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Enquanto o mundo inteiro sofre com uma forte diminuição dos níveis do comércio internacional em decorrência da epidemia de Covid-19, o total da corrente comercial brasileira permanece praticamente inalterado. É o que mostram os dados divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior relativos ao primeiro quadrimestre do ano. As exportações para a Ásia, em especial para a China, são o carro-chefe desse resultado e, de acordo com analistas ouvidos pela RFI, atritos recentes entre os dois países não devem se refletir em obstáculos a longo prazo.

Enquanto o mundo inteiro sofre com uma forte diminuição dos níveis do comércio internacional em decorrência da epidemia de Covid-19, o total da corrente comercial brasileira permanece praticamente inalterado. É o que mostram os dados divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior relativos ao primeiro quadrimestre do ano. As exportações para a Ásia, em especial para a China, são o carro-chefe desse resultado e, de acordo com analistas ouvidos pela RFI, atritos recentes entre os dois países não devem se refletir em obstáculos a longo prazo.

De janeiro a abril, a corrente de comércio brasileira somou US$ 123,4 bilhões, apenas 2% menor do que a registrada no mesmo período de 2019, que foi de US$ 126,2 bilhões. A variação é considerada uma das menores entre as vinte maiores economias do mundo, o chamado “G20”.

No momento em que a Organização Mundial do Comércio (OMC) projeta uma queda mundial do volume do comércio entre -13% e -32% no ano, os resultados obtidos pelo Brasil, até agora, são positivos. Se considerado o volume exportado, livre do efeito da queda dos preços internacionais, o país cresceu sua exportação no mês de abril e no quadrimestre em 2,9% e 1,1%, respectivamente.

Balanço divulgado pelo Ministério da Economia aponta, contudo, uma forte queda na venda de produtos e matérias-primas brasileiras para diversas regiões do planeta no primeiro quadrimestre: as exportações para a América do Norte caíram 18,5%, para a América do Sul caíram 21,2%, para a América Central e Caribe caíram 57,1%, para o Oriente Médio caíram 29,9 %, para a África caíram 1,5% e para a Europa, queda de 3,5%.

Em contrapartida, as exportações brasileiras para a Ásia subiram 15,5% no mesmo período em comparação com o primeiro quadrimestre de 2019. Ou seja, apesar do projetado efeito coronavírus sobre a demanda mundial, as exportações brasileiras para a China cresceram 11,3%.

“Isso não me surpreende, porque os Estados Unidos estão em grande dificuldade por conta da Covid-19”, analisa Thiago Aragão, sócio da Arko Advice, empresa de análise de risco político, em entrevista à RFI. “Se a situação fosse diferente, a China compraria mais soja deles, pois o acordo comercial entre China e EUA estaria em pleno funcionamento”, acrescenta o pesquisador sênior do CSIS – Center for Strategic and International Studies de Washington DC. “Além disso, o embate entre os americanos e a China aumentou substancialmente, num momento em que os chineses estão em plena recuperação após um momento crítico da pandemia e estão comprando bastante”, afirma.

O mercado asiático passou a representar 47,2% do total das exportações brasileiras. Desconsideradas as duas maiores economias da região (China e Japão), as vendas para a Ásia no primeiro quadrimestre foram maiores do que as exportações brasileiras para os EUA e México juntos.

De acordo com o secretário Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, Marcos Toyjo, as orientações do presidente Jair Bolsonaro “para manter relações comerciais fortes e diversificadas” estão entre as explicações para o bom desempenho das exportações brasileiras. “O perfil do agronegócio brasileiro” também colaborou com os resultados, explicou Troyjo à imprensa brasileira, na data da divulgação dos dados da balança comercial, em fim de abril.

Brasil e China: dois gigantes comerciais

As relações entre Brasil e China durante a pandemia de Covid-19 foram o tema de um encontro na terça-feira (12) promovido pelo The Atlantic Council’s Adrienne Arsht Latin America Center, que reúne especialistas em todo o mundo para debater temas da atualidade e o mundo dos negócios. Com um mercado somado de 1,6 bilhão de pessoas, os dois gigantes têm uma longa história comercial e um futuro promissor.

“Os números do comércio com China não são uma surpresa. A China tem sido, há mais de 10 anos, o maior parceiro comercial do Brasil que, de seu lado, não representa mais do que 3% de todas as compras dos chineses ao redor do mundo” contextualiza Roberto Martins, advogado brasileiro da Trench Rossi Watanabe.

“Há uma comunidade de negócios acostumada a trabalhar conjuntamente, os chineses estão aprendendo português e os brasileiros mandarim, há uma admiração mútua”, descreve. “Além disso, o Brasil responde rápido quando a China precisa de comida e de commodities. E, apesar da Covid-19, as pessoas precisam comer. Isso explica as exportações recordes”, diz Martins.

Em abril de 2020, o Brasil quebrou recordes históricos mensais de exportações em volume e valores nos seguintes produtos: óxido de alumínio/alumina (770 mil toneladas por um total de US$ 228 milhões), minério de cobre (121 mil toneladas por US$ 231 milhões), ouro (US$ 278 milhões), algodão bruto (91 mil toneladas por US$ 141 milhões), soja (16,3 milhões de toneladas por US$ 5,5 bilhões), farelo de soja (1,7 milhão de toneladas), óleos combustíveis (1,3 milhão de toneladas), carne bovina fresca, refrigerada ou congelada (116 mil toneladas por um total negociado de US$ 509 milhões) e carne suína (63 mil toneladas por US$ 154 milhões).

