Transplantes: Decisão vem antes da morte

Correio Braziliense

Jornalista: Indefinido

07/12/19 - “É muito importante que as famílias conversem sobre doação de órgãos. No Brasil, a morte é um tabu, portanto, em muitas famílias o assunto é evitado, mas, quando é conversado, fica bem fácil tomar a decisão, até porque é da cultura brasileira realizar a vontade de quem morreu. Isso é muito respeitado”, pondera Joseane Vasconcellos, da Central Estadual de Transplantes do DF.

A lembrança de um diálogo familiar foi o que levou a família de Shirley da Silvia Teles a fazer a doação. “Minha mãe era muito brincalhona. Um dia, eu disse a ela que, se eu morresse, eu queria que doassem meus órgãos. Ela riu e respondeu: ‘doa mesmo, minha filha, o que a gente não usa, tem que dar’. No dia que ela morreu, nós nos lembramos disso”, conta.

“A família está vivendo uma perda que pode ser repentina. O comunicado sobre a possibilidade de doação de órgão, muitas vezes, pode ser uma novidade e, em alguns casos, um lembrete. É importante que a pessoa esteja bem informada sobre o que é a morte encefálica e sobre a condição de seu parente e, mais importante, saber o desejo da pessoa que morreu sobre isso”, afirma a psicóloga Graça Maria Marino Totaro .

Na avaliação de Joseane, o tema doação de órgãos não é polêmico. Para ela, a dificuldade em aumentar as doações está mais relacionada à aceitação da morte. “De um modo geral, os brasileiros lidam mal com a morte. Países que lidam melhor com isso têm mais facilidade para desenvolver a doação. A partir do momento em que a família aceita a morte, não tem tanto problema. Algumas famílias querem que o parente seja enterrado como nasceu, com todos os órgãos. A gente sempre explica que, depois da retirada, o corpo é todo recomposto e ninguém consegue dizer que aquele paciente é um doador”, explica.

Para Graça Maria, a ideia de que a pessoa que morreu possa ter sua imagem alterada pode ser um impeditivo para doação, portanto, tem que ser bem explicado. “A questão da cultura religiosa, a fé ou o que norteia família com relação ao corpo e ao espírito ou alma também é importante. Há crenças, por exemplo, que colocam que o corpo deve estar inteiro para adentrar em outro reino, ou algo assim. Isso é importante e pode interferir na decisão”, diz.

Ela alerta também sobre os cuidados que devem ser adotados na abordagem das famílias. “O importante é não fazer a abordagem com o pressuposto de que a família faça a doação. É preciso considerar o tempo da família e não ter o desejo de que a família doe. Isso é muito perigoso e pode impossibilitar a doação, pois o desejo não é da família, mas de quem está abordando. Mas isso é incomum. No geral, as pessoas que são treinadas e não mobilizadas pelo seu desejo, mas com a escuta”, diz. “A doação deve ser sempre voluntária. A pessoa deve ser abordada e não convencida”, completa Joseane.

Tráfego

Um dos mitos que podem frear a doação de órgãos é a desconfiança sobre o possível comércio e tráfego de órgãos que, para médicos e especialistas, é um mito desenvolvido pela sociedade por falta de informação e conhecimento do sistema de transplantes e doação de órgãos. “Não existe tráfego de órgão no país. Temos um sistema muito fechado. O transplante envolve cirurgias que não são simples. Depende de toda uma estrutura para cuidar do corpo do doador, fazer a extração do órgão em centro cirúrgico. Todo o processo envolve toda uma complexa logística. Para definir para quem vai o órgão, temos um sistema informatizado que o Brasil inteiro utiliza. É muito bem estruturado. Não tem como fazer isso fora do sistema e manter sob sigilo”, esclarece Daniela Ferreira Salomão, da coordenadora do Sistema Nacional de Transplantes do Ministério da Saúde. (CD)

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