Grandes empresas têm recursos para crise

Valor Econômico
Jornalista: Fernando Torres


27/03/2020 - A grande maioria das empresas da bolsa brasileira tem dinheiro em caixa para cobrir mais de um ano de pagamento da folha de salários de seus funcionários, segundo levantamento do Valor Data com base em dados de balanços. Ou seja, mesmo que parassem de vender e receber pelas vendas por causa da quarentena a que muitas estão sujeitas por causa da pandemia do novo coronavírus, 85% delas conseguiriam honrar seus compromissos trabalhistas por 12 meses com o dinheiro que possuem no banco. Metade dos 15% restantes conseguiria cobrir ao menos seis meses de salários e, por coincidência ou não, as demais são majoritariamente de setores que devem sofrer menos com a crise, como serviços públicos, farmácias e produção de alimentos.

Os dados se referem a 97 empresas não financeiras que fazem parte do Ibovespa e do Small Caps que já divulgaram seus balanços de 2019. Se a amostra for de 67 empresas que integram Ibr-X, o resultado é parecido: 84% conseguem cobrir 12 meses de folha de pagamento. A lista não inclui instituições financeiras pela contabilidade diferente, mas é certo que os grandes bancos do país, que empregam centenas de milhares de brasileiros, também têm folga financeira para pagar salários por muito tempo.

Obviamente, num cenário normal, essa medida - que relaciona dinheiro em caixa com despesa de pessoal - não faz muito sentido. Isso porque, junto com os salários, as companhias têm outras inúmeras obrigações a pagar, como compra de insumos, prestação de serviços, aluguéis, tributos, empréstimos, contas de luz, água etc.

Ainda pensando num cenário normal, num caso de queda drástica de demanda, como se vê atualmente, as medidas prescritas nos livros de administração mirariam a redução rápida de custos fixos, o que certamente inclui a demissão imediata de funcionários não essenciais para o período de vacas magras - mesmo que haja caixa para manter o pagamento de seus salários.

Porém, a situação atual não tem nada de normal. Não está prevista nos livros. Para atrasar o ciclo de contágio do novo coronavírus, milhões de pessoas em todo o mundo, e também no Brasil, estão isoladas em casa, algo nunca antes observado na história - num esforço conjunto e solidário para reduzir o número de vítimas.

Esse cenário atípico, inclusive, já fez com que parte dos credores que teriam dinheiro a receber de empresas aceitasse ficar atrás dos trabalhadores na fila dos pagamentos. De forma análoga ao que acontece numa recuperação judicial, mas de maneira voluntária e negociada. O governo federal, por exemplo, adiou o calendário de cobrança de alguns tributos (e poderia estender a medida). Já os bancos têm informado que darão carência de 60 dias para pagamentos de juros e empréstimos (esperamos que seja verdade). Um terceiro exemplo vem dos shoppings, que estão desobrigando as lojas de pagamento de aluguel no meio da crise.

O caso de pagamento a fornecedores, junto com o pagamento de pessoal, é o mais complicado. Até porque muitos deles são pequenas empresas que não têm folga de caixa como suas contratantes. Para as grandes companhias que se vejam na situação de ter que fazer escolhas, uma saída é procurar priorizar os fornecedores menores. A Vale, por exemplo, anunciou que decidiu antecipar o pagamento de R$ 160 milhões a parte de seus fornecedores. A prática poderia ser seguida por outras companhias com situação financeira robusta.

O dinheiro não fará falta para a Vale. Nesta semana, a mineradora disse que decidiu recorrer a uma linha de crédito emergencial de US$ 5 bilhões (ou mais de R$ 25 bilhões) que tinha disponível com grandes bancos, cifra que se soma aos R$ 33 bilhões que ela tinha em caixa em dezembro. A Petrobras fez o mesmo, e engordou o caixa com US$ 8 bilhões e depois mais R$ 3,5 bilhões (num total aproximado de quase R$ 50 bilhões). Em dezembro, a estatal tinha R$ 33,3 bilhões em caixa e aplicações.

Pequenas empresas não contam com esse tipo de limite de crédito pré-aprovado. E nem com essa pilha de dinheiro no banco. São elas que precisam ser ajudadas o quanto antes pelo governo federal, que deveria colocar a impressora de dinheiro para funcionar o quanto antes, para cobrir ao menos parte do pagamento da folha de salários de milhões de brasileiros.

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