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Varejo se reinventa para continuar a ser o guru do comportamento do consumidor. Saiba o que os grandes têm feito com os dados para melhorar a experiência de compra

Por: Raphael Coraccini

Whow

O varejo está se desdobrando para descobrir como se beneficia do potencial da internet sem destruir o valor de seus principais ativos: os pontos físicos de venda. Em 2018, o varejo nacional sofreu a redução de sua rede de lojas, com o fechamento de 226,5 mil unidades, segundo Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Do outro lado, o varejo online só cresce, mesmo na crise. Só no Dia dos Namorados deste ano, o aumento nas vendas foi de 24%.

Porém, se o varejo físico estivesse morrendo, a Amazon não pagaria 13,7 bilhões de dólares pela rede de mercados Whole Foods. Cada vez mais, a loja física vira um ponto de captação de dados que interage com os dados captados na internet pelo mesmo varejista. E vice-versa. A Amazon lançou, no ano passado, a sua loja Amazon 4-Star, que reproduz a experiência online no físico e integra a precificação dinâmica e personalização de preços do site com as etiquetas de preço no ponto de venda físico.

O mais novo modelo de loja da Amazon usa a experiência no online também para escolher os produtos ofertados, colocando à disposição apenas aqueles com avaliação superior a 4 estrelas. Daniel Mazini, diretor de varejo da Amazon no Brasil, afirma que, a varejista americana recorre à sua base de dados para qualquer tipo de decisão. “Só para ter um catálogo de milhões de itens, como temos hoje, é preciso sistemas que consigam interpretar esses dados do começo ao fim da operação, da hora que eu crio um catálogo, passando pelo cálculo de quanto eu vou comprar, a dinâmica das vendas e a complexidade da entrega. Tudo isso precisa de muita análise de dados”.

226,5 mil lojas físicas fechadas em 2018

Desde 2018, a Amazon vem lançando novas categorias de varejo em seu e-commerce no Brasil. E para oferecer esses novos produtos, a empresa precisou usar a base de dados de outros países “para entender o quanto eu espero vender de determinados produtos. Mas, a partir do momento que a gente lança o produto para aquele determinado País, eu começo a usar os dados locais, que são mais específicos, e ignorar os de outros países”, aponta o executivo. Os dados que a Amazon está captando dos brasileiros, portanto, preparam uma racionalização sobre o comportamento de compra para oferecer novos produtos e serviços.

Além disso, a Amazon utiliza a sua vasta base de dados para personalização das interfaces com o consumidor. “Ao abrir a página da Amazon, vou ter uma experiência, baseada no que eu costumo procurar. Isso ajuda muito, porque não tem uma inteligência de uma pessoa sozinha tentando fazer um site, mas a customização para cada consumidor. O que vende muito no Brasil é diferente do que vende no México, Austrália ou Turquia, para comparar com novas operações da Amazon”, explica Mazini. “Essa experiência personalizada é resultado de muito big data por trás, entendendo como o consumidor navega, o que ele compra e o que ele vai comprar novamente”, completa.

A maioria das tecnologias empregadas pela Amazon para personalizar a experiência do consumidor é desenvolvida pela própria empresa, internamente. A varejista americana tem procurado, porém, fazer parceria com empresas brasileiras para resolver problemas que são bem típicos do Brasil. “Contamos com outras empresas para desenvolver soluções para a parte de legislação tributária. Além disso, a nossa logística é toda terceirizada”, detalha o diretor.

Outra característica própria do consumo no Brasil está relacionada a formas de pagamento pouco comum em outros países, como o boleto e o parcelamento no cartão de crédito. “A gente tem que pensar diferente principalmente em relação ao fluxo de caixa, que no Brasil é diferente. No boleto, você recebe imediatamente, mas no parcelamento, não é imediato. Os fluxos de caixa são diferentes para essas modalidades”, reforça Mazini.

A operação da Amazon no varejo por todo o mundo está focada na eficiência do trânsito do fluxo de caixa, agilizando pagamentos e recebimentos. Por isso, a implementação de soluções de pagamento tem sido tratada com especial cuidado. “Parcelamento a gente começou a oferecer em 2014, mas vendas no boleto passaram a estar disponível apenas neste ano. A gente tinha um problema no boleto, que é um método de pagamento que você precisa garantir que tem o produto em estoque para que a pessoa não pague e a gente descubra depois que não tem o produto em estoque”, detalha.

