Folha de S.Paulo
Jornalista: Maria Fernanda Ziegler
Uma molécula com potencial para combater o câncer de ovário e bloquear o processo de metástase das células tumorais foi descrita por pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos na revista Cancer Research.
Conhecida como miR-450a, a pequena molécula de RNA geralmente é pouco expressa em tumores.
Porém, testes in vitro e em camundongos mostraram que, quando superexpressa, pode ter efeitos positivos no tratamento da doença ao silenciar a expressão de genes envolvidos na migração celular e no metabolismo energético do tumor.
O estudo foi realizado no Centro de Terapia Celular (CTC), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão financiado pela Fapesp na Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto.
Teve a colaboração de Markus Hafner, professor do Laboratory of Muscle Stem Cells and Gene Regulation, do National Institutes of Health (NIH), nos EUA.
“Trata-se de uma molécula promissora. Podemos desenvolver, no futuro, com uso de nanotecnologia, estratégias terapêuticas contra o câncer de ovário”, disse Wilson Araújo da Silva Junior, pesquisador do CTC e coordenador do estudo.
Por ser inicialmente assintomático, o câncer de ovário tende a ser detectado já em estágio avançado. Atualmente, a principal arma no tratamento é a cirurgia.
“A miR-450a, associada ou não à quimioterapia, pode contribuir como terapia neoadjuvante [tratamento pré-cirúrgico], aumentando taxas de resposta pré-operatórias. Já em casos mais avançados, é possível que diminua o risco de progressão ou de morte pela doença, com efeitos colaterais possivelmente menores que os da quimioterapia. Outro ponto interessante da molécula é a capacidade de bloquear o processo de metástase”, disse Silva Junior.
Os chamados microRNAs, como o miR450a, são pequenas moléculas de RNA que não codificam proteína, mas desempenham função regulatória no genoma e, por consequência, em diversos processos intracelulares.
A estratégia de atuação dessas moléculas consiste em se ligar ao RNA mensageiro expresso por um gene, impedindo sua tradução em proteína.
Os testes in vitro e in vivo realizados no Centro de Terapia Celular, parte do doutorado de Bruna Muys, bolsista da Fapesp, mostraram que, quando superexpresso, o miR-450a não só reduziu o tumor como também bloqueou o processo de metástase. No entanto, era preciso ainda identificar quais genes eram inibidos pela molécula.
“Depois da fase de caracterização, precisávamos descobrir quais genes de migração celular e invasão o miR-450a estava regulando. Com a tecnologia que o laboratório do NIH dispõe para a procura de alvos de RNA não codificadores, descobrimos que esse microRNA atua na redução de energia da célula, levando-a à morte”, disse Silva Junior.
A descoberta da molécula e de seu mecanismo surgiu como resultado do projeto de mestrado de Muys. O estudo, publicado na revista Plos One em 2016, mostrou que ocorre expressão elevada do miR-450a na placenta e baixa expressão em tumores. A conclusão foi que, na placenta, as moléculas regulariam mecanismos análogos aos do desenvolvimento do tumor.
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