Poucas empresas no Brasil crescem ao ritmo tão forte quanto o da farmacêutica Cimed. Quarta maior companhia do setor em volume de vendas, a companhia fechou 2018 com faturamento de R$ 1,3 bilhão. A meta é alcançar, em 2020, receitas de R$ 2 bilhões — o dobro de 2017, quando superou pela primeira vez a barreira do bilhão de reais. Para efeito de comparação, a Cimed tem avançado numa velocidade três vezes superior àquela do mercado brasileiro. Boa parte do resultado se deve ao trabalho do presidente João Adibe, executivo de estilo agressivo e confiante que tem se tornado referência da indústria farmacêutica brasileira. Nesta entrevista, Adibe diz que o crescimento dos últimos anos pode ser explicado pelo modelo desenvolvido pela empresa a partir da década de 1990, que consistia em chegar aos cantos mais remotos do país. “Possuímos a fábrica de embalagens, a indústria farmacêutica em si e a distribuição. Com isso, temos um acesso mais rápido aos pontos de vendas.” Adibe aposta no avanço dos medicamentos genéricos, que ocupam apenas 30% do mercado nacional, enquanto a média mundial é 55%. Ele também se diz otimista com os novos rumos da economia brasileira. “O Brasil começou a decolar novamente”, diz. “Com as reformas, passa a ser um país com mais solidez para os investimentos”, destaca.
Qual é a sua avaliação sobre o atual cenário da economia brasileira?
Apesar da elevada expectativa, o país ainda não deslanchou. Vivemos um momento muito positivo. Talvez a aprovação da reforma da Previdência tenha demorado um pouco. Poderíamos ter feito ainda no primeiro semestre e não ter perdido o ritmo em 2019. Mas tudo indica que a gente começou a decolar de novo.
Como o avanço da reforma da Previdência impacta o setor farmacêutico?
Tanto a reforma da Previdência quanto a reforma tributária afetam diretamente os negócios. A da Previdência será fundamental para regularizar a casa, e a tributária, para colocar fim à guerra fiscal. A partir do momento em que a gente consegue resolver esses dois problemas, o Brasil passa a ser um país com mais garantias de solidez para os investimentos. Então, o cenário é de otimismo.
Que outras medidas podem contribuir para o crescimento do setor farmacêutico?
Acho que um dos próximos passos do governo será reduzir a carga tributária em alguns eixos, como medicamentos. O setor é o terceiro com a maior carga, que chega a 35%. Vai ajudar muito quando o governo começar a olhar para o setor e conseguir desonerar algumas coisas. Assim, vamos conseguir repassar os benefícios aos preços para o consumidor.
A Cimed fechou 2018 com faturamento de R$ 1,3 bilhão. Onde a empresa espera chegar?
Minha vida é feita de números. Lembro-me da primeira vez em que faturamos R$ 100 mil, R$ 1 milhão e, depois, R$ 1 bilhão, que foi em 2017. Levamos 30 anos para conquistar o primeiro bilhão. Agora estamos projetando o segundo bilhão para 2020. E depois o terceiro, o quarto…
Além das metas monetárias, quais são os outros objetivos ?
Temos um pipeline bem agressivo, que está no nosso DNA. A marca sempre procura olhar cinco anos para a frente. Claro que isso é revisado, mas hoje, por exemplo, nossa meta é aumentar em 30% o portfólio.
O setor farmacêutico brasileiro é altamente competitivo. Que espaço a Cimed ocupa nesse cenário?
A Cimed é atualmente a quarta maior farmacêutica do Brasil em unidades vendidas e está entre as 10 maiores em faturamento. A gente cresce a um ritmo três vezes maior do que o mercado. De acordo com nossos estudos, devemos ficar entre as cinco primeiras em faturamento em meados de 2021 ou 2022. Nosso objetivo é estar entre as cinco maiores em faturamento e ser talvez a segunda em unidades vendidas.
Como será possível alcançar a meta de faturamento de R$ 2 bilhões em 2020?
