Saiba o que são medicamentos off-label

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Medicamentos off-label são aqueles prescritos para uso diferente do indicado na bula. A prática é adotada quando outros tratamentos falharam

O medicamento campeão de vendas do laboratório Pfizer surgiu quase sem querer. Durante testes para avaliar a ação da substância sildenafila no combate à hipertensão e angina, descobriu-se que a droga tinha como efeito colateral a indução à ereção peniana. O laboratório decidiu, então, mudar a direção das pesquisas e investir na criação de um medicamento contra disfunção erétil.

Em 1996, foi lançado o Viagra, um dos medicamentos mais famosos da história da indústria farmacêutica mundial, pela sua capacidade de prolongar a qualidade da vida sexual dos homens. A droga tornou-se um fenômeno e, entre os anos de 1999 e 2001, as vendas anuais excederam 1 bilhão de dólares. Somente no Brasil, desde 1998, já foram vendidos mais de 114 milhões de comprimidos.

Esse é um exemplo clássico de que uma mesma substância não tem, necessariamente, uma única aplicação farmacológica. Mesmo medicamentos já aprovados pelas agências reguladoras ao tratamento de determinada doença, podem vir a ser empregados em outra situação.

Para esses casos, usa-se a expressão “off-label”. Essa denominação refere-se a um uso diferente do que foi aprovado no registro do medicamento – e que consta da bula do mesmo; também se refere ao uso de produto não registrado no órgão de vigilância sanitária do país que, no Brasil, é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

“Quando um medicamento é aprovado para uma determinada indicação, isto não implica que esta seja a única possível, e que o medicamento só possa ser usado para ela. Outras indicações podem estar sendo, ou vir a ser estudadas, as quais, submetidas à Anvisa quando terminados os estudos, poderão ser aprovadas e passar a constar da bula”, explica a farmacêutica bioquímica, mestranda pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP), Vera Pivello.

O termo “off-label” pode se referir tanto ao uso diferente do especificado na bula, como a uma dosagem diferente, administração por uma via não prevista na aprovação, ou para grupos aos quais o medicamento não foi avaliado, especialmente em pediatria, geriatria e para gestantes – pois estes são grupos onde há muitas dificuldades, ou mesmo impossibilidade de realizar os testes clínicos que são feitos antes da liberação de um medicamento para a comercialização.

Um dos casos mais antigos de medicamento off-label é o do ácido acetil salicílico, fármaco desenvolvido, em 1897, como analgésico. Posteriormente, foram estudados vários outros usos para o ácido acetil salicílico, como antitérmico, anti-inflamatório, antirreumático e na prevenção da trombose e de infartos e reinfartos do miocárdio.

Recentemente, cientistas da Universidade Queen Mary, na Inglaterra, anunciaram que a ingestão diária do medicamento pode reduzir as chances de se desenvolver certos tipos de câncer. Os casos da doença no intestino, estômago e esôfago, por exemplo, chegam a ser reduzidos entre 30% e 40%. Também foram encontrados indícios de que a droga pode diminuir os riscos que provocam câncer de mama, de próstata e de pulmão.

Aplicação proposta

O uso off-label é feito quando alternativas de tratamento falharam, ou quando, após avaliação médica, conclui-se que o medicamento pode ser útil para um paciente que tenha uma condição semelhante a outra à qual o mesmo é utilizado. A prática da indicação off-label não é ilegal, mas o uso off-label, em qualquer circunstância, deve ser apoiado em evidências clínicas que apontem benefícios para tal utilização. “O uso off-label é, por definição, não autorizado por uma agência reguladora, mas isto não implica que seja incorreto”, informa a Anvisa.
Enquanto as novas indicações não são aprovadas, seja porque as evidências para tal ainda não estão completas, ou porque a agência reguladora ainda as está avaliando, é possível que um médico já queira prescrever o medicamento a um paciente. “Podem também ocorrer situações de um médico querer tratar pacientes que tenham certa condição que, por analogia com outra semelhante, ou por base fisiopatológica, ele acredite que possam vir a se beneficiar de um determinado medicamento não aprovado para ela”, esclarece a assessoria de imprensa da Anvisa.