E para iniciar esse complexo sistema de personalização em alto grau, a empresa americana começa pedindo ao cliente poucos dados, como nome completo, e-mail e número do telefone. “Se o usuário não fizer uma compra, a gente não pede mais nada. O grosso do nosso trabalho não está com detalhes das informações dos clientes, mas do comportamento dele no site. A gente vê se a pessoa compra muito um tipo de eletrônico ou tipo de roupa, é muito mais pelo comportamento e frequência”, explica Mazini, que destaca que, a análise de dados não é perfeita. “A gente pode, sim, chegar a conclusões erradas sobre o comportamento do consumidor achando que o histórico de navegação representa um perfil de compra, mas, na verdade, ela procura outras coisas”, avalia.

Essa complexidade para oferecer produtos ao consumidor antes mesmo que ele saiba o que quer se aprofunda em operações com franco aumento no mix de produtos do site, como a da Amazon no Brasil, que tem se expandido desde o ano passado. “A gente vê como o e-commerce no Brasil é bem mais desenvolvido em algumas categorias do que outras, como produtos eletrônicos ou quaisquer aparelhos de ligar na tomada, além de livros e outras mídias. Estamos vendo agora as pessoas que consumiam apenas essas categorias, começar a transitar por outras categorias, como produtos de beleza, cuidados pessoais e roupas, e como elas passam de eventuais clientes ou visitantes para heavy user”, detalha Mazini. “A gente vê que o Brasil está nessa fase de mudança do comportamento de compra na internet, migrando de produtos eletrônicos para outros produtos, mais customizados, como moda e beleza”, conclui.

Customização

Boa parte das tecnologias e processos das lojas do Pão de Açúcar e do Extra é desenvolvido no GPA Labs, hub de inovação do GPA, que é dono das bandeiras de varejo alimentar. Quando a solução não é desenvolvida em casa, os especialistas da empresa vão atrás de startups no mercado para resolver carências pontuais.

Um dos pontos que mais recebe investimento é o da coleta de dados. E grande parte disso é feito através dos aplicativos do grupo e dos programas de fidelidade. Essa mudança na maneira de enxergar o consumidor faz com que o varejo alimentar abra mão em partes das tradicionais promoções massivas. Isso porque as tecnologias de captação de apuração de dados permitem criar um histórico robusto do comportamento de compra para poder oferecer o preço certo para o cliente certo. Como retorno, o GPA afirma que os clientes que passam a utilizar o aplicativo e usufruir dos descontos personalizados passam a frequentar a loja mais vezes do que os clientes que não utilizam o app.

Programas de fidelidade do GPA

11 milhões no Clube Extra. 6,5 milhões no Pão de Açúcar Mais. Vendas identificadas dos clientes Pão de Açúcar Mais – 2017: 76% / 2019: 85%. Vendas identificadas dos clientes do Clube Extra – 2017: 47% /2019:55%. Teodoro Ornelas, Diretor de Fidelidade do GPA, explica que os dados capturados pelos programas de fidelidade do grupo permitem entender o comportamento do consumidor no longo prazo. “Antes, estas análises eram feitas prioritariamente no nível “tíquete”, ou seja, capturavam o comportamento momentâneo do cliente, compra a compra.

Com os dados do programa de fidelidade, passamos a entender melhor quais são as respostas de longo prazo, o que permite ajustar nossa precificação com base nesse histórico”, explica Ornelas afirma que os programas de fidelidade são a principal ferramenta de captura de dados e a fonte de matéria prima que serve para que os analistas de dados e os complexos algoritmos possam trabalhar. “Os programas de fidelidade passaram a ocupar, em especial, no varejo alimentar, um espaço que antes era exclusivamente preenchido pelos fornecedores e lojas como fonte de “insights” para a criação ou readequação de produtos e serviços”, explica.

