Falar sobre maconha ainda é um tabu no Brasil e em grande parte do mundo. Quando o assunto é canabidiol, porém, o tom é um pouco diferente. Embora ainda enfrente resistências, a substância, um dos princípios ativos da cannabis, têm sido amplamente estudada por seus potenciais usos medicinais. É principalmente neles que alguns empreendedores brasileiros têm apostado lá fora – e com expectativas de entrar no mercado daqui o mais breve possível.
O potencial e as estratégias do mercado da cannabis foram tema de um bate-papo no evento LATAM Retail Show, realizado em São Paulo (SP) entre os dias 27 e 29 de agosto. A conversa foi mediada pela jornalista Valéria França e abordou exemplos internacionais e possíveis estratégias para estimular a liberação da substância no Brasil. Os mercados potenciais, aliás, não se limitam às indústrias farmacêuticas e de cosméticos.
Caminho mais curto
Para José Bacelar, presidente da VerdeMed, “descolar” o canabidiol (ou CBD) do que se conhece como maconha pode ser um passo efetivo para tornar a discussão mais favorável. Nos EUA, explica ele, um caminho encontrado pela agência de regulação federal foi retirar apenas ele da lista de substâncias proibidas.
A partir da medida, o Congresso pôde propor um tratado que autoriza o cultivo do cânhamo, uma variação da cannabis que possui CBD, mas que apresenta baixos níveis de THC (responsável pelos efeitos psicotrópicos). “A separação entre o uso medicinal e o recreativo é um dos grandes desafios para desmistificar a planta. Não precisamos discutir sobre maconha agora para encontrar um caminho que avance”, diz ele.
Bacelar foi um dos brasileiros que apostou no patamar mais avançado de outros países para explorar o mercado. A VerdeMed, empresa comandada por ele, tem sede no Canadá e trabalha no desenvolvimento de dois medicamentos à base de CBD. Enquanto o mercado brasileiro não se abre, uma unidade de negócios baseada no EUA pretende exportar os remédios para pacientes brasileiros com indicação médica – o modelo permitido hoje.
Confiabilidade
Já a aposta da cientista e empreendedora Gabriela Cezar, CEO da Panarea Partner Inc., foi no Uruguai. A empresa comandada por ela mantém uma planta de 2,7 mil metros quadrados e trabalha na construção de outra, de 19 mil, com laboratórios. A proposta é englobar toda a cadeia, das pesquisas à exportação, atendendo inclusive outras empresas interessadas no nicho.
Lado a lado com o Canadá no quesito liberação, o Uruguai, segundo ela, leva outra vantagem: uma política de zona franca que zera o imposto para equipamentos. Em relação ao Brasil, a proximidade e a ligação ao Mercosul também seriam vantagens.
Para ela, o grande desafio dessa indústria tem a ver com o controle de qualidade. Para trabalhar com o uso da cannabis em medicamentos e até em cosméticos, as empresas precisam desenvolver pesquisas profundas e rigorosos testes de qualidade. “Existe uma variabilidade entre as plantas. É preciso conhecer desde a concentração das moléculas até sua caracterização genética.”
A executiva relembra uma consulta pública realizada recentemente pela Anvisa para avaliar a possibilidade de permitir o cultivo da planta no Brasil. Os resultados estão previstos para ser publicados em novembro. Segundo ela, a liberação estimularia um mercado com muito potencial.
Um mercado bilionário
André Steiner, fundador e CEO da White Cloud Mountain Quantum Cannabis Jamaica, tem uma visão semelhante. Com sede no país do Caribe, a empresa mantém uma parceria com uma empresa americana para basear a aplicação de canabinoides ao perfil genético de cada pessoa. O negócio, por outro lado, mantém uma visão menos conservadora em relação aos efeitos de substâncias como o THC.
“Em 2025, a previsão é que o mercado da cannabis chegue a 200 bilhões de dólares em vendas. Eu acredito que será ainda mais, pois, além da medicina, ela invadiu mercados como os de cosméticos, bebidas e alimentos”, diz ele.
As possibilidades, segundo Vinnicius Vieira, sócio da Hiria, vão ainda mais longe. Segundo ele, o potencial do mercado têm estimulado até nichos como o das fintechs. “Como algumas instituições não podem investir nessas iniciativas por questões como compliance, essas startups têm buscado entender como podem suportar iniciativas que envolvem o CBD”, diz ele.
Os mercados de construção e vestuário são outros nichos pouco óbvio. Nesses caso, a planta pode ter sua fibra utilizada no lugar de materiais tradicionalmente adotados. “Se o Brasil tivesse a mesma regulação que países que já permitem a exportação, a projeção é de que teríamos um mercado possível de R$ 45 bilhões”.
Fonte: Pequenas Empresas e Grandes Negócios
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