Temos de pensar que a população do país ainda é muito pobre. Então, um dos grandes fatores que geraram esse crescimento nos cinco anos anteriores foi a participação dos genéricos dentro do setor. O genérico no mundo inteiro chega a representar 55% das vendas. No Brasil, ele representa 30% no máximo, dependendo da categoria. Então, a gente acredita que, com o esclarecimento da população e também com o seu envelhecimento, a tendência é que os remédios de uso contínuo tenham crescimento de vendas muito expressivo.
Quais foram os fatores decisivos para que a empresa deslanchasse nos últimos anos?
O maior diferencial do grupo é a cadeia de verticalização. Começamos o projeto em 1988 e, hoje, temos um modelo único na indústria farmacêutica brasileira.
Como isso funciona?
Temos a fábrica de embalagens, a indústria farmacêutica e a distribuição. Com isso, nosso acesso é muito mais rápido aos pontos de vendas e conseguimos entender melhor a dinâmica do país, adaptando o portfólio para cada região.
Então, é correto presumir que o medicamento genérico tem espaço para avançar no mercado brasileiro?
Sim, principalmente, porque moramos em um país com 200 milhões de habitantes e que ainda oferece muitas oportunidades. Quando a retomada vier, essas oportunidades serão ainda mais visíveis.
Boa parte dos empreendedores reclama das dificuldades de fazer negócios no Brasil. Quais são os maiores obstáculos?
A logística, sem dúvida, é um problema. Você imagina como é chegar a uma farmácia no interior do Piauí tendo uma indústria dentro de São Paulo. Por isso, em meados dos anos 1990, iniciamos um processo que consistiu na criação de uma malha de distribuição para ter acesso mais rápido aos cantos mais distantes do país. E temos também a carga tributária, que é uma loucura e muda de estado para estado.
É possível liberar amarras enfrentadas pelo setor farmacêutico?
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), no Brasil, só perde em rigor para a Anvisa do Japão. É um órgão rigorosíssimo e mostra que quem está no país hoje é top. Não perde nada para nenhuma outra empresa do mundo. As indústrias farmacêuticas nacionais são de alto padrão de qualidade. Então é um mercado muito disputado, muito desenvolvido e de muito investimento. Só que é um setor que tem barreira. Não é fácil montar uma indústria farmacêutica. Há esse lado bom da qualidade, mas existe o lado complicado, que é a demora de você ter um produto, que hoje leva cinco anos para ser desenvolvido. Então, começo a desenvolver um produto hoje para poder colocá-lo no mercado daqui a cinco anos. É muito tempo.
Qual é a região que tem mais potencial de crescimento nos próximos anos?
Na Cimed, brincamos que dividimos o país em dois. De Minas Gerais para cima e de Minas Gerais para baixo. Onde temos mais potencial de crescimento é justamente de Minas para cima, que seriam o Norte e o Nordeste.
A Cimed é conhecida no mercado por ser uma empresa agressiva. Essa percepção corresponde à realidade?
Sempre imprimi na gestão um ritmo acelerado. A orientação na empresa sempre foi não se satisfazer com o crescimento do mercado. Então, nosso grupo tem muita energia. A gente brinca que comemora mais as derrotas do que as vitórias, porque as derrotas foram os planejamentos que deixaram de ser feitos. Esse é um estilo que está implantado há muito tempo e está enraizado em quem faz parte da companhia.
A Cimed faz investimento forte em marketing esportivo, incluindo patrocínio da Seleção Brasileira de futebol. Há um fator específico para essas ações?
A gente fala que esporte é saúde. Então, há 20 anos investimos nessa plataforma. Desde times de futebol até corrida de rua. E a maior conquista realmente foi patrocinar a Seleção Brasileira. É uma coisa muito legal, porque trava a categoria.
Como assim?
O nosso concorrente não vai patrocinar a Argentina. Se é um time, você tem várias opções, mas a Seleção é um produto único.
Mas por que investir em esporte? Qual o retorno para a marca?
A gente fala que o esporte é frequência e sequência. A gente não tem um projeto de esporte dentro da companhia que dure menos que quatro anos. Para nós, o esporte não é uma plataforma de oportunidade de momento. A gente enxerga o esporte como algo para longo prazo, porque ele vive de vitórias e derrotas. Então, se você ficar muito tempo patrocinando alguém, sua marca vai inevitavelmente ficar conhecida.
Fonte: Correio Braziliense
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