Correio Braziliense
Infectologistas afirmam que as crianças continuam sendo um público menos afetado pela covid-19 no Brasil. Para os especialistas, não está claro se a variante Delta do novo coronavírus ganhará tanto espaço por aqui. Mas, mesmo que ganhe, afirmam que não há indícios de que bebês, meninos e meninas ficarão doentes com maior gravidade por causa da nova cepa.
“A Delta não tem nenhuma predileção por crianças”, diz Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Ele afirma ser natural que, em um cenário de aumento de casos da covid-19, como ocorre nos Estados Unidos, as pessoas não imunizadas representem uma fatia maior do total de internados.
No Brasil, um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) demonstrou tendência de aumento de hospitalizações de crianças de zero a nove anos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) com teste positivo para a covid-19 nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, nas últimas semanas. Para o pesquisador Leonardo Bastos, do Programa de Computação Científica da Fiocruz, porém, esse crescimento não tem relação com a Delta.
“A hipótese é de que parte dessas hospitalizações é de crianças que estão sendo internadas por outras causas, mas que também estão com covid”, explicou Bastos. Por essa linha de interpretação, bebês, meninos e meninas chegam ao hospital com doenças respiratórias relacionadas a outras infecções que circulam no inverno, mas, quando são testadas para o novo coronavírus, os exames detectam a doença. Os dados são uma projeção com base no Sistema de Informações de Vigilância Epidemiológica da Fiocruz (Sivep-Gripe), do Ministério da Saúde.
Viroses infantis
O fato de que não houve aumento de internações na faixa etária de 10 a 19 anos — que também não está vacinada — reforça a tese de que a causa das internações são os vírus típicos da infância, que acometem os mais novos. O inverno deste ano tem características diferentes: além das temperaturas mais baixas, também caiu o isolamento social, o que contribui para a disseminação de doenças virais, de um modo geral.
“O grau de exposição neste inverno é maior. As crianças agora estão circulando, vendo o avô, o tio. E algumas estão em aula presencial”, disse Bastos. A pesquisa da Fiocruz identificou que o número de óbitos de crianças por covid-19 continua baixo — no Brasil, representa 0,3% do total de mortes. Dados da Secretaria de Saúde de São Paulo indicam que não houve aumento de internações de zero a nove anos na capital. Segundo a pasta, em maio foram 108 internadas com a covid-19 na capital paulista, mas, em junho, caiu para 61 e, em julho, ficou em 55. Os números se referem às redes privada e pública.
O Brasil tem poucos adolescentes vacinados — a maior parte dos estados ainda não chamou todos os adultos para tomar a primeira dose. Em São Paulo, a previsão é de começar a vacinar adolescentes ainda este mês. O Instituto Butantan pediu, em julho, à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para incluir crianças e adolescentes de três a 17 anos na bula da CoronaVac, desenvolvida em parceria com o laboratório chinês Sinovac.
Segundo os especialistas, o país precisa avançar na imunização dos adultos para, posteriormente, alcançar as crianças e adolescentes. Meninos e meninas com menos de 12 anos só devem tomar a vacina no ano que vem, segundo projeção dos médicos brasileiros. A previsão de avanço da Delta por aqui coloca mais pressão para a agilidade da vacinação. “Temos de vacinar os pais, avós, professores. Os casos de surtos acometem muito mais os adultos”, salientou Francisco Ivanildo, infectologista e gerente médico do Sabará Hospital Infantil.
Dificuldades em detectar sintomas
Durante a pandemia da covid-19, a taxa de internação entre crianças sempre foi a menor quando comparada a de jovens, adultos e, principalmente, idosos. Nos hospitais de São Paulo, desde o início da pandemia, não foram registradas mais de 125 hospitalizações de crianças de zero e nove anos.
No Rio de Janeiro, as internações de crianças da mesma idade não chegaram a 75 no total, segundo dados da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Isso porque há dificuldades em se contabilizar o número de contaminados nessa faixa etária, pois a maioria das crianças é assintomática. O médico coordenador da emergência pediátrica do Santa Lúcia, Alexandre Nikolay, explicou que o meio de contaminação das crianças é intradomiciliar. “Os pais se contaminam fora de casa e trazem o vírus para dentro de casa”, explicou.
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