Migração de dados entre setores

As redes de farmácia nos Estados Unidos estão em estado avançado de captação de dados por conta da cultura americana de consumo de medicamentos, mas também pela enorme presença física e digital de players como Walgreen e CVS, essa última era dona brasileira Onofre, uma das redes de farmácia nacionais com maior presença digital. Neste ano, a rede foi vendida para a Raia Drogasil. “A gente entendeu que, com a Onofre, vamos ter oportunidade de aperfeiçoar a questão do estudo dos dados porque ela trabalha há 15 anos com isso, então certamente a gente tem muita coisa a tirar de lá”, afirmou ao portal NOVAREJO o presidente do Conselho de Administração da Raia Drogasil, Antonio Carlos Pipponzi. A RD quer estender o domínio que ela tem no varejo físico de medicamentos para o on-line.

A CVS Health, que vendeu a Onofre à raia Drogasil, está engajada na intenção de criar um complexo ecossistema de inovação ao redor de si e, ao fim de 2018, concretizou a fusão da sua operação com a empresa americana de planos de saúde Aetna em uma operação de 69 bilhões de dólares. A fusão foi contestada por conta do excessivo poder que a empresa passaria a ter sobre os dados de saúde dos cidadãos americanos e sobre a delicada questão de fundir dados do histórico de compras nas farmácias para modelar planos de saúde. Por outro lado, os envolvidos afirmam que essa personalização pode baratear o custo dos tratamentos com a customização de planos e medicamentos.

Por aqui, esse tipo de fusão é menos provável, afirma Pipponzi. “Aqui é mais difícil por conta do regulatório, que é muito grande. Acho que é preciso vencer algumas barreiras para ter uma integração maior da cadeia de saúde, aumentando os resultados para as empresas e reduzindo o custo dos serviços de saúde para os consumidores. Essa redução se dará, principalmente, pela troca de dados e informações entre os players para facilitar uma gestão preventiva da saúde”, avaliou o executivo.

Lojas digitais

Gustavo Schifino, curador do Web Summit e da NRF e head de DX da 4all, afirma que, até o ano de 1900, o mundo levava um século para dobrar as informações disponíveis. “Atualmente, são necessários 13 anos e, a partir de 2020 – graças ao 5G e o processador quântico –, o planeta verá a quantidade de dados dobrar a cada 12 horas”, avalia. Com a integração da base de dados do varejo com outros setores da economia, esse potencial deve ampliar exponencialmente nos próximos anos.

Isso está mudando radicalmente o papel do ponto de venda físico. Segundo Schifino, não há mais espaço para a loja que abre suas portas à espera do consumidor com estoque e prateleiras lotados. “Conhecer o cliente é uma realidade que já fazia parte da relação de consumo lá nos anos 1940, quando o dono do ‘secos e molhados’ chamava cada um pelo nome e sabia de sua vida. O problema é que a quantidade de informações aumentou exponencialmente”, afirma o especialista.

Para ele, a solução para o varejo será transformar a cultura das empresas para um mindset digital e, consequentemente, fazer das suas lojas, físicas e online, hubs de captação de dados. A Umclub é uma startup que tem como missão reduzir o impacto do avanço do online sobre o fluxo de clientes nos corredores de shoppings e no faturamento desses empreendimentos. Sua plataforma é uma espécie de marketplace de shoppings e reúne promoções de diferentes empreendimentos em um único app, com serviço de fidelização e personalização das ofertas.

Segundo Thiago Monsores, CEO da Umclub, a empresa consegue reduzir em 20% o custo dos empreendimentos com fornecedores de tecnologia com a concentração dos serviços em um único app compartilhado. “O aplicativo atua também como fonte de dados de BI, fornecendo relatórios com dias de maior fluxo, clientes mais assíduos e lucrativos, lojas que mais vendem, eficiência das campanhas, tipos de produtos mais consumidos e perfis de consumo por CPF, além de sugerir tendências de consumo”, afirma o executivo da startup. “É possível, ainda, alcançar novos clientes de gosto e perfil similares, ofertando oportunidades personalizadas por CPF, incentivar e reter clientes por meio de um programa de fidelização e cashback”, detalha o empreendedor.

Essa capacidade de integrar as informações que são captadas no online e no físico têm sido fundamentais ao setor de material de construção, um dos que mais sofreu com a crise econômica no Brasil por conta da paralisação do setor de construção civil. Juliano Ohta, presidente da Telhanorte, lembra que, uma loja de material de construção não é como um supermercado, onde se sabe que o consumidor procura com certa facilidade. “A gente está num setor em que o nosso cliente está numa jornada completamente diferente da jornada do colega que está passando com um carrinho ao lado dele na loja”, afirma.

