Decifrando a origem do Parkinson

 ( Correio Braziliense )

Jornalista: Vilhena Soares

21/11/19 - A análise genética tem sido uma das ferramentas mais usadas em pesquisas médicas. A observação detalhada obtida por meio dessa tecnologia é uma grande aliada na busca por causas de enfermidades ainda não bem compreendidas. Graças a esse recurso, pesquisadores norte-americanos conseguiram identificar fatores moleculares envolvidos no Parkinson, um problema neuromotor que atinge a população idosa. Os dados, apresentados na última edição da revista Nature Communications, podem ajudar no desenvolvimento de novas terapias.

O estudo é continuação de uma pesquisa do mesmo grupo, que analisou outra doença neurodegenerativa cujos mecanismos moleculares também são pouco conhecidos: o Alzheimer. “Publicamos um estudo na revista Cell em 2013 sobre essa enfermidade. Ao revisar a literatura das doenças semelhantes a esse tipo de demência, observamos que não havia modelos de redes moleculares eficazes para o estudo da doença de Parkinson idiopática (sem causa definida), que é a mais comum aos pacientes, respondendo por 80% dos casos”, conta ao Correio Bin Zhang, professor de genética e ciências genômicas na Escola de Medicina Icahn de Monte Sinai, nos Estados Unidos, e um dos autores do estudo.

Os pesquisadores combinaram dados de oito estudos diferentes em que foram feitas análises post mortem da substância negra — a parte do cérebro mais afetada pela doença de Parkinson. Isso deu à equipe um conjunto de dados de mais de 83 pacientes, que foi comparado ao formado por informações de 70 voluntários que não tinham a doença. Zhang e os colegas usaram uma técnica estatística de alta precisão chamada análise multiescala de redes de genes (MGNA, em inglês).

“Essa abordagem de análise de rede em várias escalas é uma maneira poderosa de dissecar os mecanismos moleculares de doenças complexas, como o Alzheimer”, explica. Com a aplicação da tecnologia, eles identificaram vários reguladores-chave das redes de genes que nunca haviam sido associados ao Parkinson.

Em seguida, a equipe partiu para a validação das descobertas em experimentos com camundongos. Para isso, escolheram o regulador-chave STMN2, que normalmente é expresso em neurônios que produzem a dopamina, um neurotransmissor que é encontrado em quantidade reduzida na substância negra dos pacientes de Parkinson.

Ao silenciar o gene STMN2 na substância negra das cobaias, elas passaram a desenvolver complicações ligadas ao Parkinson, como degeneração dos neurônios relacionados à dopamina na substância negra e aumento na concentração da proteína alfa-sinucleína. Além disso, os animais passaram a realizar tarefas motoras com dificuldade, como manter o equilíbrio em uma haste, um indicativo da interrupção do controle dessa função motora. “Esse estudo oferece uma nova abordagem para entender a maioria dos casos de Parkinson”, frisa Zhang.

Mais estudos


Ivan Coelho, neurocirurgião do Hospital Maria Auxiliadora, em Brasília, explica que há dois tipos de Parkinson. A menos incidente, que acomete cerca de 20% dos pacientes, tem origem mais esclarecida. “Nós sabemos que é provocado por um tipo de gene específico. Todo o resto é o Par-kinson idiopático, ou seja, sem causa definida ainda. Por isso, a busca desses especialistas pelos mecanismos relacionados a esse tipo da doença, quais os fatores genéticos e também ambientais, que podem estar relacionados”, diz. “Esses fatores podem estar relacionados à perda dos neurônios dopaminérgicos localizados na substância negra do cérebro, que é um dos mecanismos relacionados ao Parkinson.”

Apesar da necessidade de mais análises, inclusive com um número maior de pacientes, a equipe americana acredita que os genes descobertos sugerem que novas vias devem ser consideradas como alvos potenciais para o desenvolvimento de drogas para o tratamento da doença. “Os modelos de redes moleculares de Parkinson identificados por esse estudo facilitarão a identificação de novos alvos e o desenvolvimento de terapias para essa doença, com a criação de drogas, já que, agora, temos uma compreensão muito melhor das vias principais e dos genes envolvidos na progressão dessa enfermidade”, justifica Zhang.

Para Coelho, o trabalho pode ajudar na busca de medicamentos, mas ainda precisa ser aprofundado, o que pode ser difícil, considerando a complexidade da doença. “É difícil avançar no entendimento do Parkinson, porque só podemos analisar tecidos post mortem. Não temos como fazer algo tão invasivo em pacientes vivos”, explica. “Outra dificuldade é que essas análises precisam ser feitas com indivíduos com a doença que viveram em lugares distintos, para que se possa fazer uma análise comparativa, rendendo, assim, mais detalhes.”

Segundo o médico brasileiro, o interesse na área de pesquisa do Parkinson tem crescido nos últimos anos. “Todos estamos envelhecendo, viveremos mais, e a chance de as pessoas sofrerem com esses males neurodegenerativos é maior. Os pesquisadores têm contado com o apoio financeiro de muitos que se interessam pelo tema, como milionários que nem o Bill Gates. Pode ser que, com esses financiamentos, tenhamos respostas para essa e outras doenças que envolvem demência. É uma questão de tempo”, opina Coelho.

“Agora, temos uma compreensão muito melhor das vias principais e dos genes envolvidos na progressão dessa enfermidade”, diz Bin Zhang, professor da Escola de Medicina Icahn de Monte Sinai e um dos autores do estudo

Enviar-me um e-mail quando as pessoas deixarem os seus comentários –

DikaJob de

Para adicionar comentários, você deve ser membro de DikaJob.

Join DikaJob

Faça seu post no DikaJob