Imagem: Panvel
Na bolsa desde 1977, rede gaúcha de drogarias fez um follow-on que movimentou R$ 1 bilhão em 2020. Agora, quer dominar o mercado na região Sul, e então entrar de cabeça na capital paulista
Por Bruno Carbinatto
A rede de farmácia Boots, a maior do Reino Unido, foi a primeira a criar marcas próprias de cosméticos, hidratantes e colônias.
No Brasil, quem aposta firme nesse modelo é a Panvel, rede de farmácias do Rio Grande do Sul. Eles lançaram sua marca própria em 1989. Hoje, 500 produtos são vendidos sob a marca Panvel, de maquiagem a bolsas térmicas para água quente.
A rede nasceu em 1967, inicialmente como Dimed Distribuidora de Medicamentos para atender as drogarias gaúchas Panitz e Velgos. Cinco anos depois, as três se juntaram. Da fusão dos nomes das drogarias veio o nome Panvel, com a Dimed no controle da rede.
Ao longo de sua história, a Panvel cimentou sua presença no Rio Grande do Sul, onde virou símbolo regional e hoje tem 22% do mercado local de farmácias. Também se espalhou para os outros estados sulistas, Paraná e Santa Catarina, e em 2016 chegou à capital paulista.
Na bolsa desde 1977 (PNVL3), as ações da empresa ficaram empoeiradas num canto até que, em 2020, a Panvel decidiu fazer um follow-on que movimentou R$ 1 bilhão, numa espécie de “re-IPO”. A captação deu início a uma nova fase da expansão da rede, com a abertura de 60 novas lojas no ano passado. Ao final do primeiro trimestre de 2022, a Panvel contava com 527 pontos de venda – 373 no Rio Grande do Sul, 85 no Paraná, 63 em Santa Catarina e seis em São Paulo.
Nesta entrevista, Julio Mottin Neto, CEO do Grupo Panvel, explica como andam os planos de expansão e conta como a pandemia fez das farmácias não só varejistas de produtos, mas também importantes hubs de prestação de serviços, como vacinação e exames de sangue.
Apesar da expansão recente para São Paulo, os esforços da Panvel ainda se concentram no Sul do país. Por quê?
Basicamente por duas coisas. A primeira é que nossas oportunidades de crescimento em Santa Catarina e no Paraná são muito grandes. Estamos em ambos os estados já há bastante tempo, e ainda assim temos um share de mercado de um pouco menos de 6% em cada um deles. Em termos de comparação, no Rio Grande do Sul, nosso share é de 22%. Existe um gap aí que é bem importante trabalhar nos próximos anos.
A segunda é que o segmento de farmácias se caracteriza por ser um setor de muita presença e muita conveniência, então o volume de lojas que você tem de abrir numa localidade para ter uma operação relevante é muito maior do que em outros setores.
Em alguns segmentos, o varejista coloca uma loja naquela cidade e resolve a sua penetração de mercado, mas a farmácia precisa de muita capilaridade e precisa estar muito perto do consumidor. E o Sul é uma região com praticamente 30 milhões de pessoas – geograficamente grande, com muita população e uma renda interessante também. Nosso plano de região Sul se concretiza praticamente em 2025, então temos mais três anos de foco total.
E para depois de 2025, quais são os planos?
A gente vai continuar a expansão em São Paulo. Temos uma operação tímida na cidade ainda [seis lojas, contra 373 no RS], mas com uma parte digital bem importante. E vamos olhar outros estados. A expansão vai acontecer de forma orgânica: provavelmente Mato Grosso, estados próximos uns dos outros, até por causa da característica de capilaridade da farmácia.
A Panvel importou o modelo de farmácia da Boots para o Brasil. Como foi esse processo?
Nós temos uma característica em comum interessante com a Boots que é a marca ser forte por si só. E ela não remete a farmácias: nós não temos, por exemplo, a palavra “droga” no nome. Nós somos Panvel. Isso nos dá uma flexibilidade, assim como a Boots tem, para navegarmos muito bem no segmento de higiene e beleza com a nossa marca.
Foi um ativo que a gente construiu ao longo do tempo e hoje somos fortes com a marca própria. Dentro do bolo de produtos dessas categorias que vendemos, as de higiente pessoal e beleza, um pouco mais de 20% são de produtos Panvel. Tem itens, por exemplo protetor solar e maquiagem, nos quais os mais vendidos em nossas lojas são os da própria marca Panvel.
Mas hoje todas as concorrentes atuam pesado no setor de cosméticos. Como competir?
Elas atuam, mas não com suas marcas próprias. Geralmente, criam uma terceira marca desses produtos. Para nos mantermos competitivos, apostamos em muita qualidade nesses itens. Eu acho que o grande erro de varejistas que têm marcas próprias é focar só em ser um produto acessível, barato. Nunca tivemos essa pretensão – sempre fizemos um bom balanceamento entre preço e qualidade. Também apostamos em inovação e temos um investimento digital super-relevante.
Falando em digital, a Panvel planeja lançar um marketplace próprio este ano. Como vai funcionar?
