Um dos principais medicamentos usados atualmente no tratamento contra a hepatite C, o daclatasvir pode ser barateado. Nesta terça-feira, um grupo de trabalho, formado por pacientes, ONGs e especialistas que defendem a ampliação do acesso ao tratamento, apresentou um pedido para anular a patente do remédio, atualmente vendido com exclusividade pela farmacêutica Bristol-Myers Squibb (BMS) sob o nome comercial de Daklinza.
Com a possibilidade de entrada de versões genéricas do daclatastavir no mercado, a expectativa agora é que o preço caia. Na última compra feita pelo Ministério da Saúde, que fornece o tratamento pelo SUS, o preço pago por cada ciclo completo usando o daclatasvir foi de US$ 1.730 (ou R$ 6.674). No Egito, onde existem versões genéricas, o mesmo tratamento custa US$ 22,50 (ou R$ 86,80). Nos Estados Unidos, onde vigoram patentes para cada componente das diferentes combinações de tratamento, a cura chega a custar US$ 80 mil (ou R$ 308 mil), em média.
Mesmo em países onde não há genéricos, a BMS cobra preços muito inferiores, como em Myanmar, onde o tratamento completo custa US$ 354 (R$ 1.366). Aqui no Brasil, a empresa chegou a oferecer um desconto significativo em julho de 2018, baixando o preço do tratamento para US$ 630, mas, depois de concedida a patente, voltou atrás na cobrança de US$ 1.730, em novembro do mesmo ano.
Patente é ‘inconclusiva’, afirmam críticos
Em outubro de 2018, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) concedeu a patente do daclatasvir à empresa americana, o que impediu a entrada de versões genéricas e mais baratas no mercado brasileiro. Os pedidos de quebra de patente podem ser realizados no prazo de seis meses após a concessão. Cabe agora ao INPI avaliar e decidir se acata ou não o pedido.
O principal argumento apresentado pelo grupo de trabalho nesta terça-feira é que a patente não tem o nível de detalhamento necessário, o que seria fundamental para justificar sua concessão.
— A patente é ampla e vaga demais, e seu objeto não está suficientemente descrito. Ou seja, na prática não sabemos exatamente o que está sendo retirado do domínio público — afirma Carolinne Scope, farmacêutica e consultora do grupo.
Preço alto fez SUS buscar novas opções
O tratamento da hepatite C é feito a partir da combinação de fármacos, que são tomados uma vez ao dia durante um período que pode variar de três a seis meses, dependendo do paciente. Recentemente usado no tratamento de pacientes em geral, mas sobretudo indicado para pacientes adultos que também são portadores do vírus HIV, o daclatasvir é utilizado em combinação com o sofosburir, também protagonista de outra guerra de patentes (leia mais abaixo).
Essa dupla de remédios foi usada exclusivamente pelo SUS de 2015 até 2017, mas, com a alta do preço praticado pela BMS em novembro de 2018, o governo brasileiro optou por outra combinação, mais barata, a de sofosbuvir com velpatasvir.
Procurada para comentar o processo de quebra da patente, a farmacêutica Bristol-Myers Squibb (BMS) ainda não respondeu.
Guerra de patentes atinge outro remédio
Atualmente, os cerca de 15 mil pacientes que estão recebendo tratamentos baseados em combinações que levam o componente sofosbuvir, comprados pelo SUS em caráter emergencial no ano passado, enfrentam dificuldades com a distribuição. Isso porque a entrega do produto em quatro remessas foi interditada por uma semana devido a uma disputa judicial em torno de sua patente.
O pregão reaberto em novembro, após ter sido feito no meio do mesmo ano, deu a vitória à versão genérica do componente sofosbuvir. A distribuição poderia ser imediata, mas a Gilead, farmacêutica que reclama a patente do sofosbuvir no Brasil, entrou com uma liminar na 14ª para impedir que os 12 caminhões saíssem do almoxarifado do Ministério da Saúde.
Em janeiro deste ano, a Advocacia-Geral da União (AGU) conseguiu na Justiça derrubar a liminar que impedia a entrega do medicamento, alegando que o atraso na entrega poderia levar à perda da validade da droga.
A meta da Organização Mundial da Saúde (OMS) é eliminar a hepatite C até 2030, reduzindo em 80% a incidência e em 65% as mortes decorrentes da doença frente aos níveis registrados em 2015. No entanto, a doença ainda é uma das maiores ameaças à saúde pública do planeta.
Fonte: O Globo
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