Folha de S.Paulo
Jornalista: Iara Biderman
07/03/20 - Quando Camila Pedreira tinha três meses, sua mãe a levou para fazer biópsia das bolhas que surgiram em seu corpinho. Os médicos falaram que a menina não passaria dos 5 anos. Hoje, tem 32.
Aos 3, Camila se mudou com a mãe de São Paulo para o interior da Bahia, ainda sem diagnóstico preciso. Passou parte da vida sem saber que sofria de epidermólise bolhosa, doença congênita causadora de bolhas e lesões na pele e nas mucosas.
“O que minha mãe fazia era me oferecer uma alimentação saudável. Quando se formava uma bolha, ela furava e passava pomada. Só isso”, diz.
Camila morou até os 19 anos na Bahia. “Não conhecia ninguém com a mesma doença, levava a vida mais normal possível. Brincava, lutava capoeira, jogava futebol e vôlei. O máximo que eu fazia era usar calça comprida e tênis para ter menos chance de machucar a pele”, conta.
Em 2006, foi às pressas a São Paulo para se submeter a uma cirurgia de vesícula. Ao acordar da anestesia, percebeu que estava grudada na cama. Quando o apoio da maca foi retirado, a pele das suas costas foi inteira puxada.
Depois disso, Camila começou uma busca na internet. Encontrou pessoas com o mesmo problema e uma médica que tratava pacientes em condições semelhantes. “Só aí descobri que tinha uma doença sem cura.”
Passou a usar curativos à base de silicone e a tomar medidas para evitar lesões —por exemplo, ela não pode aplicar esparadrapo na pele. Também eliminou da dieta alguns alimentos (laticínios, frutos do mar, pratos muito condimentados ou com corantes) que desencadeiam mais bolhas.
Camila não tem a forma mais grave de epidermólise bolhosa, que afeta também articulações e outros tecidos. Sua pele, porém, é mais frágil do que a da maioria das pessoas com a doença.
Mesmo depois ter feito 12 biópsias, ela ainda não descobriu qual alteração é responsável por sua condição. A cada dois meses, consulta-se com uma dermatologista.
Quando tem de fazer um exame médico, Camila leva um kit de curativos para tratar machucados que ele possa causar. Também evita alguns procedimentos.
“Precisava fazer um eletrocardiograma, mas os eletrodos iriam arrancar toda a minha pele”, diz.
De resto, ela diz ter uma rotina muito próxima à de qualquer pessoa sem uma condição rara de saúde.
Formada em sociologia e em biologia, trabalha das 14h às 22h na secretaria da faculdade onde estudou e pretende cursar uma pós-graduação em perícia criminal. Também dá palestras em escolas sobre como ajudar alunos com epidermólise bolhosa.
Evita praia, piscina e todas as situações em que precise expor o corpo. Foge de aglomerações, para não se machucar nem pegar infecções.
Para se proteger, ela usa peças de roupa mais fechadas e de tons escuros. “Às vezes estou na rua ou no trabalho e uma bolha estoura. Se a roupa for clara, mancha tudo.”
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