Hoje o digital representa um pouco mais de 16% das nossas vendas. Agora, em julho de 2022, vamos expandir a variedade de produtos que o consumidor encontra nas nossas plataformas.
A gente entende que o consumidor ao longo da pandemia mudou. Ele se acostumou a ter uma variedade maior de produtos dentro de uma única plataforma digital, e a melhor forma de você ter essa diversidade é através de marketplace.
É claro que nós ainda queremos ter uma curadoria importante, não vamos fugir das verticais de saúde e bem-estar porque a gente acha que isso termina confundindo as pessoas. Você encontrar um whisky, depois um salgadinho e daqui a pouco um produto para tratamento da pele dentro do mesmo ambiente… Isso é confuso. Queremos ser o melhor marketplace em saúde e bem-estar.
Por que escolheram fazer o follow-on apenas em 2020, apesar de estar na bolsa há muito tempo?
Vimos em 2020 uma oportunidade única de fazer uma captação com um valor de mercado importante. Foi um ano no qual a taxa de juros no Brasil ficou negativa [em termos reais, ou seja, com os juros perdendo da inflação], e quase todas as companhias cresceram muito na bolsa, principalmente as ligadas ao mundo digital. Então fizemos essa emissão para acelerar nossa expansão em uma janela importante de mercado que se criou.
Naquele momento, já vínhamos há três anos seguidos inaugurando pouco mais de 40 lojas por ano. A captação de recursos chegou para acelerar esse processo. Passamos a inaugurar 60 lojas por ano, e em 2022 serão 65, ainda focadas na região Sul. Reforçamos também o nosso investimento em digital.
Na época da captação, a Panvel disse que queria dobrar o faturamento em cinco anos. Como anda o plano?
Está acontecendo. No primeiro trimestre deste ano, crescemos mais de 19% em faturamento, em cima de uma base já alta. O nosso CAGR [taxa de crescimento anual composta] dos últimos anos deu um crescimento de 50%. A gente vem tendo uma aceleração de crescimento puxada evidentemente pela expansão de lojas, mas também pela plataforma digital.
Como a pandemia afetou a Panvel?
Acho que a pandemia acelerou um processo que já acontecia no segmento há algum tempo: a farmácia se tornar um hub de serviços em saúde. As farmácias foram fundamentais para saber se os casos estavam caindo ou subindo, para entender o estágio em que estávamos em termos de números de contágios. Das 500 lojas que a gente tinha, estávamos testando Covid-19 em quase 300 unidades, mais de 50% do total.
Antes, nós já tínhamos serviços, tínhamos vacinas e equipamentos de exame rápido de sangue nas lojas, por exemplo. Mas a pandemia veio para desvendar esse protagonismo das farmácias, e as pessoas daqui pra frente entendem a farmácia como muito mais do que um lugar para comprar produtos, mas também um local para se adquirir serviços de saúde.
Hoje, a parte de serviços já representa em torno de 4,5% do nosso faturamento e nós temos a pretensão de elevar isso até 10%.
O Brasil passa por um cenário de inflação nas alturas e juros idem, o que afeta principalmente as varejistas. Como enfrentar isso?
De fato é um cenário desafiador. Mas temos uma característica muito forte de controle de despesas. A Panvel é uma empresa de 55 anos que nunca deu prejuízo. A gente já passou por Plano Real, Plano Cruzado, Cruzado II, confisco do Collor. Só não tínhamos passado por uma pandemia porque a última tinha acontecido há 100 anos. Sempre fomos uma empresa muito boa de gestão de custos, em cenários muito mais adversos do que este que a gente está vivendo agora inclusive.
Então a gente entende que há uma oportunidade por essa característica e há uma oportunidade também pelo fato de que estamos muito bem de capital. Não são todas as empresas que estão bem capitalizadas nesse momento.
Mas as ações da Panvel estão em queda no ano. Por que o mercado não está tão otimista assim?
O mercado está pessimista justamente com a questão da inflação e dos juros, além da instabilidade das eleições. O grau de incerteza está derrubando os ativos – não é só a gente, praticamente todo o setor varejista vem sofrendo com uma queda significativa das vendas. Mas essas perdas não necessariamente refletem no balanço dessas empresas. Algumas não estão bem, outras estão. Então, para um investidor que está capitalizado, eu entendo que é uma boa oportunidade de entrada porque tem papéis hoje – e não apenas o nosso – que estão num bom preço.
No começo do ano, o grupo Panvel passou por uma reformulação de imagem e mudou de nome (era Grupo Dimed). Por que essa escolha?
Foi um movimento de simplificação. A gente entende que uma das coisas que aconteceu nos últimos anos é que cresce cada vez mais a importância da marca como uma marca empregadora. As pessoas cada vez mais querem fazer parte de empresas que são éticas, diversas e sustentáveis.
Queremos que elas saibam rapidamente que o grupo Panvel é “a Panvel”. Buscamos também um resgate de todos os valores que a marca construiu ao longo do tempo. A gente tem, inclusive, um mote comportamental internalizado: “todo o cuidado ao cuidar”. Isso caracteriza muito a cultura da empresa hoje: o foco do cliente, o foco nas pessoas e o foco na saúde.
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