“Brasil e China são clientes suplementares. Os chineses precisam de matérias-primas e alimentos e nós precisamos de produtos manufaturados e de investimentos em infraestrutura”, explica Roberto Martins. “Por isso, apesar de tensões políticas, as coisas andam bem. No longo prazo, o que vai fazer a diferença em termos de investimentos é a confiança”, diz o advogado.

Críticas aos chineses durante pandemia

Quando se fala em confiança nos negócios, muita gente se pergunta se repetidas críticas de autoridades brasileiras à China por conta da pandemia do novo coronavírus poderiam fazer com que o país asiático mudasse seus planos em relação ao comércio com o Brasil.

Um dos incidentes mais recentes entre Brasília e Pequim aconteceu depois que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, relacionou a pandemia de Covid-19 a um plano da China para “dominar o mundo”, conforme escreveu em um tuíte.

“As relações bilaterais não são lineares e dentro de uma sequência lógica de forma contínua. São cheias de curvas e retornos”, observa Thiago Aragão. “Para uma narrativa virar problema, os dois países tem de considerar assim, ou seja, a China tem de aceitar essas críticas como um problema político. Porém, ainda que tenha demonstrado sua insatisfação, Pequim não transformou isso em atos concretos e mantém sua vontade de sustentar a relação com o Brasil”, completa.

Posteriormente, a Embaixada da China no Brasil publicou uma série de mensagens nas redes sociais em repúdio a comentários feitos pelo deputado Carlos Bolsonaro (PSL-SP), que culpou o país asiático pela pandemia.

“Mesmo que tenha havido manifestações agressivas e de confrontação vindas de indivíduos próximos ao governo brasileiro, do outro lado há uma relação comercial que está muito bem”, observa Aragão. Segundo o analista, no entanto, o sentimento de que “narrativas de críticas, mesmo oriundas de poucas pessoas, possam virar ações concretas capazes de prejudicar as relações comerciais estão entre as preocupações dos chineses em relação ao Brasil”.

Porém, de acordo com Thiago Aragão, a China sente estar “protegida” em relação às narrativas agressivas do Brasil na parte comercial. “Afinal, o Brasil depende tanto ou mais dessa relação bilateral do que a China. Mas o medo de que essas narrativas se tornem atos concretos existe para áreas não relacionadas ao comércio, tais como investimentos chineses no Brasil, potenciais compras de empresas brasileiras, sinal verde para participar de licitações, etc.”.

Outro ponto que merece destaque é “a influência dos Estados Unidos no Brasil, como por exemplo no debate ou suspeição sobre as atividades da gigante das comunicações Huawei”, acrescenta Aragão.

USA x China: uma escolha para o Brasil?

Como uma economia de mercado, o Brasil mantém relações comerciais com diversos países, entre eles a China e os Estados Unidos, duas potências que travam uma guerra comercial espinhosa.

“Os Estados Unidos têm uma relação madura com o Brasil, uma conexão sólida com os bancos nacionais, que entendem o país muito bem e vão estar sempre de olho nos números e nas oportunidades. Com a China, é uma relação comercial ativa e capaz de atrair investimentos, especialmente em infraestrutura”, contextualiza Marcos Caramuru de Paiva, ex-embaixador do Brasil em Pequim (2016-2018).

“Com a China, não temos um relacionamento longo e maduro, mas uma cooperação recente que é forte e que tem espaço para crescer. Vamos ver a longo termo, quando o Brasil cair na realidade pós-coronavírus e precisar atrair investimentos e poupança, e direcionar o dinheiro estrangeiro para as áreas em que o país não consegue desenvolver sozinho”, explica.

A necessidade ou não de o Brasil fazer uma escolha entre a parceria comercial com a China ou com os Estados Unidos foi debatida no encontro promovido pelo Atlantic Council. Para Julie J. Chung, do Departamento de Estado Americano, o momento atual em que ambos os países enfrentam dificuldades econômicas e sanitárias “é propício para o florescimento de novas estratégias e oportunidades”.

No entanto, conforme explicou a responsável pelo Departamento de Assuntos do Hemisfério Ocidental, “as preocupações do governo americano em relação à China, antes e depois da pandemia, são as mesmas: falta de transparência, prestação de contas, cumprimento de regras globais e censura”.

Na opinião de Chung, o Brasil deverá fazer “uma escolha entre os valores que a sociedade brasileira quer integrar ao seu futuro”. De acordo com ela, enquanto os Estados Unidos “impulsionam uma agenda de transparência e combate à corrupção, com respeito a normas internacionais”, a China insiste em um “modelo que permite espionar a sociedade civil e impede, entre outras coisas, a liberdade de religião”.

Já o ex-embaixador do Brasil em Pequim não vê “o Brasil num dilema entre EUA e China”. Marcos Caramuru de Paiva explica que, enquanto os Estados Unidos são um importante parceiro, especialmente em termos da qualidade de seus produtos e por se tratar de uma economia de livre mercado, a China apresenta um tipo diferente de modelo. “O que podemos fazer é estabelecer relações de uma forma conveniente para os dois lados, sabendo que companhias estatais chinesas têm muita importância”, afirma.

De acordo com Paiva, o Brasil precisa entender a realidade chinesa, mas não precisa se privar de aproveitar tais oportunidades. “Há poucas vozes no Brasil que querem desafiar a China porque o país segue um modelo diferente do ocidental. A maioria quer lidar com a China do jeito que a China é”, explica. “Não tem de ser competição entre EUA e China, mas sim um diálogo descente com ambos” conclui Caramuru.

Fonte: BOL

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