ISTOCK
Por Juliana Contaifer
Metropoles
No encontro, sediado em Chicago, são apresentadas as últimas novidades sobre o assunto
O mês de junho é conhecido entre oncologistas e profissionais que pesquisam câncer como o momento de aprender e mostrar as novidades sobre o assunto. O congresso da American Society of Clinical Oncology (Sociedade Americana de Oncologia Clínica, conhecida popularmente como Asco) é frequentado por médicos do mundo inteiro — muitos brasileiros, inclusive, viajam aos Estados Unidos para participar dos cinco dias de palestras e trazer o conhecimento adquirido para o Brasil.
Conversamos com médicos que estão em Chicago para entender melhor alguns dos destaques em pesquisas cujos resultados podem demorar a chegar ao paciente, mas tendem a mudar a forma tradicional de lidar com câncer.
Na edição 2018, destacaram-se as pesquisas sobre o protocolo de tratamento de pacientes com câncer de mama que já fizeram a mastectomia; a evolução da biópsia líquida, a qual pode passar a encontrar pedaços de DNA tumoroso de câncer de pulmão e adiantar o diagnóstico; e até um estudo relacionando o uso de aspirina com a prevenção do câncer de esôfago. Confira:
Mama
Dois estudos chamaram atenção na área da mama. Um deles fala sobre o tratamento pós-cirúrgico. Existem três cenários: quimioterapia, quimioterapia aliada à hormonoterapia ou apenas a hormonoterapia. Para definir o futuro de cada paciente, é preciso passar por uma análise gênica (um teste muito caro, cerca de US$ 4 mil no Brasil). Na ausência dele, o oncologista faz uma escolha baseada na situação do paciente e nas características individuais da doença.
O estudo TAILORx, patrocinado pelo governo americano, é o maior já realizado na área da mama. Mais de 10 mil mulheres com expressão negativa do hormônio HER2 e sem nódulos nas axilas (o tipo mais comum de câncer de mama) participaram e, destas, mais da metade se encaixou em um grupo de risco intermediário de recidiva.
“A pesquisa apresentada mostra resultados em uma área na qual tínhamos muita dúvida: a maioria dos pacientes com risco intermediário de recidiva não precisa fazer quimioterapia. Só o hormônio é suficiente. O estudo ajuda na hora de tomar essa decisão”, explica o oncologista Anderson Silvestrini, da Oncologia D’Or de Brasília.
Outro destaque fala de tratamento para pacientes com HER2+, um subgrupo que engloba de 15 a 20% dos portadores da doença. O padrão nesse caso é o uso do medicamento trastuzumabe por um ano. De acordo com um estudo inglês, esse tempo pode ser diminuído para seis meses em grande parte dos pacientes com o mesmo benefício. “É importante, pois diminui a toxicidade e o custo em saúde”, conta Silvestrini.
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As novidades no tratamento e diagnóstico de câncer de pulmão são sempre um ponto alto entre as pesquisas da Asco. O oncologista especialista na região do tórax Eduardo Medeiros, da Oncologia D’Or, aponta dois destaques.
O primeiro é um estudo, apresentado por Gilberto Lopes, oncologista brasileiro residente nos Estados Unidos, que fala sobre o papel da imunoterapia no tratamento. “Há uns três anos, vivemos uma era da imunoterapia, seja usada de forma isolada ou combinada com a quimioterapia”, conta Medeiros.
De acordo com o estudo Keynote-042, o tratamento com o medicamento pembrolizumab é mais efetivo como abordagem inicial do que a quimioterapia (padrão) na maior parte dos pacientes com o tipo mais comum de câncer de pulmão — o de não pequenas células avançado, com expressão de PD-L1 de 1%. Os pacientes participantes da pesquisa viveram entre quatro e oito meses a mais do que os medicados com quimioterapia.
“Um grande número de pacientes com câncer de pulmão agora tem uma nova opção de tratamento com mais eficácia e menos efeitos colaterais do que a tradicional quimioterapia”, explica Lopes, em entrevista ao site da Asco.
