Pele reconstruída pela bioimpressão 3D — Foto: Divulgação

Pele reconstruída pela bioimpressão 3D — Foto: Divulgação

 

 

A 3D Biotechnology Solutions foi fundada em 2017 e desde então trabalha produzindo equipamentos, como bioimpressoras 3D, e membranas para estudos

 

Por Rebecca Silva | PEGN

 

Estima-se que o corpo humano seja formado de 37 trilhões de células. Com diferentes funções, elas nos mantêm vivos diariamente. A tecnologia pode potencializá-las em laboratório: a partir de células coletadas, a startup 3D Biotechnology Solutions (3DBS) cria tecidos de pele, barreira intestinal e fígado para medicina regenerativa e testes da indústria, substituindo o uso de cobaias animais.

A startup foi fundada por Ana Millás, Pedro Massaguer e Hamilton Oriente. Bióloga de formação, Millás fez mestrado e doutorado em engenharia química, quando trabalhou com biopolímeros e ciência de materiais. Foi naquela época, enquanto desenvolvia o protótipo de uma bioimpressora 3D, que ela conheceu Oriente, engenheiro mecânico especialista em manufatura aditiva. Ela é casada com Massaguer, formado em administração de empresas e especialista em gestão estratégica de negócios.

Em 2017, o trio identificou uma tendência de mudança no cultivo celular, que se transformava do 2D para o 3D, com a criação de empresas dedicadas ao tema. No Brasil, porém, não se percebiam grandes movimentações, e os custos para comprar os equipamentos importados eram altíssimos. “Não havia um direcionamento, a Anvisa não tinha se posicionado sobre os protocolos de pesquisa e registro, várias universidades estavam tentando acessar essa tecnologia. Identificamos uma oportunidade de negócio, inicialmente de explorar os equipamentos, para ter um modelo de bioimpressora nacional”, conta Massaguer.

A bioimpressora 3D imita os tecidos do corpo humano. “É uma plataforma de inúmeras possibilidades. Pode ser utilizada na área de alimentos, para produzir pele, tecidos para medicina regenerativa, simular tecidos neuronais”, diz Millás. A startup também produz equipamentos de eletrofiação, que replica a tecnologia usada na indústria têxtil. “Esses equipamentos estão direcionados a um mercado científico, olhamos mais o B2C, com clientes como biólogos, engenheiros e pesquisadores da área da saúde”, acrescenta Massaguer.

Atualmente, as máquinas criadas pela 3DBS já são utilizadas em instituições públicas como Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de ensino como Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e Universidade de São Paulo (USP), e em empresas como Grupo Boticário.

A startup também patenteou a tecnologia chamada de membranas eletrofiadas, utilizada para regenerar pedaços de tecido que precisam de recuperação. A técnica pode tratar feridas e está em fase de testes clínicos para odontologia. Massaguer reforça, porém, que a medicina regenerativa ainda está em fase embrionária e que ainda não vislumbra quando será possível criar em laboratório novos órgãos para transplante, por exemplo. “Pode surgir algum protótipo viável, mas é difícil tornar escalável. Temos hoje no Brasil produtos de terapia avançada em engenharia tecidual, mas nada aprovado e com liberação de mercado pela Anvisa. Hoje os consumidores ainda são os pesquisadores criando conhecimento nas universidade”, pontua.

Há cerca de um ano, a 3DBS abriu um novo CNPJ para desenvolver a frente de negócios de produção de modelos in vitro dos tecidos que mimetizam órgãos humanos como intestino, fígado e pele. Esse material é utilizado pelas indústrias cosmética, farmacêutica e alimentícia para fazer testes de novos compostos sem o uso de cobaias animais. Esse braço está incubado no Hub Mandic, da Faculdade São Leopoldo Mandic – que entrou na sociedade da startup – e atua no B2B, tendo como principal cliente a Natura.

Desde a criação da empresa, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) foi a principal financiadora da startup. Até o momento, a 3DBS captou cerca de R$ 2 milhões a partir da linha de fomento PIPE, direcionado para pesquisa científica e tecnológica em micro, pequenas e médias empresas.

A startup iniciou as conversas com investidores institucionais para captar outros R$ 2 milhões com o objetivo de internacionalização, aumento da infraestrutura laboratorial e da equipe para ampliar a produção dos tecidos mimetizados. “A empresa de equipamentos dobra a cada ano e temos a expectativa de que a de tecidos cresça ainda mais exponencialmente por causa da demanda. É algo mais nobre ainda, inédito, que brilha mais os olhos dos investidores”, afirma Millás.

Mas a bióloga reconhece a dificuldade de sair de dentro dos laboratórios das universidades e chamar a atenção de quem não vive a academia. “Transformar o conhecimento de uma tese em um produto de prateleira, principalmente na área inovadora de biotecnologia, é um desafio. Mas se não formos nós, vão ser outros e talvez lá de fora. Precisamos valorizar isso no Brasil”, declara.

 

 

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