EDITORIAL: Concentração hospitalar

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O Estado de S.Paulo

 

13/01/20 - Acompanhando uma tendência global de duas décadas, as fusões e aquisições de hospitais e laboratórios têm crescido no Brasil. Nos últimos três anos o crescimento se acelerou, sendo registradas, respectivamente, 31, 50 e 52 operações. Em tese, a concentração pode tanto melhorar como piorar os serviços. Por um lado, a capacidade gerencial ou clínica do hospital adquirido pode se beneficiar com a expertise do comprador e com ganhos de escala. Mas, por outro lado, a burocracia resultante desta escala pode absorver recursos que poderiam ser investidos na melhora dos serviços, e as concentrações podem, sobretudo em âmbito regional, enfraquecer as pressões competitivas para que os hospitais busquem mais qualidade com preços menores. Um estudo do New England Journal of Medicine sobre o mercado norte-americano permite mensurar o que tem ocorrido na prática naquela economia pujante – mas pode, também, servir de exemplo para o caso brasileiro.


O que já se sabia de levantamentos anteriores é que as fusões levam a um aumento dos preços. Segundo pesquisa do Quarterly Journal of Economics, essa majoração é da ordem de 6% a 7%. Faltavam, no entanto, dados sobre o impacto na qualidade dos serviços.


Os pesquisadores do estudo mais recente avaliaram o desempenho de quase 250 hospitais adquiridos ao longo dos três anos anteriores à aquisição até quatro anos depois, mensurando quatro variáveis: satisfação do paciente; mortes no primeiro mês de internação; retornos um mês após a alta; e a frequência com que pacientes cardíacos, pulmonares e cirúrgicos receberam os cuidados recomendados.


“As fusões e aquisições dos hospitais estão associadas a uma modesta deterioração na experiência dos pacientes, pequenas e insignificantes mudanças na readmissão e nas taxas de mortalidade e efeitos inconclusivos sobre o desempenho dos procedimentos clínicos”, constatam os pesquisadores. Em outras palavras: a crescente concentração do mercado hospitalar aumenta os preços, mas não melhora a qualidade dos serviços.


Ao menos em relação à experiência do paciente, a qualidade piora. A hipótese dos pesquisadores é que, ao contrário dos procedimentos clínicos, os aspectos mais observáveis pelos pacientes, como a qualidade do atendimento, são particularmente afetados pelo enfraquecimento das pressões competitivas para atrair clientes.


Os empresários responsáveis por estas transações sempre as justificaram afirmando que a majoração nos preços era compensada pela melhora na qualidade. Mas agora, como disse ao Wall Street Journal a médica Susan Haas da Escola de Saúde Pública de Harvard, os responsáveis por regular o mercado podem replicar: “Provem”. Entre os eventuais efeitos relativos à queda de competitividade, as autoridades têm avaliado relatos de cobranças abusivas e falta de transparência por parte de hospitais, laboratórios e seguradoras.


Em que pesem as particularidades nacionais, os desafios são similares para os reguladores brasileiros. Além das crescentes fusões e aquisições de hospitais, e de um mercado de laboratórios historicamente concentrado, vem aumentando no País a verticalização da cadeia de atendimento, pela qual as operadoras de planos de saúde constituem sua própria rede de hospitais e serviços auxiliares para controlar os custos.


Recentemente, em matéria publicada no site da revista Época, o presidente da Confederação Nacional de Saúde, Breno Monteiro, alertou para o fato de que o descredenciamento de hospitais pelas operadoras para favorecer sua própria rede restringe a concorrência, com o risco do aumento de preços acompanhado pela queda na qualidade. Segundo ele, a Agência Nacional de Saúde Suplementar seria o âmbito próprio para promover essa discussão.
Há aí um campo importante para pesquisadores e reguladores da saúde no Brasil. Esperase que os primeiros tragam novas luzes sobre os reais efeitos da crescente concentração do mercado que cabe aos segundos regulamentar com cautela, mas sem demora

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