Empresas brasileiras nascidas na internet começam a controlar a cadeia produtiva da fabricação à venda, sem passar por intermediários, como lojas de terceiros.
Esse modelo de negócio, com forte presença digital, pelo site e redes sociais, também possibilita o controle da experiência que o cliente terá antes, durante e depois da compra. Ele é conhecido como DNVB, sigla que em inglês significa “marcas verticais e nativas digitais”.
O nome apareceu pela primeira vez em 2016, quando o americano Andy Dunn, criador da marca de roupas Bonobos, explicou numa rede social o seu modelo de negócio.
Ao adotar essa estratégia, empresas aumentam sua margem de lucro, já que não precisam gastar com comissões para vendedores, aluguel de lojas e estoques volumosos.
Outra vantagem é a possibilidade de aproximar os clientes da marca. Ao interagir diretamente com eles pela internet, as companhias aumentam as chances de fidelização.
“O maior diferencial desse modelo é ter uma marca forte, com senso de propósito, algo com o qual as novas gerações se preocupam”, diz Guilherme Sanchez, analista de negócios do Sebrae.
Seis meses antes de lançar seu primeiro produto, a marca de cosméticos Sallve já comunicava seu propósito aos clientes. Começou a fazer posts no Instagram em janeiro deste ano, com fotos que mostravam modelos de diversas etnias e biotipos, gerando seguidores e expectativa.
Já a Zissou, empresa que vende apenas um tipo de colchão e um de travesseiro, se apresenta para os clientes como uma marca que quer “redefinir a relação das pessoas com o sono“, e não como uma fabricante de colchões.
“Quando existe essa congruência de valores entre o consumidor e o negócio, ele se torna um embaixador da marca”, diz Sanchez.
Além de gerar propaganda espontânea para a empresa, clientes fiéis também costumam comprar o produto mais de uma vez. “Vender para um cliente antigo é de cinco a seis vezes mais barato do que para um novo consumidor, porque você tira o custo com marketing”, afirma o analista do Sebrae.
Esse valor economizado pelas DNVBs pode ainda ser repassado ao consumidor para diminuir o preço de venda e ganhar competitividade ou novos mercados.
Fundada há um ano e meio, a Yuool, que fabrica tênis com lã do tipo merino, encontrou no modelo DNVB uma forma de reduzir pela metade o preço do seu produto. De acordo com Eduardo Glitz,sócio da empresa, cada sapato custaria R$ 700 em um esquema tradicional de venda no varejo.
“Tiramos o custo do aluguel da loja, da comissão do vendedor, do estoque que fica parado e o produto agora é vendido por R$ 349”, diz Glitz. Os sapatos são comercializados no site da Yuool e entregues pelo correio.
Eles planejavam vender 1.900 tênis em 2018, mas acabaram por comercializar 7.400. Para este ano, a meta é chegar a 30 mil pares.
A marca só tem um modelo de sapato, em nove cores, que serve para homens e mulheres. O tipo único de calçado ajuda a diminuir o tamanho do estoque e os custos de produção.
Para ser bem-sucedido com poucos produtos, porém, é preciso criar algo assertivo, que seja objeto de desejo e represente a ideia que a marca deseja passar.
Como a Yuool, a Sallve comercializa um único item até o momento: um hidratante com função antioxidante.
“Não fabricamos os produtos aleatoriamente, queremos entender do que as pessoas sentem falta, até para ter uma entrada mais fácil no mercado”, afirma Julia Petit, sócia da empresa.
O desenvolvimento do hidratante foi trabalhoso. Ela e seus três sócios pesquisaram o mercado e fizeram reuniões com potenciais consumidores para entender quais produtos essas pessoas queriam e de que forma gostariam que eles chegassem até elas.
Lançar a Sallve com apenas um item só foi possível por causa da venda direta, pelo site. “É difícil conseguir um espaço em gôndola de farmácia ou perfumaria sem ter um portfólio. A internet permite ouvir o consumidor, desenvolver um produto, pegar os feedbacks e depois apresentar outros itens”, diz Daniel Wjuniski, cofundador da marca.
Ser uma empresa nativa digital não impede, porém, que ela também atue offline. Estar presente em pontos físicos ajuda a dar uma experiência mais completa ao cliente.
A Zissou, que nasceu vendendo pela internet, sentia que seus consumidores gostariam de experimentar o colchão antes de comprá-lo. Além de dar a possibilidade de trocar o produto com até cem dias de uso, eles abriram uma loja própria em São Paulo, a Casa Zissou, e criaram espaços da marca dentro da varejista de decoração Breton.
“Temos alguns pré-requisitos para vender em varejos”, diz Amit Eisler, sócio da companhia. “O principal é o controle da experiência, para que o consumidor entenda a marca e o produto”, afirma. O colchão também não pode custar mais do que no site da empresa.
Outro caminho foi adotado pela Livo, marca de óculos que nasceu em 2012 com venda exclusiva pela internet. Depois de lançar lojas próprias, o dono da marca, Arthur Blaj, partiu para o modelo de franquias, iniciado em 2018.
Atualmente, são seis franqueados, que o empresário diz não considerar como intermediários nas vendas.
“Eles não mudam o preço do óculos, e a experiência de compra é mantida”, afirma.
Blaj vai lançar em outubro uma nova DNVB, a Além, de acessórios para viagem. Os produtos serão vendidos no site da marca e em loja própria.
A escolha do segmento não foi por acaso. “Você precisa conquistar o público e criar uma comunidade, e o setor de cuidados pessoais e de viagem são os mais populares na internet hoje.”
Fonte: Folha de S. Paulo Online
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