Outra pesquisa interessante fala sobre diagnóstico precoce. É difícil definir o câncer de pulmão com antecedência, e o mais comum é o paciente descobrir a doença quando já está avançada. O estudo CCGA afirma que, em evidências preliminares, um exame de sangue poderia detectar o DNA do tumor na corrente sanguínea usando sequenciamento genético.
“Assim, conseguiríamos fazer o diagnóstico precoce e pegar o câncer em uma fase muito inicial. Estamos a um passo de conseguir isso apenas com um simples exame de sangue. É uma técnica que vai demorar a chegar ao público por ser cara, mas é algo intrigante e desafiador”, afirma Medeiros.
Rim
Para pacientes com câncer no rim metastático, a novidade é que talvez não seja necessário retirá-lo para melhorar o controle da doença — hoje, é o tratamento padrão. Segundo o estudo francês Carmena, responsável por comparar pacientes que passaram pelo procedimento e utilizaram o medicamento sunitinib com pessoas que apenas tomaram o remédio, a expectativa de vida aumenta de 13,9 meses para 18,4 sem tirar o órgão.
Além da expectativa de vida aumentar, é interessante evitar um procedimento invasivo e de risco. “Percebemos que a realização da cirurgia pode ser abolida. Ela não faz diferença na evolução dos pacientes”, comenta Fábio Schutz, oncologista clínico da BP — Beneficência Portuguesa de São Paulo.
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Apesar de 70% dos casos de câncer acontecerem em idosos, pouco se fala sobre o tratamento e o prognóstico desse tipo de paciente e a maioria das pesquisas não incluía essa faixa etária. É a população que mais cresce no mundo, mas ainda não é estudada o suficiente. Em 2018, a Asco tem prestado mais atenção no assunto.
A médica cearense Jurema Telles, da Oncologia D’Or, apresentou um trabalho sobre o câncer em idosos, feito no Brasil, com 1.400 pacientes. A pesquisa definiu um índice com três indicadores para oferecer o cuidado ideal — seja partindo para tratamento paliativo, trocando a dieta para se beneficiar melhor do procedimento ou seguindo o plano como se a idade não importasse.
“É um índice bem prático. Ele avalia logo na admissão do paciente e mostra fatores para cuidar de forma mais ampla. Hoje, dizer que uma pessoa tem 80 anos não diz quase nada sobre a saúde dela”, afirma. De acordo com a médica, a atenção e a preocupação com o idoso foram destaque na edição da Asco 2018.
Aspirina para o esôfago
Apesar de relativamente raro, o câncer de esôfago tem uma mortalidade muito alta — é o nono tipo de câncer que mais mata no Brasil, de acordo com dados do Inca, e é responsável de cerca de 10,7 mil casos por ano. Por isso, chamou muita atenção um estudo para relacionar a aspirina à prevenção da doença.
“O esôfago é um órgão de passagem e, por isso, a estrutura celular dele é muito resistente. Quando o trecho final assume um componente glandular, como se as células do estômago estivessem no esôfago, acontece o chamado Esôfago de Barrett e essas partículas podem se transformar em cancerígenas”, explica o oncologista Henry Luiz Najman.
Para o estudo, foram selecionadas 2.563 pessoas com Esôfago de Barrett. Elas foram divididas em quatro categorias: os que tomavam altas doses do inibidor de bomba esomeprazol; dose padrão de esomeprazol com baixa dose de aspirina; dose baixa de esomeprazol; e dose baixa de esomeprazol com dose baixa de aspirina. Os pacientes foram acompanhados por sete anos.
A conclusão foi que os participantes consumidores de dose alta de esomeprazol com baixa dose de aspirina apresentaram risco “moderadamente reduzido” de desenvolver uma displasia de alto grau (uma espécie de pré-câncer) ou câncer.
“Havia uma expectativa muito maior desse estudo, de que a associação dos remédios tivesse impacto consistente de redução de risco. Na verdade, o resultado é pequeno. É relevante para continuarmos buscando e pesquisando, mas a população escolhida é muito específica, não há negros ou afrodescendentes, por exemplo. A questão continua em aberto”, afirma Najman.
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