UOL
Colunista: Paola Machado*
A dor crônica é a principal queixa das consultas médicas e uma das condições que mais afastam as pessoas de qualidade de vida. Apesar de ser altamente prevalente na população ainda há muita dificuldade em tratar adequadamente esse quadro. O maior impacto de uma dor não tratada é levar a prejuízos físicos, mentais e sociais.
Por isso, a importância de compreendermos as bases neurofisiológicas e psicobiológicas da dor crônica como um ponto essencial para avaliação e tratamento adequado da dor.
Entenda como sentimos a dor
1 - Percepção da dor
Quando nos lesionamos, no local ocorre a liberação de mediadores químicos detectados pelas terminações nervosas que levam a informação à medula e ao cérebro. No cérebro, a informação é localizada e interpretada como dor.
2 - Inibição da dor
Como forma de controlar a dor, há a liberação de substâncias chamadas endorfinas (semelhantes a morfina) e encefalinas que inibem a propagação da informação de dor.
3 - O problema na dor crônica
O circuito do sistema nervoso envolvido na dor crônica é muito diferente da dor aguda. Na dor crônica ocorre algum problema do sistema responsável pela percepção (1) ou inibição da dor (2).
Quando os sinais de dor ocorrem repetidamente, há alterações eletroquímicas que nos tornam mais sensíveis aos estímulos e cada vez mais resistentes aos mecanismos de controle da dor. Estudos recentes têm demonstrado que essa "memória dolorosa" está ligada a mediadores químicos muito parecidos aos envolvidos no processo de memorização.
Em estudo científico desenvolvido em um centro de referência mundial de dor crônica foi demonstrado que mudanças ocorrem no cérebro de quem tem dor crônica. As pesquisas apontam evidências de que pessoas com dor crônica apresentam processamento cerebral anormal da informação corporal e que estados emocionais negativos podem alterar o funcionamento do cérebro e amplificar o sofrimento associado à dor. No entanto, os mecanismos cerebrais envolvidos nos processos regulatórios ainda não foram elucidados.
Sequelas da dor
A dor crônica causa isolamento social, aumento de despesas na tentativa de melhorar a dor, traz sofrimento na dimensão física mas também emocional pela dor não tratada. Pode levar à depressão, deficiências psicomotoras e sensações de perda que muitas vezes guardam pouca relação com o quadro doloroso.
Aproximadamente 50% a 70% de pessoas com dor crônica podem desenvolver a cinesiofobia (medo excessivo de realizar qualquer movimento). Esse quadro pode levar a pessoa a acreditar que algumas atividades e movimentos provocam dor, gerando medo e constante tensão e ansiedade. Geralmente a cinesiofobia vem acompanhada do efeito nocebo, que é o ato de gerar uma expectativa negativa de que algo a fará piorar levando à catastrofização da dor. O efeito nocebo leva a interpretações erradas das sensações que o corpo recebe e pode levar a um ciclo vicioso de dor, medo da dor e do movimento.
Acreditar que a Dor Crônica é estática é um erro já que ao longo do tempo quem tem de dor crônica tem altas chances de flutuar entre momentos de ter quadros de dor leve e moderada. Assim, os estudos não garantem que se deva esperar que a dor crônica zere para sempre. Isso pode direcionar tanto os profissionais de saúde quanto os pacientes a estabelecer expectativas e metas reais em relação ao tratamento. Por isso, quem tem dor crônica deve focar em um acompanhamento constante.
Mas tratamento existe?
O manejo com abordagem multidisciplinar através de tratamento medicamentoso, psicológico e fisioterapêutico pode ajudar as pessoas a terem mais qualidade de vida. A compreensão da dor tanto por profissionais de saúde quanto por quem sofre de dor crônica é a maior chave para buscar o tratamento adequado.
O aprimoramento de habilidades de regulação emocional através da reavaliação cognitiva, como usado na terapia cognitivo-comportamental ou na atenção plena, pode regular e estabilizar as emoções na dor crônica. Na fisioterapia, além de recursos que modulam ou controlam a dor, a cinesioterapia proporciona benefícios físicos e auxilia e muito a questão do bem-estar, melhorando a percepção corporal e a relação com a doença.
(*) Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas.
Comentários