Folha de S.Paulo
Jornalista: Marcelo Toledo
03/03/20 - Um surto de sarampo atingiu pelo menos 76 cadetes da AFA (Academia da Força Aérea), em Pirassununga (a 211 km de São Paulo), em um intervalo inferior a um mês. Outros 25 pacientes aguardam os resultados dos exames que, se confirmados, farão com que o total de contaminados chegue a 101.
O total de casos já confirmados representa 11% dos 692 cadetes que atualmente estão na academia, cujo curso tem duração de quatro anos. Se os 25 em análise forem confirmados, o índice chegará a 14,5%.
Os casos começaram a ser registrados em 31 de janeiro e, como a transmissão da doença pode começar antes mesmo do aparecimento dos sintomas, nas semanas seguintes as notificações proliferaram entre os cadetes, segundo a Vigilância Epidemiológica da cidade paulista.
O local foi alvo de um bloqueio vacinal a partir do dia 21 e todos os cadetes com suspeitas dentro da AFA foram retirados das atividades coletivas e colocados em isolamento de quatro dias nos alojamentos como medida protetiva.
Exceto um, todos os casos confirmados são de alunos do primeiro ano do curso de formação. O outro é de uma civil, que contraiu a doença na própria academia.
“O período de adaptação é muito intenso, com estresse, e a imunidade fica comprometida. Confinamento e baixa do sistema imunológico são o cenário para atrair o sarampo”, disse a enfermeira Patrícia Isabela Cascardo Mellário, coordenadora na Vigilância Epidemiológica de Pirassununga.
O primeiro caso confirmado foi o de um cadete do Rio de Janeiro. Ele chegou à cidade do interior com o vírus incubado, segundo a Vigilância.
Segundo Mellário, os casos na academia foram brandos porque os doentes eram vacinados. Mas a coordenadora da Vigilância Epidemiológica de Pirassununga disse não ter em mãos nesta terça dados exatos sobre a situação vacinal de cada cadete.
Com a escalada das notificações, bastava o cadete apresentar febre —que poderia indicar outras doenças, não só sarampo— para ser isolado pela AFA.
O número de casos deve se aproximar de cem, segundo a enfermeira, porque, das 103 notificações feitas desde o surgimento do surto, só duas não foram confirmadas até esta segunda-feira (2).
Todos os contaminados apresentaram quadros mais brandos da doença, com sintomas como febre, manchas vermelhas no corpo, tosse, coriza e conjuntivite. Não foi necessária a internação em hospitais.
Os 25 casos em investigação —alguns dos quais de funcionários da AFA— devem ter os resultados divulgados nas próximas semanas. Eles devem ser confirmados, conforme a vigilância, porque os pacientes suspeitos tiveram contato muito próximo com os cadetes que tiveram casos confirmados. “O potencial de contágio é muito alto.”
LIMITE
O órgão municipal considera que o surto tem área geográfica limitada à academia e que não há registros de casos no restante do município de 76 mil habitantes.
De acordo com a AFA, todas as ações protocolares para contenção e interrupção do contágio do vírus ainda estão em curso e, desde o último dia 21, os cadetes e residentes nas vilas começaram a passar por bloqueio vacinal, em coordenação com a Vigilância Epidemiológica.
“Em decorrência das medidas adotadas, apenas um novo caso foi verificado desde o dia 22 de fevereiro”, diz trecho de nota do setor de comunicação social da AFA. O órgão informou que o total de notificações é de 88.
A avaliação do órgão municipal é que não devem surgir novas notificações após as medidas emergenciais adotadas na academia. “O que poderia ser feito, foi feito”, disse Mellário.
A AFA tem área construída de 215 mil m², dos quais 73.246 m² são de área residencial.
Em dezembro, com a presença do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), 139 cadetes se formaram aspirantes a oficial na AFA. Em 2018, foram 148.
No local, eles recebem diplomas de graduação em nível superior em áreas como ciências aeronáuticas (aviadores), militares (infantaria) e logística (intendentes).
A cidade está em campanha de vacinação desde fevereiro, que será concluída no próximo dia 13. O foco é atender moradores com a carteira de vacinação desatualizada.
Segundo dados do Ministério da Saúde, no ano passado 526 municípios confirmaram casos de sarampo em 23 Unidades da Federação. São Paulo teve o maior número de casos, distribuídos em 259 municípios, seguido de Paraná, Rio de Janeiro, Pernambuco, Santa Catarina, Minas Gerais e Pará.
O sarampo foi reintroduzido no estado de São Paulo em 2019, após duas décadas sem a circulação endêmica do vírus, de acordo com o CVE (Centro de Vigilância Epidemiológica), do governo paulista.
No ano passado, foram confirmados 17.529 casos, segundo o CVE, com 14 mortes. Neste ano, são 280 confirmações, com uma morte.
O óbito se refere a uma criança que morreu dia 1º de janeiro na capital, mas cujos exames só confirmaram a causa em fevereiro.
A primeira morte confirmada no país neste ano ocorreu no Rio de Janeiro —foi também a primeira no estado em 20 anos. A vítima foi um bebê de oito meses que morreu em 6 de janeiro, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.
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