Os dois primeiros Estados a legalizar a maconha para uso recreativo nos EUA começam a lidar com o crescente consumo de uma erva extremamente potente, enquanto a indústria colhe grandes lucros tributários com suas vendas.
Embora a idade legal para compra seja de 21 anos, no Colorado e em Washington, pais, educadores e médicos dizem que jovens são facilmente apanhados com alimentos que levam THC, componente psicoativo que faz a pessoa se sentir chapada, e concentrados tais como o “shatter”, substância transparente que é aquecida e depois inalada com um dispositivo especial.
Com alguns produtos de maconha com uma média de 68% de THC, aumentaram os casos de jovens levados a centros de controle e prontos-socorros. Em Denver, no Hospital Infantil do Colorado, internações para tratamento de vômitos cíclicos, paranoia, psicose e outros sintomas agudos relacionados à cannabis saltaram de 161, em 2005, para 777, em 2015.
O aumento foi mais notável nos anos seguintes à legalização de uso medicinal, em 2009, e para uso no varejo, em 2014, de acordo com estudo publicado no Journal of Adolescent Health, em 2018. “Vejo aumento de problemas como psicose, dependência, suicídio, depressão e ansiedade”, disse a psiquiatra Libby Stuyt, que trata de adolescentes no Colorado e estudou os impactos da maconha de alta potência sobre a saúde.
“O cérebro é vulnerável durante a adolescência”, disse Staci Gruber, professora de psiquiatria da Harvard Medical School, que estuda como a maconha afeta o cérebro. “A política parece ter ultrapassado a ciência e, no melhor de todos os mundos, seria a ciência que nos permitiria definir políticas.”
Regras.
Os críticos também pedem mais regulamentação da indústria. Projetos de lei aprovados recentemente buscam expandir ou desregulamentar o setor. Legisladores de Washington amenizaram as consequências das violações administrativas, permitindo advertências por escrito, em vez de multas.
No Colorado, eles aprovaram investimentos mais amplos em negócios de maconha e entrega em domicílio para usuários com fins medicinais e permitiram que consumidores usem a droga em enfermarias licenciadas, restaurantes e teatros.
Alguns médicos comparam as ações dos Estados a um experimento de saúde pública, que apoia os interesses da indústria de cannabis, ignorando as implicações para a saúde dos adolescentes. “Espero que não venhamos a perder uma geração antes de ficar claro que precisamos proteger os cérebros dos nossos filhos”, disse Leslie Walker-Harding, especialista em medicina para adolescentes que preside o Departamento de Pediatria do Hospital Infantil de Seattle.
A indústria discorda que produtos potentes sejam um perigo, argumentando que estudos adicionais são necessários. Os dados existentes são “inconclusivos para determinar se as mudanças associadas ao uso precoce de maconha são prejudiciais no longo prazo”, disse Morgan Fox, diretor da National Cannabis Industry Association.
O que não está sendo colocado em dúvida é o quanto está em jogo financeiramente. Dez Estados e a capital, Washington, permitem o uso recreativo de maconha e 34, para fins medicinais. O mercado do Estado de Washington registrou um recorde de US$ 978 milhões em vendas no varejo no ano passado, o que significou US$ 358 milhões em impostos para os cofres públicos. A indústria de maconha do Colorado acumulou vendas ainda maiores: US$ 1,54 bilhão, arrecadando US$ 266 milhões em impostos, licenças e taxas.
Deputado estadual do Colorado, Jonathan Singer espera que a nova lei de entrega ajude a impedir que os adolescentes comprem maconha online e por outros meios simplificados. “Estamos erradicando um mercado negro, sem nos importarmos se estamos vendendo para crianças”, disse ele.
Matt Jenkins, que coordena programas de educação especial em um distrito escolar no Colorado, se mobilizou depois de ver os estudantes “entrando na estratosfera, ficando muito altos”. Ele obteve uma doação de US$ 750 mil, financiada por receita tributária estadual de maconha, para contratar dois assistentes sociais e uma enfermeira para ajudar com “a caixa de Pandora que abrimos”.
Jenkins ironiza que o distrito está “usando dinheiro de maconha para dizer às crianças que não usem maconha” – e para prevenir ou reduzir o abuso de substâncias. / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO
Fonte: O Estado de S. Paulo
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