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PGR pediu cancelamento da delação de Nelson Mello por causa de omissões e informações falsas


Aguirre Talento e André de Souza

O Globo

BRASÍLIA – O ex-diretor da Hypermarcas (atual Hypera Pharma) Nelson Mello admitiu à Procuradoria-Geral da República (PGR) que omitiu fatos em sua delação premiada com o objetivo de tentar proteger a empresa e seu acionista majoritário, João Alves de Queiroz Filho, o Júnior. Por causa dessas omissões e de mentiras em seus depoimentos, a PGR pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) o cancelamento da delação de Nelson Mello.
De acordo com a PGR, Nelson Mello omitiu que o grupo Hypermarcas atuou para obter vantagens em uma medida provisória no Congresso Nacional e também mentiu ao dizer que não sabia quais eram os parlamentares beneficiados por seus pagamentos de propina feitos por intermédio de um lobista. As provas apontam repasses para os senadores Eduardo Braga (MDB-AM), Renan Calheiros (MDB-AL) e aos ex-senadores Eunício Oliveira (MDB-CE) e Paulo Bauer (PSDB-SC), atual secretário especial para o Senado na Casa Civil.

“Constatando que o avançado estágio das investigações tornava inverossímil a tese de que desconhecia as tratativas relacionadas à MP 627, Nelson Mello reconheceu que, buscando proteger o grupo Hypermarcas, omitiu do Ministério Público que João Alves Queiroz Filho, acionista majoritário da empresa, também participava dos atos ilícitos praticados por Nelson Mello e deles tinha pleno conhecimento”, escreveu a PGR no pedido de rescisão da delação. No depoimento, o ex-diretor afirmou que “omitiu a participação do acionista majoritário (João Alves)” e justificou sob o argumento que “fez isto com a intenção de não prejudicar o grupo”. “Já procurou o Ministério Público pra reconhecer seu erro, revelando que João Alves teve conhecimento dos atos do depoente”, disse Nelson Mello.

As investigações sobre as mentiras de sua delação começaram depois que o doleiro Lúcio Funaro assinou delação com a PGR e revelou a participação do dono da Hypermarcas nos fatos criminosos.

Para a PGR, Nelson Mello também omitiu fatos relacionados à atuação de senadores do MDB em defesa dos interesses da empresa. Em seu depoimento inicial, o ex-diretor havia afirmado que fez pagamentos ao lobista Milton Lyra para obter boa relação com senadores do MDB, mas não detalhou se esses senadores receberam propina e se houve contrapartida na atuação deles no Congresso.

Ao cumprir mandados de busca e apreensão contra o delator, porém, a Polícia Federal encontrou provas de que Nelson Mello sabia exatamente quais parlamentares se beneficiaram com os pagamentos. Tabelas internas usadas pelo delator listavam contratos fictícios firmados com empresas destinadas a repassar propinas a esses emedebistas e projetos fictícios, que na verdade serviriam para se referir a cada um dos políticos.

“Na planilha ‘Projeto Sal Gema I (AL)’ , que indica os contratos com a Credpag, a Calazans Advogados e a ARC, todos mencionados acima, obviamente se refere ao senador Renan Calheiros (MDB-AL). De fato, Renan Calheiros é senador pelo Estado de Alagoas, tem intensa relação com Milton Lyra, o qual atuou nesses contratos todos, como visto, e foi presidente da Sal Gema Indústria Química SA. No ‘Projeto Parintins I (AM)’ , alude-se a Eduardo Braga, um dos ‘amigos’ de Milton Lyra expressamente mencionados por Nelson Mello. No ‘Projeto Pe. Cícero I (CE)’, obviamente Nelson Mello se refere a Eunício Oliveira. Além de Eunício Oliveira ser natural do Ceará, os contratos que constam nessa planilha são com a Confirma e a Campus [empresas apontadas como recebedoras de recursos destinados ao ex-senador]”, escreveu a PGR.

Paulo Bauer

Segundo a PGR, o delator também omitiu uma série de contratos fictícios da Hypermarcas no valor de R$ 11,5 milhões que teriam beneficiado o ex-senador Paulo Bauer (PSDB-SC), que atualmente ocupa o cargo de secretário especial para o Senado Federal na Casa Civil da Presidência da República. Nos primeiros depoimentos, ao ser questionado sobre esses contratos, ele disse não se recordar deles. Somente depois, em novo depoimento, Mello esclareceu que eles diziam respeito a Bauer. Ainda assim, diz Dodge, o delator "trouxe uma narrativa bem sucinta sobre os pagamentos".

De qualquer forma, o novo depoimento levou à instauração de um inquérito no STF para investigar Bauer. Nesse processo, Mello foi ouvido novamente. Dessa vez, diz a PGR, ele "forneceu um relato pormenorizado" e "detalhou o modus operandi dos respectivos pagamentos efetivados em benefício do parlamentar", além de ter apontado a participação de outros funcionários da Hypermarcas que não mencionara antes. Mas tudo isso só ocorreu porque os investigadores apreenderam várias provas que tornavam impossível sustentar a versão anterior.

"Como se percebe, nesse último depoimento Nelson Mello forneceu uma série de dados que haviam sido sonegados anteriormente, desde quando pactuado o acordo de colaboração. Há que se destacar, contudo, que esse último depoimento ocorreu após o cumprimento de medida de busca e apreensão deferida no bojo do INQ 4716 (que investiga Paulo Bauer), momento em que várias dessas informações já haviam sido descobertas autonomamente pelos órgãos persecutórios em decorrência das investigações efetivadas no bojo do INQ 4716. Ou seja, o colaborador omitiu tais fatos até o momento em que já não mais poderia alegar desconhecê-Ios", anotou Raquel Dodge.

A decisão de rescindir ou não a delação será do ministro Edson Fachin, relator dos processos da Operação Lava-Jato no STF. Por enquanto, ele deu apenas um despacho abrindo prazo de dez dias para que Nelson Mello se manifeste a respeito da rescisão defendida por Dodge. Depois disso, haverá novo prazo, de cinco dias, para que ele e a PGR digam que provas devem ser produzidas para basear a decisão final de Fachin.

Outros lados

A defesa de Nelson Mello afirma que só vai se manifestar sobre o assunto nos autos e diz que ele “tem dado demonstrações concretas e sucessivas de seu compromisso de colaborador”. Em nota, a Hypera Pharma “informa que elegeu Comitê Independente em junho de 2018 para avaliar os fatos relacionados ao seu ex-diretor de Relações Institucionais. Além disso, a companhia continua colaborando com as autoridades”.

Em depoimento prestado em janeiro deste ano, Bauer disse não ter pedido contribuições à Hypermarcas para sua campanha ao governo de Santa Catarina em 2014, quando ficou em segundo lugar. Também negou ter ajudado a empresa no Congresso em troca de dinheiro.

As assessorias de Eduardo Braga e Eunício Oliveira afirmaram que eles não iriam comentar. A assessoria de Renan Calheiros ainda não respondeu aos contatos da reportagem.


Os demais políticos citados foram procurados na noite desta quinta-feira, mas ainda não houve resposta.

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