No entanto, a Agência deixa claro que a indicação off-label é feita por conta e risco do médico que o prescreve, e pode eventualmente vir a caracterizar um erro médico, embora, em grande parte das vezes, trate-se de uso correto, apenas ainda não aprovado. Por isso, é preciso tomar algumas precauções antes de prescrever o uso extraoficial de um medicamento.
“Do ponto de vista ético, a indicação não pode ser feita apenas porque o médico acha melhor, tem de estar baseada em evidências clínicas. Além disso, o paciente deve saber que está fazendo uso diferente daquele indicado na bula. Recomenda-se, inclusive, que se exija assinatura de termo consensual. A prática deve ser sempre informada ao conselho do hospital, não pode ser algo solto, pois existem riscos“, explica o assessor técnico do Conselho Federal de Farmácia (CFF), José Luis Maldonado.

Após a comprovação da eficácia do uso extraoficial de determinado medicamento, é possível que a utilização off-label torne-se oficial, se as evidências, fundamentadas por especialistas, e dentro de padrões e protocolos para a prescrição, puderem estabelecer situações clínicas onde o uso seja vantajoso, havendo aprovação da agência reguladora de cada país.

“Há muitos casos assim, uma vez que os critérios de utilização de medicamentos são dinâmicos e mudam, como ocorre em todas as áreas do conhecimento”, destaca Vera. No entanto, a farmacêutica lembra que também há situações em que o uso off-label é descartado.

Entre os anos de 2010 e 2011, uma revista nacional de larga escala divulgou que o medicamento Victoza® (liraglutida) estava sendo prescrito como “emagrecedor”, apesar de possuir aprovação apenas para o tratamento do diabetes tipo 2. Em nota oficial, a Anvisa declarou que não reconhece seu uso para indicação diferente da aprovada (que é como antidiabético), e afirmou que seu uso para qualquer outra finalidade caracteriza elevado risco sanitário para a população.

Divergência questionada

Conforme esclarecimento dado pela Anvisa, o que é hoje off-label, no Brasil, pode já ter o uso aprovado em outro país. Não necessariamente o medicamento virá a ser aprovado aqui, mas como os critérios de aprovação estão cada vez mais harmonizados internacionalmente, a aprovação tem grande possibilidade de acontecer.

“A aprovação no Brasil, porém, pode demorar, por vários motivos, entre os quais o de que o pedido de registro pode ser feito muito mais tarde aqui do que em outros países. Também pode ocorrer que o medicamento receba aprovação acelerada em outro país, baseada na apresentação de estudos preliminares ou incompletos, o que, em geral, não é aceito pela Anvisa”, explica a assessoria de imprensa do órgão.

Um caso bem atual ilustra a situação. O canabidiol, substância presente na planta usada para produzir maconha, tem o uso off-label debatido, já que apresenta resultados positivos no tratamento de certas doenças neurológicas graves. O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) publicou uma resolução, em outubro último, regulamentando o uso do canabidiol para o tratamento de epilepsias graves da infância, que não responderam aos tratamentos convencionais.

Para a Anvisa, a substância ainda é considerada proscrita (proibida). No entanto, a Agência já aprovou, recentemente, muitos pedidos excepcionais de importação do canabidiol para tratamento de doenças neurológicas.

A proibição do uso medicinal poderá mudar em breve, de acordo com o que foi sinalizado pelo representante da Anvisa, Luiz Klassmann, no 4º Simpósio Internacional da Cannabis Medicinal, ocorrido em maio de 2014, em São Paulo. Na abertura do evento, Klassmann informou que o canabidiol será retirado da Lista F2, de Substâncias Proscritas da Portaria 344/98 (Portaria que regulamenta as substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial), sendo reclassificado como substância legal.

Mas há casos em que a indicação off-label nunca será aprovada por uma agência reguladora, como em doenças raras cujo tratamento medicamentoso só é respaldado por séries de casos. Tais indicações possivelmente nunca constarão da bula do medicamento porque jamais serão estudadas por ensaios clínicos.

Fonte Guia da Farmácia

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Comentários

  • O texto está muito bom. Apenas como sugestão, o mais correto seria usar o termo " indicação off-label" e não " medicamento off-label"

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