Rastreabilidade de medicamentos: chegou a hora do Blockchain?

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Por Rodrigo Klein*

O Blockchain é a tecnologia que está por trás do Bitcoin e é ela que permite que possa acontecer a transferência da moeda virtual em uma estrutura pública e distribuída através da internet.

A tecnologia funciona usando algoritmos em uma rede distribuída que registram transações usando blocos imutáveis de dados que quando alterados, quebram toda a cadeia subsequente, inviabilizando assim a alteração dos registros. Além dessa característica, a outra bem marcante é que tudo isso funciona literalmente de forma descentralizada, sem um ponto único de controle na rede. Todos os participantes da rede tem acesso aos mesmos dados momentos após o seu registro.

Atualmente existem duas formas de utilização mais conhecidas do Blockchain, uma é a que está por trás do Bitcoin, que é suportado por uma rede pública de nós, onde virtualmente qualquer pessoa pode registrar bitcoins. A outra são o que chamamos de redes permissionadas, que são nada mais do que redes privadas onde só participam nós conhecidos e autorizados a pertencer à rede.

As redes permissionadas estão sendo muito usadas por empresas privadas para a troca de informações e registro de transações seguras que precisam ser conhecidas ou verificadas pelos seus membros. Atualmente essas iniciativas estão bastante concentradas no mercado financeiro mas a verdade é que o Blockchain pode ser usado em praticamente qualquer coisa que pode ser digitalizada, veja bem, eu disse digitalizada, não eletrônica!

De onde surgiu a ideia?

Já faz algum tempo que venho estudando o Blockchain para tentar aplicá-lo à Rastreabilidade de Medicamentos e de acordo com o meu conhecimento em Rastreabilidade, acho que nós ainda não estamos preparados para usá-lo para rastrear unidades de medicamentos na cadeia de suprimentos. Atualmente já temos modelos implementados mundialmente que usam protocolos proprietários dos governos de cada país e para todas as outras situações já temos o EPCIS da GS1.

Digitalizar unidades de medicamentos registrando-as como “Assets”, realmente seria fantástico, mas na minha opinião, a quantidade de exceções e erros que temos hoje na cadeia de suprimentos fariam do Blockchain um vilão e não um aliado.

Apesar disso, passei a acreditar realmente que o Blockchain como tecnologia pode resolver outro problema, o de comunicação horizontal na cadeia de suprimentos.

O Problema

Hoje com a lei 13.410, que é a lei da Rastreabilidade no Brasil, na ANVISA vai ter um banco centralizado onde todos os participantes devem registrar suas transações relacionadas aos IUMs fabricados e movimentados. Isso vai permitir que a ANVISA tenha um registro histórico de cada medicamento fabricado no Brasil, sabendo quando ele foi produzido, quando ele foi vendido e até mesmo quando ele foi dispensado para o consumidor.

Essa comunicação com a ANVISA é o que chamamos de comunicação vertical, ela é a comunicação que todo elo da cadeia de suprimentos deve estar preparado para fazer e na prática é disso que o SNCM se trata. De comunicar à ANVISA as transações de medicamentos na cadeia para que ela tenha dados para uso sanitário, regulatório e o papel da ANVISA acaba nesse momento.

O SNCM não está sendo concebido para ser um HUB de integração para a cadeia de suprimentos e eu imagino que a ANVISA tem alguns motivos bem plausíveis para não se envolver nisso.

  1. O SNCM não é um sistema “Tempo Real”, isso mesmo, os integrantes da cadeia de suprimentos tem 3, 5 e 7 dias para enviar suas transações.
  2. A ANVISA não quer se envolver em questões comerciais e se ela atuar como um HUB, pode ter mais responsabilidades do que deveria. Essas responsabilidades estão relacionadas como SLA (Service Level Agreement) do sistema. (Se ela atuar como um HUB, já imaginou se o SNCM parar por um dia, o prejuízo na cadeia?)
  3. Cada um no seu quadrado, a ANVISA precisa monitorar medicamentos e usar esses dados para fins de saúde pública e não prestar serviço de comunicação.

Com isso bem claro, agora precisamos resolver como vamos entregar as informações da rastreabilidade para o próximo nó da cadeia de suprimentos. Isso pode ser feito de várias formas principalmente usando protocolos de transferência de arquivos ou webservices.

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Com essa abordagem, resolvemos a questão da comunicação horizontal de forma bem simples e sem problemas tecnológicos, porém, seria factível apenas se tivéssemos poucos pontos de integração na cadeia de suprimentos. De forma muito simplista a cadeia de suprimentos parece como a figura acima, mas na verdade ela é como a figura abaixo.

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De fato a complexidade dessa comunicação traria um grande custo para a cadeia, incrementando em muito a complexidade das operações.

A Solução

Com base na confusão que seria a troca de informações na cadeia, poderíamos utilizar uma rede blockchain permissionada para entregar informações de remessa na cadeia de suprimentos. A complexidade de se conectar com diversos pontos na cadeia seria abstraída pelo Blockchain e cada participante teria apenas um ponto de conexão que seria em seu respectivo “Nó”.

Como o blockchain é distribuído, não teríamos um ponto concentrador com o controle da rede e também não teríamos um SPOF (Single Point of Failure).

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Como funcionaria o registro de transação?

Em um blockchain de bitcoins os assets são as criptomoedas, no nosso caso os assets seriam os arquivos remetidos à ANVISA que agora seriam disponibilizados ao próximo nó da cadeia de suprimentos.

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Quem poderia participar da rede?

O melhor benefício de uma rede permissionada é que você pode escolher quem participa, ela não é uma rede aberta que qualquer um pode se conectar como um blockchain de bitcoins, na rede permissionada um novo nó só pode entrar caso ele receba essa permissão.

Em nosso caso, poderiam participar da rede os Detentores de Registro, Distribuidores e Varejistas. Além desses que são participantes legítimos, temos os prepostos, que seriam empresas ou instituições que teriam o poder de submeter transações em nome de outros (sob autorização). Nesse cenário podemos ter ainda as associações do setor como participantes da rede e nesse caso elas poderiam prover serviços a seus associados assim como um preposto.

Governança

A governança da rede poderia ser feita pelos participantes da rede e o próprio blockchain já implementa alguns protocolos de consenso que em teoria ajudariam nessa gestão da rede.

Conclusão

É fato que a Rastreabilidade vai trazer grandes desafios ao setor, vai impactar na produtividade e em muitos processos logísticos que irão forçar o setor a ser melhor em termos operacionais. Esses são os desafios conhecidos hoje, porém temos que começar a pensar em integrar a cadeia e o caminho pode passar pelo Blockchain. Uma indústria tem facilmente centenas de distribuidores como clientes e esses por sua vez tem milhares de farmácias na outra ponta. Analisando esse contexto precisamos de uma forma eficiente para conectar a cadeia e acredito que o Blockchain pode sim ser o facilitador dessa conectividade.

E você, qual é a sua opinião?

* Rodrigo Klein – Specialist in Product Traceability and Industry 4.0 technologies. CEO da T2 Software.
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