Seria de se imaginar que os conselhos médicos mais corriqueiros têm base em um vasto volume de pesquisa científica. Mas, recentemente, os pesquisadores descobriram que quase 400 práticas corriqueiras eram simplesmente negadas pelos resultados de estudos publicados nas principais revistas.
Dos mais de três mil estudos publicados entre 2003 e 2017 na JAMA e na Lancet, e entre 2011 e 2017 na New England Journal of Medicine, mais de uma em cada 10 apontaram para uma “reversão da medicina”: uma conclusão oposta àquela que é tida pelos médicos como solidamente embasada.
“A leitura mostra a necessidade de mais humildade”, disse Vinay Prasad, da Universidade Oregon Health and Science, autor da ideia por trás do estudo. “Pessoas muito inteligentes e bem-intencionadas vêm receitando essas práticas há muitos e muitos anos, mas estão enganadas.”
Algumas ideias foram totalmente desacreditadas, mas nem todas. Eis aqui algumas revelações que contrariam teorias médicas amplamente defendidas. A alergia ao amendoim ocorre independentemente da exposição da criança ao amendoim antes dos três anos. Os médicos aconselham os pais a evitar o amendoim na alimentação do bebê até os três anos de idade. Mas crianças expostas ao amendoim antes mesmo de completarem um ano não apresentaram maior risco de desenvolverem alergia.
O óleo de peixe não reduz o risco de doença cardíaca. Houve um momento em que a ideia segundo a qual a gordura do peixe evitaria problemas cardíacos pareceu lógica. As pessoas cuja dieta contém grande quantidade de peixes gordos parecem ter uma incidência menor de enfermidades cardíacas.
Os peixes gordos contêm ácidos graxos ômega-3. Os suplementos de ômega-3 reduzem os triglicérides, e um alto nível de triglicérides está ligado à doença cardíaca. Além disso, os ácidos graxos ômega-3 parecem reduzir a inflamação, componente importante dos ataques cardíacos. Mas, em um teste envolvendo 12.500 pessoas, a ingestão diária de suplementos de ômega-3 não protegeu contra a doença cardíaca.
O ginkgo biloba não protege da perda de memória e demência. O suplemento, feito a partir das folhas do ginkgo, era usado na medicina chinesa antiga e ainda é promovido como forma de preservar a memória. Um amplo estudo nos Estados Unidos mostrou de maneira definitiva que esse suplemento é inútil para tal fim.
Para tratar a dor aguda de pacientes na sala de emergência, uma dose oral única de opioides não é mais eficaz que remédios como aspirina e ibuprofeno. Um estudo clínico mostrou que alternativas muito mais seguras proporcionam um alívio para a dor comparável ao dos opioides em pacientes da emergência. O tratamento com testosterona não ajuda homens mais velhos na retenção da memória.
Alguns homens apresentam baixo nível de testosterona e problemas de memória, e estudos indicaram que homens de meia idade com níveis mais altos de testosterona pareciam ter os tecidos cerebrais melhor preservados. Homens mais velhos com níveis mais altos de testosterona também parecem ter desempenho melhor nos testes de funcionamento mental. Mas um exame clinico rigoroso mostrou que a testosterona não tinha mais efeito que uma pílula de açúcar no sentido de evitar a perda da memória.
Para proteger contra ataques de asma, não adianta eliminar os ácaros, ratos e baratas do lar. Os lares com crianças que sofriam de asma eram aconselhados a eliminar essas pragas. De acordo com a teoria, reações alérgicas a esses animais poderiam causar os ataques.
Mas a dedetização intensiva de lares com crianças sensíveis aos camundongos não resultou em uma redução na frequência dos ataques de asma. Se a bolsa de uma gestante romper antes da hora, o bebê não precisa nascer imediatamente. Às vezes, antes do fim da gestação, a membrana envolvendo o feto se rompe e há vazamento do líquido amniótico.
Os obstetras temem que bactérias possam invadir um ambiente até então estéril em torno do feto, causando uma infecção. Os médicos acreditavam que o melhor seria precipitar o parto. Mas exames clínicos mostraram que, se os obstetras acompanharem cuidadosamente o feto enquanto aguardam o início natural do parto, o risco de infecção para o bebê não aumenta. E os bebês que aguardaram o fim da gestação nasceram mais saudáveis, com menos desconforto respiratório e menor risco de morte do que aqueles nascidos precipitadamente logo após a ruptura da bolsa. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
Fonte: O Estado de S. Paulo
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