Valor Econômico
Jornalista: Marta Watanabe
03/04/2020 - O pacote de medidas trabalhistas para proteção de empregos durante a crise provocada pela pandemia deve dar alívio para as empresas no curto prazo. Entre analistas e entidades que representam trabalhadores, porém, o benefício emergencial que o governo deve pagar gera preocupação em relação à sua operacionalização e também em sua capacidade de recompor valores para empregados que terão seus salários reduzidos ou os contratos de trabalho suspensos.
O pacote estipula três percentuais principais (25%, 50% e 70%) de redução de jornada de trabalho com corte proporcional de salário para os quais o governo entra com o pagamento de benefício emergencial aos trabalhadores, como forma de recompor parte da renda perdida pelo empregado.
O governo deverá pagar o benefício emergencial que será calculado sobre o seguro desemprego conforme a redução de jornada de trabalho. Se a redução for de 25%, o benefício será de 25% do valor do seguro-desemprego ao qual o trabalhador faria jus. O trabalhador também está sujeito à suspensão do contrato de trabalho. Nesse caso, o benefício emergencial a ser pago pelo governo será de 100% do seguro desemprego. O valor do seguro hoje varia de um salário mínimo a R$ 1,8 mil.
No Twitter, o economista Gabriel Ulyssea, professor associado da Universidade de Oxford, criticou o fato de o pacote prever o pagamento do benefício emergencial com base no seguro-desemprego, e não no salário do trabalhador. Em um gráfico, ele mostrou que alguém que ganha quatro salários mínimos, por exemplo, terá cerca 75% de reposição no caso de ter redução de 50% na jornada de trabalho. Para suspensão de contrato, segundo o gráfico, a reposição ficará abaixo de 50%.
Para o advogado Eduardo Fleury, sócio do FCR Law, o pacote é bem-vindo e deve garantir renda razoável, embora com perdas, para boa parte do contingente com carteira assinada. Ele se refere principalmente aos que ganham até três salários mínimos e que estarão sujeitos à redução de jornada com corte proporcional de rendimento. Fleury explica que os acordos para os que ganham até três salários mínimos poderão ser individuais.
Já para os que ganham acima desde três salários mínimos até R$ 12.202,12 mensais (valor que é o dobro o teto dos benefícios previdenciários do INSS), salienta ele, só é possível o acordo individual para redução de jornada de 25%. Para as reduções maiores, de 50% ou 70%, explica, é necessário o estabelecimento de acordo coletivo. Isso seria uma forma de proteger trabalhadores dessa faixa de salários contra eventuais reduções de renda maiores, avalia. Os que ganham acima de R$ 12.202,12, considerados hipersuficientes desde a reforma trabalhista, não necessitam de acordo coletivo.
Para o advogado Luís Rogério Farinelli, as medidas são bem-vindas principalmente para o micro e pequeno empresário que não têm ativos em reserva e costuma ter fluxo de caixa limitado. A preocupação dele é de que isso seja operacionalizado rapidamente pelo governo para que o trabalhador receba esse benefício emergencial o quanto antes. A MP, explica, diz que o empregador precisa comunicar a redução de jornada com dois dias antecedência. Para a empresa comunicar ao Ministério da Economia, são dez dias. E o governo tem 30 dias para pagar o benefício ao trabalhador.
Clemente Ganz Lucio, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), diz que as medidas do pacote podem colocar os trabalhadores em situação difícil tanto nas negociações individuais quanto em relação à recomposição dos salários.
Em nota divulgada ontem, as centrais sindicais - CUT, Força Sindical, UGT, CTB, Nova Central e CSB - divulgaram que vão levar propostas de alteração à MP 936/2020, que traz as regras do novo pacote trabalhista. As centrais querem que os sindicatos sejam incluídos em todas negociações que ocorrerem durante a vigência do estado de calamidade pública devido à covid-19. Elas pleiteiam também manutenção de 100 % dos valores dos salários, de forma a garantir o poder de compra e fomentar uma retomada econômica. Pedem adicionalmente a estabilidade de 180 dias para todos os empregados, além de prorrogação do seguro-desemprego e isenção de tarifas para os trabalhadores mais afetados pela crise.
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