Conversamos com as cinco principais escolas de educação executiva do país para saber como elas estão redesenhando seus cursos e MBAs de olho nas novas habilidades (digitais) exigidas
Época Negócios
Às vésperas do Natal, no fim de 2017, os corredores da escola de negócios Saint Paul, nos Jardins, em São Paulo, estavam vazios. A despeito das férias escolares, o ar era de mudança física, com cadeiras empilhadas, ausência de murais, salas com persianas fechadas. O cenário, porém, não era de descaso. "Estamos iniciando uma ampla reforma para transformar todo o prédio", diz o presidente da instituição, José Claudio Securato. "Não é só uma mudança física, para colocar alguns puffs coloridos. É de mentalidade também". A escola está literalmente derrubando paredes, para construir laboratórios e auditórios onde os alunos possam teorizar menos e praticar mais a partir de março de 2018. A Saint Paul não é a única.
A Fundação Dom Cabral (FDC), considerada a melhor escola de negócios da América Latina pelo Financial Times, investe na mesma direção e inaugurou em outubro o Tree Lab, em parceria com a IBM e MRV. Quer ter mais espaço para desenhar protótipos e discutir com os executivos temas como a computação cognitiva. "O processo de aprendizado precisa evoluir. Precisa apostar na postura maker [ato de fazer]. Dado um problema, são os alunos que vão buscar qual o conhecimento precisam adquirir para resolvê-lo", diz Antonio Batista, presidente da FDC.
O reitor incorpora o discurso do "learn by doing" [aprender na prática] e defende que a educação executiva precisa investir no aprendizado baseado em problemas reais e na formação humanística do executivo. "A capacidade de combinar inteligência algorítmica com inteligência socioemocional é o grande desafio das empresas e das escolas de negócios", diz Batista. Novos cursos da fundação têm levado os executivos para terem aulas no museu ou buscado desenvolver líderes através de conceitos diferentes. Como se fosse uma série de TV, divide o conhecimento em episódios e temporadas.
style="display:block; text-align:center;" data-ad-layout="in-article" data-ad-format="fluid" data-ad-client="ca-pub-6652631670584205" data-ad-slot="1871484486">Transformação digital
Diante do impacto da transformação digital, as escolas de negócio brasileiras estão investindo em novos cursos, formatos e plataformas para conseguir oferecer a formação que os executivos e as empresas buscam. Há duas frentes principais, segundo James Wright, da FIA. Uma é desenvolver as habilidades técnicas que estão em evidência, considerando novas tecnologias e modelos de negócio. Perpassam desenvolver conhecimentos em Big Data, blockchain, análise de impacto social, inteligência artificial, machine learning até programação (phyton). Para colocar esses temas dentro da sala de aula com maior rapidez, as escolas brasileiras estão investindo de forma mais intensa em cursos abertos de menor duração – não ficando assim sujeitos à rigidez de um MBA, curso com mais de 360 horas de duração, regulado pelo Ministério da Educação (MEC).
Apenas em 2017, o Insper, por exemplo, promoveu 50 cursos abertos com 130 turmas. Do total, treze foram novos (e dez do portfólio de 2016 foram descontinuados). A tática da escola é buscar ativamente in loco o que o mercado precisa e colocar na "sala de aula" em seis meses. “Há uma busca enorme por aplicabilidade. O executivo vem aqui para que alguém o ajude a resolver um problema que está surgindo para ele naquele momento”, diz Rodrigo Amantea, coordenador acadêmico da educação executiva do Insper. Já a FIA busca flexibilizar o formato de alguns cursos – para ir além de oferecer conhecimentos clássicos e especializações de administração. Fechou, por exemplo, uma parceria com o Coursera e oferece opções de ensino à distância que estejam em linha com o novo aprendizado técnico exigido no mercado.
Outra frente das escolas é investir em habilidades que permitam ao executivo ter uma visão “holística” da empresa. Com a tecnologia mudando setores, profissões e negócios tão rapidamente, manter grades de cursos rígidas, replicando velhas fórmulas, é perigoso e pode se mostrar ineficaz. "Estima-se que, em cinco anos, cerca de 70% das atividades de trabalho não existirão como são hoje. Um bom programa de educação executiva precisa ter consciência disso e investir em habilidades perenes", diz Antonio Freitas, pró-reitor da Fundação Getulio Vargas (FGV). Saber se comunicar, viver na cultura digital, praticar a ética e capacidade de negociação estão entre as habilidades citadas por Freitas.
