Células seriam capazes de exercer funções do órgão, como produção de proteínas vitais, secreção e armazenamento de substâncias
GLAUCIA CHAVES
Metrópoles
Uma pesquisa feita no Centro de Pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela FAPESP na Universidade de São Paulo (USP), pode representar uma inovação no campo do transplante de órgãos. Os cientistas conseguiram produzir tecido hepático via impressão 3D em 90 dias. As células seriam capazes de reproduzir as funções típicas do órgão.
Para realizar o experimento, eles combinaram técnicas de bioengenharia, como reprogramação celular e produção de células-tronco pluripotentes, com a bioimpressão 3D. Com isso, o tecido produzido pela impressora manteve as funções hepáticas por um período mais longo do que o registrado em trabalhos anteriores de outros grupos.
Ernesto Goulart, pós-doutorando do Instituto de Biociências da USP e primeiro autor do artigo, publicado na revista Biofabrication, explicou à Fapesp que a inovação do estudo está na forma de incluir as células na biotinta usada para formar o tecido na impressora 3D. Segundo ele, em vez de imprimir células individualizadas, a equipe desenvolveu uma maneira de agrupá-las antes da impressão. “São esses ‘gruminhos’ de células, ou esferoides, que constituem o tecido e mantêm sua funcionalidade por muito mais tempo”, explicou o pesquisador.
O procedimento, segundo o cientista, evitou um problema comum à maioria das técnicas de bioimpressão de tecidos humanos: a perda paulatina do contato entre as células e, consequentemente, da funcionalidade do tecido.
O processo completo, desde a coleta do sangue do paciente até a obtenção do tecido funcional, demora aproximadamente 90 dias e pode ser dividido em três etapas: diferenciação, impressão e maturação.
Inicialmente, os pesquisadores reprogramam as células sanguíneas para que elas regridam a um estágio de pluripotência característico de célula-tronco. Em seguida, induzem a diferenciação em células hepáticas. Os esferoides são então misturados à biotinta, uma espécie de hidrogel, e impressos. As estruturas resultantes passam por um período de maturação em cultura que dura 18 dias.
Para realizar o experimento, os pesquisadores utilizaram células de sangue de três voluntários como matéria-prima. O estudo concentrou-se em produzir fígados em miniatura, mas a expectativa é que seja viável a produção de órgãos inteiros no futuro, que poderiam ser transplantados. “Fizemos em uma escala mínima, mas com investimento e interesse é muito fácil de escalonar”, disse Ernesto Goulart.
Mayana Zatz, coordenadora do CEGH-CEL e coautora do artigo, reforçou a intenção dos pesquisadores de produzir órgãos para transplante no futuro. “Ainda existem etapas a serem alcançadas até obtermos um órgão completo, mas estamos em um caminho muito promissor”, disse.
De acordo com Zatz, é possível que, em um futuro próximo, em vez de esperar por um transplante de órgão, seja possível pegar a célula do próprio paciente e reprogramá-la para construir um novo fígado em laboratório. “Outra vantagem importante é que, como são células do próprio paciente, a chance de rejeição seria, em teoria, zero”, detalha a médica. (Com informações da Fapesp)
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