São Paulo – “É extremamente frustrante você se candidatar a vagas e na maioria das situações não receber sequer uma resposta à sua apresentação”, diz Robert Hess. Há um mês e meio, no entanto, ele enfim conseguiu uma vaga de estágio da Unilever, pondo um fim ao calvário da busca de emprego.
A dificuldade de encontrar trabalho, realidade para 12,6 milhões de brasileiros, atinge em cheio quem está começando a carreira e, portanto, ainda não tem experiência para comprovar. Mas não só os novatos. Os veteranos, com currículos mais robustos, também enfrentam situação notoriamente crítica no mercado de trabalho.
Hess, o autor da frase que abre essa reportagem, tem 62 anos, e esteve nesses dois lugares de dificuldade ao mesmo tempo. Engenheiro mecânico e administrador, ele é um estagiário com experiência de gerente geral em duas empresas.
Embora, pesquisa do Ipea mostre que o crescimento do desemprego de longo prazo é maior entre os jovens, 27,3% dos desocupados com mais de 40 anos insistem sem sucesso na busca por trabalho há pelo menos dois anos. No caso de Hess, foi preciso recomeçar uma nova carreira do zero.
“A iniciativa de voltar à sala de aula me abriu a possibilidade de poder participar desta iniciativa da Unilever com o seu programa para Estagiários Seniores”, diz ele que é estudante de ciências contábeis.
A Unilever criou programa específico para contratar profissionais com mais de 50 e o interesse no programa dá a dimensão da necessidade de ações voltadas esse grupo etário. “A divulgação começou a ser feita em maio de 2019 e teve grande repercussão, com alcance cinco vezes maior se comparado ao programa de estágio tradicional. Recebemos mais de 1.000 inscrições”, diz Fernando Rodrigueiro, diretor de Recursos Humanos da Unilever.
O programa Senhor Estagiário da Unilever segue as mesmas premissas de um programa de estágio tradicional só que com o público alvo veterano. “É para desenvolver e preparar profissionais para o mercado de trabalho. O principal foco do programa é a inserção de pessoas com mais de 50 anos que voltaram a estudar em busca de novas oportunidades”, diz Rodrigueiro. O processo seletivo não requer experiência profissional anterior, como acontece com programas de estágio tradicionais. Mais informações sobre podem ser encontradas no site da Unilever
Rogério Galeto Ramos, de 70 anos, assistente administrativo no Centro de Excelência da Votorantim em Curitiba (PR) também enxerga semelhanças entre os desafios enfrentados por ele e pelos jovens no mercado de trabalho. “Encontrar um emprego na terceira idade é a mesma coisa que acontece com o primeiro emprego. Não olham a experiência, mas apenas enxergam a idade”, diz.
Ele é um dos 12 profissionais recrutados pela Votorantim por meio do programa MIME: Melhor idade, melhor emprego. As vagas do MIME são para trabalhar em Curitiba e podem participar profissionais acima de 45 anos, próximos da aposentaria ou aposentados que buscam uma renda complementar.
O horário de trabalho do programa da Votorantim, implementado em 2010, é após às 17hs, para possibilitar que os funcionários possam ter outras atividades durante o dia. “Sou aposentado desde 2009 e durante o dia cuido dos meus netos”, diz Ramos. As vagas para o MIME podem ser conferidas pela plataforma Kenoby.
Empregando mais de 1,8 mil funcionários com mais de 50 anos, a Gol lançou em 2017 o programa “Experiência na Bagagem” para recrutar profissionais 50+ para todas as vagas na empresa. “Eles sabiam o que procuravam e buscavam pessoas como eu, com as minhas qualificações. Há vida útil no início da terceira idade”, diz Marli Elaine Da Silva, de 56 anos, contratada como auxiliar de aeroporto.
Profissionais na faixa etária de Marli já eram valorizados pela Gol antes mesmo de surgir da criação do programa de recrutamento, garante Jean Nogueira, diretor de Gente e Cultura da GOL. Estudos internos da empresa indicaram que os funcionários mais velhos tinham mais do que só bagagem de currículo: eram mais comprometidos e motivados. “Observamos também que eles têm aptidão para assumir postos que em outras ocasiões exigiriam treinamento prévio para pessoas mais jovens “, diz o diretor da Gol. As oportunidades do programa são anunciadas pelo Vagas.com.
A satisfação de estar trabalhando transparece em todos os depoimentos colhidos por EXAME. “Estou muito feliz, amando o ambiente de trabalho”, diz Jardelina de Oliveira, recepcionista da Vivo, desde junho deste ano.
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Seu maior medo era justamente continuar fora do mercado de trabalho, aos 62 anos. “Quando se trabalha desde jovem, a gente se sente quase inútil por não estar mais trabalhando. Eu precisava trabalhar, tanto pela necessidade financeira quanto pela de se sentir viva, aceita e capaz”, diz Jardelina.
O projeto 50+ da Vivo tem estimulado a contratação em lojas da operadora de pessoas nessa faixa etária. “Temos mais de 20 colaboradores no projeto”, diz Niva Ribeiro, VP de Pessoas da Vivo. Na empresa, 6% dos colaboradores têm mais de 50 anos e interessados em aumentar esse contingente podem conferir oportunidades divulgadas na plataforma Gupy.
A troca de conhecimento entre as gerações é a principal vantagem da diversidade etária para os negócios, segundo a executiva da Vivo. “Eles possuem várias qualidades complementares aos jovens, tanto pessoal quanto profissional, trazendo elementos fundamentais para o negócio”, diz ela que também cita o comprometimento como vantagem competitiva dos mais velhos.
Iniciativas de inclusão dos mais velhos no mercado são tão necessárias quanto urgentes no Brasil que está envelhecendo. Em 2030, 29,6 milhões de pessoas terão mais de 60 anos no país que terá a quinta população mais idosa de todo mundo. Abraçar a causa da longevidade é a missão da Maturijobs que, desde 2015, conecta profissionais com mais de 50 a empresas com vagas para eles.
Foi pela plataforma que Marisa Lopes, de 61 anos, conseguiu emprego, após ouvir “não” mais de dez vezes de empresas para as quais se candidatou.
“Todos esses ‘nãos’ aconteciam depois que eu revelava minha idade no primeiro contato telefônico dos recrutadores comigo. