos conseguir dar o salto necessário”, argumenta. Morceiro lembra que na Coréia, junto a política industrial, o país fez um forte investimento em educação.
Os três economistas concordam que uma indústria com mais serviços embutidos é a base das mudanças que precisam ser incentivadas. A carreira de Paulo Cunha, o PaCu, executivo que atua no setor de tecnologia da informação há mais de três décadas no país, é um exemplo dessa transformação necessária, pois o próprio setor de TI é o retrato do fim da diferença entre o que tradicionalmente se chama de indústria e o setor de serviços. PaCu trabalhou em empresas com o Intel, Motorola e Microsoft e hoje é o diretor de vendas da Amazon Web Services.
As últimas três décadas, lembra ele, foram de grandes transformações na área de TI e telecomunicações, que começaram em meados da década de 90, quando a internet passa a ser uma rede comercial, indo além do ambiente acadêmico. Ela permite a primeira mudança, que é a saída do data center de dentro das empresas para fora das empresas, e também é a base da segunda grande transformação, a computação na nuvem.
“Com ela, invertemos o jogo, transformando a tecnologia de informação adquirida em consumida”, observa o executivo. E no caso da Amazon, a empresa que atuava no varejo se transforma em uma empresa de tecnologia com o braço da AWS, que permite aos seus clientes, inclusive da indústria tradicional, fazer a transformação digital a um custo muito menor e com mais agilidade.
Se por um lado essa transformação da qual a AWS é um exemplo reduz a necessidade de máquinas (hardwares), por outro lado provoca uma transformação da própria economia. N o ranking do “Valor 1000” do ano 2000, a Nortel Networks e a Intel figuravam, respectivamente, na segunda e terceira posição do segmento de informática. Sem fábricas no Brasil, elas saíram da lista das mil maiores em 2018, mas o ranking também mudou para refletir essa maior conexão entre manufatura e serviços. Os antigos setores de informática e telecomunicações deram lugar ao setor de TI & Telecom. Além das empresas de telefonia, integram a lista das dez maiores receitas líquidas duas companhias que, na formação atual, não existiam há 18 anos, a Allied Tecnologia e a Totvs.
PaCu não vê a história da indústria de tecnologia da informação e de telecomunicações no Brasil com o um relato de perdas. Primeiro, diz ele, a abertura do mercado no início da década de 90 atraiu grandes fabricantes para cá, com o Motorola, Dell e HP; depois, com a privatização das teles, criou um mercado altamente competitivo que permite o acesso de grande parcela da população — além das próprias empresas — aos serviços digitais, e há um mercado imenso para ser explorado.
Pelo potencial, explica, o Brasil foi a sexta região do mundo a receber um centro de computação na nuvem da AW S — hoje são 22 no mundo. “A indústria tradicional pode ter perdido espaço no PIB, mas há outras indústrias crescendo ancoradas nessa transformação digital, e talvez a forma com o eles se complementam [os setores tradicionais e os novos] ainda não estejam sendo corretamente medidos”, acrescenta.
Essa é a transformação que dirige a economia e a indústria no mundo e está no cerne da “indústria 4.0” — ou a Quarta Revolução Industrial. Para Marconi, Morceiro e Kupfer, o Brasil andou atrás na terceira revolução (de desenvolvimento da eletrônica, dos sistemas computadorizados e da robótica) e, apesar do otimismo de PaCu, tem em que o. mesmo aconteça agora, pois até do discurso oficial essa preocupação desapareceu. Que dirá da agenda.
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