Já graduados e até irmãos migram em busca do diploma

O Estado de S.Paulo
por Fabiana Cambricoli

29/09/19 - Se nas faculdades brasileiras o perfil predominante de alunos de Medicina é de jovens recém-saídos da adolescência e de classe alta, nas escolas médicas do Paraguai o grupo é mais diverso. Embora os jovens também sejam maioria por lá, há muitos casos de pessoas mais velhas, já formadas em outra área, que abandonaram emprego e casa no Brasil para cursar Medicina no exterior. A maioria toma a decisão depois de algum conhecido se aventurar e conseguir o diploma.

“Inicialmente meus pais me pediram para vir com meu irmão porque ele era muito jovem e achávamos que a região era perigosa. Então pensei que, já que eu ia morar aqui, poderia fazer Medicina também”, conta Luciana Mourão, de 36 anos. Formada em Economia e Design de Interiores, ela tinha uma franquia em Rondonópolis (MT). Vendeu o negócio e viajou com o irmão Lucio, de 21. “Hoje peguei gosto pela profissão”, conta ela.

Como Luciana e Lucio, muitos dos estudantes no Paraguai são do Centro Oeste. Há também muitos nascidos no Norte. A justificativa se dá pelo acesso facilitado à região da fronteira e pelo baixo número de vagas de Medicina nessas regiões. Segundo o último Censo da Educação Superior, com dados de 2018, as universidades brasileiras ofereceram no ano passado 35,6 mil vagas para novos alunos de Medicina, mas o número de inscritos para vestibulares da carreira passou de 1 milhão, uma média de 28 candidatos por vaga.

Sonho

Marcos Cesar Ferreira dos Santos sempre teve o sonho de ser médico, mas, por causa das altas mensalidades e do vestibular concorrido, nunca pensou que poderia concretizá-lo. Depois de se casar e ter dois filhos, passou por uma situação que o fez reviver sua intenção: o sogro foi diagnosticado com câncer e ele foi um dos que acompanhou de perto a batalha contra a doença. “Eu o via daquele jeito e queria ajudar, mas não sabia o que fazer.”

O sogro não resistiu à doença e morreu em 2014. Logo em seguida, o filho mais velho de Marcos, Gustavo, de 21 anos, começava a pensar no vestibular. “Perguntei o que ele ia fazer da vida e ele não estava muito certo, então sugeri essa possibilidade de fazermos Medicina juntos”, conta Marcos. A família tinha um primo que já havia migrado para o Paraguai para fazer o curso, o que deu alguma segurança na decisão.

Em 2016, Marcos se mudou, com a família inteira, da cidade de Cacoal, em Rondônia, para Ponta Porã. Hoje, pai e filho estão na mesma sala, no 4.º ano. Sem poder trabalhar em horário comercial por causa do curso integral e com duas mensalidades para pagar, Marcos resolveu abrir um churrasquinho na garagem de casa em Ponta Porã. No pequeno negócio, trabalham a mulher, na preparação dos espetos; Marcos, na churrasqueira; e Gustavo, no atendimento. Até o caçula, de 14 anos, dá uma mão. “A gente recebe pedidos pelo WhatsApp também. Tem noite que atendemos até 80 pessoas”, comemora Marcos.

A clientela é como se fosse da família. Quando pai e filho estão em semana de provas, avisam os clientes que o serviço não vai funcionar. “Eles entendem porque sabem que, acima de tudo, somos estudantes”, diz Gustavo.

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