por Stephen Kanitz
Revista Veja, edição 1726, ano 34, nº45, 14 de Novembro de 2001.
“Antes de mais nada, eu mandaria embora 620 funcionários não essenciais, economizando US$ 12.200 milhões. Postergaria, por seis meses os gastos com propaganda, porque nossa marca é muito forte. Cancelaria nossos programas de treinamento por um ano, já que estaremos em compasso de espera. Finalmente, cortaria 95% de nossos projetos sociais, afinal nossa sobrevivência vem em primeiro lugar”. É exatamente isso que as empresas brasileiras estão fazendo neste momento, muitas até premiadas por sua “responsabilidade social”.
Terminada a exposição, o professor se dirigiu ao meu colega e disse:
- Levante-se e saia da sala.
- Desculpe, professor, eu não entendi - disse John, meio aflito.
- Eu disse para sair desta sala e nunca mais voltar. Eu disse: PARA FORA! Nunca mais ponha os pés aqui em Harvard.
Aquela aula foi uma lição e tanto. É fácil despedir 620 funcionários como se fossem simples linhas de uma planilha eletrônica, sem ter de olhar cara a cara para as pessoas demitidas. É fácil sair nos jornais prevendo o fim da economia ou aumentar as taxas de juros para 25% quando não é você quem tem de despedir milhares de funcionários nem pagar pelas conseqüências. Economistas, pelo jeito, nunca chegam a estudar casos como esse nos cursos de política monetária.
O correto é poupar e fazer reservas públicas e privadas, nos anos de vacas gordas para não ter de despedir pessoas nem reduzir gastos nos anos de vacas magras, conselho milenar. Poupar e fazer caixa no meio da crise é dar um tiro no pé. Demitir funcionários contratados a dedo, talentos do presente e do futuro, é suicídio.
Se todos constituíssem reservas, inclusive o governo, ninguém precisaria ficar apavorado, e manteríamos o padrão de vida, sem cortar despesas. Se a crise for maior que as reservas, aí não terá jeito, a não ser apertar o cinto, sem esquecer aquela memorável lição: na hora de reduzir custos, os seres humanos vêm em último lugar.
Comentários
Muito interessante este material,e eu concordo com o professor demitir pessoas tem que ser a ultima alternativa, pois quando você demiti um funcionário, com ele você esta demitido a sua familia também, ou seja além do funcionário em média esta demissão afeta mais 3 a 4 pessoas, como a esposa e filhos.,
Belo artigo!! Espero que os tecnocratas de plantão o leiam e entendam como se administra em situações de instabilidade econômica, como a citada no exemplo.
Decisões em crise são sempre dificeis. Gosto da proposta de fazer reservas enquanto tudo vai bem.
A matéria é realmente muito boa e nos remete a uma reflexão, será que os empresários responsáveis por estas atitudes gostam de ler este tipo de texto? Eu acho que não, neste momento fazem uso da audição e visão seletiva, muito utilizada nas empresas.
Show!
É amigo João, o professor tem razão. Isso, quando falamos de Harvard ou países com regimes trabalhistas bem definidos e "enxutos". Se levarmos em consideração que o trabalhador no Brasil tem um custo 3 vezes maior para as empresas, logo descobriremos a razão da demissão em primeira instância. Na verdade uma grande desculpa, manter o alto escalão e sacrificar os demais. Fácil, racional, inevitável, prático... Porém, totalmente covarde.
Maravilhosa lição. Muito valiosa para quando for um gestor. Muito grato, Melgado!