Por meio da captação de dados, a Telhanorte é capaz de identificar o seu consumidor assim que ele entra na loja. Essa informação será combinada com as informações da experiência deste cliente no site da Telhanorte. “A gente tenta dar ao vendedor o máximo de informações possíveis. O vendedor da Telhanorte consegue ter acesso ao que o consumidor abandonou no seu carrinho na internet assim que ele entra na loja”, ilustra o executivo.

“O cliente chega aqui no meio da obra dele e o nosso vendedor já é capaz de identificar qual o momento da obra, o que ele comprou no passado e o que é melhor para ele oferecer para esse cliente naquele dado momento, porque daqui há uma semana ele vai estar em outra fase da obra”, completa Ohta. A capacidade de um varejista prever as necessidades dos seus clientes está diretamente relacionada à sua capacidade de captação de dados. Para isso, nada melhor do que ter uma ampla gama de clientes. A Telhanorte aponta mais de 20 milhões clientes por ano abastecendo a base de dados da empresa, além de 20 mil atendimentos mensais no SAC.

E as soluções em dados extrapolam os pontos de venda e se espalham pela cadeia logística. Por conta da tecnologia de rastreabilidade, o cliente da Telhanorte consegue acompanhar em tempo real o deslocamento do caminhão que carrega seus produtos. Com isso, a Telhanorte conseguiu diminuir em mais de 30% as ligações no SAC.

Para Ohta, os sinais preditivos, ou seja, aqueles insights racionalizados pela junção de informações em uma vasta base de dados, serão determinantes para que o varejo de construção se mantenha relevante diante de um consumidor que precisa que o varejista não lhe traga mais problemas que uma reforma ou uma construção já trazem naturalmente. “Certamente, a predição de demandas será um eixo de trabalho para os próximos anos, estamos apenas começando e é uma jornada fascinante porque vai facilitar de mais a jornada do cliente”, avalia.

Varejo como serviço

Schifino, da 4all, aponta que, depois da implementação da cultura digital e da transformação do ponto de venda físico, o próximo impacto da economia de dados sobre o varejo pode ser o aumento avassalador da desintermediação. “O marketplace permite que o varejista atue como um elo entre a indústria e o cliente, mas não é mais aquele que compra por X e precisa vender por 2X para ter margem de lucro de 10%. Agora, ele funciona como um retail as a service, sendo uma vitrine, uma curadoria, quem chancela a escolha”, afirma Bernardo Leão, gerente de CRM e novos negócios do e-commerce.

O e-commerce do Magazine Luiza terminou 2018 com faturamento de R$ 5,9 bilhões, ocupando 37,7% das vendas totais do grupo. E boa parte disso vem de terceiros. Para além de sua força como varejista de eletroeletrônicos, o Magazine Luiza está dedicado a se tornar um fornecedor de serviços ao varejo. A rede lançou recentemente seu serviço “Parceiro Magalu”, que vai funcionar como um marketplace invertido e permitir que varejistas vendam produtos do Magazine Luiza em sua loja física por meio do acesso desse lojista ao estoque do magazine.

“Essa modalidade foi pensada para ampliar o sortimento desse varejista por meio de um aplicativo que está conectado direto ao PDV físico, e ele consegue oferecer todo o sortimento online do Magazine Luiza”, explica Leão. “A ideia é criar todo um ecossistema e oferecer todas as soluções para os parceiros, é um movimento ambicioso no sentido de digitalizar todo o Brasil.

O “Parceiro Magalu” é uma das iniciativas do programa “Magalu as a service”, que foi impulsionado pela empresa este ano, depois de concluído o bruto da digitalização das lojas da rede em 2018. Assim como Alibaba na China e Amazon nos Estados Unidos, o Magazine Luiza busca ser, acima de tudo, uma fornecedora de tecnologia e inteligência de negócios por conta da sua rica base de dados a outros players do varejo. Esse deve ser o destino do grande varejo daqui em diante. A presença física das redes varejistas será convertida em um rico ponto de captação e tratamento de dados para que, a economia como um todo, conheça, cada vez mais o comportamento do consumidor.

Fonte: WHOW

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