Todas podem ser incluídas no hall das soft skills, habilidades mais comportamentais – e menos técnicas - que envolvem desenvolver a capacidade de "aprender a aprender", e buscar novos conhecimentos diante dos problemas que surgem. Servem para lidar com a transformação digital na empresa, administrar melhor a carreira e viver melhor. "É unânime os CEOs nos dizerem que o profissional deles está bem formado tecnicamente, mas possui deficiência na área comportamental”, diz Freitas. Para atender especificamente esta demanda, a FGV lançou um MBA de gestão estratégica totalmente focado em soft skills. Chamado de “Desenvolvimento Humano de Gestores”, o curso de dois anos quer ajudar o líder a “entender” as pessoas dentro da organização – independentemente do cenário que a empresa vive.
No Insper, alguns cursos ganharam mentores (executivos de empresas de uma área) e até coachs. “Queremos ajudar o executivo a se conhecer melhor, capacitar-se e estar preparado para ser mais efetivo no ambiente de trabalho dele”, diz Roberto Pedote, vice-presidente de educação executiva do Insper.
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E o MBA?
Incluir o desenvolvimento de soft skills nos MBAs tradicionais faz parte da estratégia das escolas brasileiras – para atualizar e manter a relevância de cursos tão longos e caros. A Fundação Dom Cabral, aliás, aumentou o tempo de seu MBA executivo com este objetivo. O curso, que sai por cerca de R$ 100 mil, ganhou mentoria, coachs, módulos ensinados em inglês e treinamento para criar o profissional que a fundação define como “embaixadores da confiança”. Líderes que acreditem no ambiente de negócios do Brasil, na definição de Aldemir Drummond, diretor de educação executiva da FDC. De forma geral, as instituições brasileiras também destacam as experiências internacionais que seus MBAs podem promover, seja em viagens de curta duração ou módulos totalmente realizados no exterior. Nenhuma delas vê uma crise neste formato de curso e o considera "essencial" para os desafios atuais e futuros. “A gente não vê uma crise no MBA, mas estamos sempre inquietos para desenvolver um programa que forneça as experiências que permitam ao executivo ter uma visão mais integrada, sistêmica e que o permita sair daqui e resolver os desafios do dia a dia”, afirma Pedote.
Dados da Graduate Management Admission Council (GMAC) mostram que o MBA - a despeito dos novos players no setor - continua com alta demanda. As aplicações globais nos programas aumentaram 6% no ano acadêmico 2016/2017. Na Ásia, este número foi de 13%, na Europa de 3% e nos Estados Unidos, 4%. No Brasil, nenhuma das cinco escolas brasileiras consultadas por Época NEGÓCIOS afirmou que seus MBAs tiveram queda no número de inscrições nos últimos anos.
O perfil médio do candidato varia entre 30 e 35 anos e compreende um profissional que está buscando posições de alta liderança. Segundo recrutadores, o título gerado pelo MBA ainda mantém-se relevante no Brasil, principalmente em multinacionais ou em cargos que exigem grande especialização (como um executivo de finanças em uma empresa de commodities, por exemplo). “O MBA funciona ainda como um certificado de formação, de que o executivo desenvolveu aquelas habilidades”, diz o headhunter Daniel Faria, da consultoria Linco.
Os cursos, porém, são restritivos em termos financeiros. É preciso ganhar salários mais altos que a média brasileira (de R$ 2,2 mil, segundo o IBGE) para conseguir sustentar um programa sem o apoio de uma empresa. Os MBAs nas instituições brasileiras com carga horária acima de 360 horas, custam mais do que R$ 60 mil.
As escolas brasileiras sabem que precisam se reinventar para continuarem sendo atrativas. Hoje, enfrentam a concorrência indireta de vários outros players. Há opções múltiplas de aprendizado – focando nas habilidades técnicas e comportamentais – como os MOOCs, instituições novas e até mudanças nas universidade do exterior prestigiadas, como Harvard, Insead e MIT.
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