Mifepristona foi aprovada para uso nos Estados Unidos em 2000 - Icy Macload/Getty Images
Estados buscam impedir uso do remédio em meio a esforço para restringir prática após decisão da Suprema Corte
Lawrence Hurley da Reuters
O governo do presidente Joe Biden indicou que tentará impedir que os estados proíbam uma pílula usada para aborto medicamentoso após a decisão da Suprema Corte que anulou o resultado do julgamento Roe vs Wade, sinalizando uma nova e importante luta legal.
O governo poderia argumentar no tribunal que a aprovação de uma das pílulas usadas para abortos medicamentosos, o mifepristona, pela Food and Drug Administration (FDA), uma agência reguladora dos Estados Unidos, antecipa as restrições estaduais, o que significa que a autoridade federal supera qualquer ação estadual.
Esse mesmo argumento já foi levantado pela GenBioPro, com sede em Las Vegas, que vende uma versão genérica da pílula, em um processo que contesta as restrições do estado do Mississippi ao aborto medicamentoso.
Mais de uma dúzia de estados planejam banir quase totalmente o aborto depois que o precedente de Roe vs Wade foi derrubado. A Suprema Corte, atualmente com uma maioria conservadora, derrubou a decisão por 5 votos a 4 na sexta-feira (24), dizendo que não há direito ao aborto na Constituição dos Estados Unidos.
Os estados provavelmente enfrentarão outras dificuldades para impor restrições ao aborto medicamentoso, já que as mulheres ainda podem obter as pílulas pela internet ou em outros estados.
Biden disse em comentários após a decisão da Suprema Corte que o governo buscaria proteger o acesso ao aborto medicamentoso, afirmando que os esforços para restringi-lo seriam “errados, extremos e fora de com a maioria dos americanos”.
O procurador-geral, Merrick Garland, foi mais explícito sobre o que o Departamento de Justiça está de olho, dizendo em um comunicado que “os estados não podem proibir a mifepristona com base em desacordo com o julgamento de especialistas do FDA sobre sua segurança e eficácia”.
A mifepristona foi aprovada para uso em abortos pela FDA em 2000, muito depois de Roe ter sido decidida em 1973. A pílula, também conhecida como RU 486, bloqueia o hormônio progesterona, enquanto a outra droga usada, o misoprostol, induz contrações uterinas.
Greer Donley, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Pittsburgh, especialista em direitos reprodutivos, disse que a posição do governo “mostra que eles entendem o que está em jogo e estão dispostos a buscar novas ideias”.
Mesmo antes de Roe ser derrubada, os estados impuseram restrições ao acesso à pílula. Há 19 estados que exigem que as mulheres façam uma visita pessoal para obter o medicamento, segundo o Instituto Guttmacher, grupo de pesquisa que apoia o direito ao aborto.
Já a FDA não exige uma reunião presencial.
Especialistas jurídicos dizem que a lei sobre preempção é obscura porque o Congresso nunca disse explicitamente que a aprovação da FDA supera a lei estadual, como tem feito no contexto de dispositivos médicos. Portanto, caberia aos tribunais decidir a questão sob uma teoria conhecida como “preempção implícita”.
A ampla disponibilidade de aborto medicamentoso em estados que desejam restringir ou proibir o procedimento seria um grande revés para os ativistas antiaborto, que há muito procuram proibir a prática de forma definitiva.
As tentativas de desafiar as restrições estaduais podem encalhar na Suprema Corte, não apenas porque a maioria conservadora de 6 a 3 mostrou sua oposição ao direito ao aborto mas também porque os juízes muitas vezes são céticos em relação às reivindicações federais de preempção.
Com Roe derrubado, os estados também teriam mais margem de manobra para argumentar que têm um interesse separado na prevenção de abortos com base em objeções morais ao aborto.
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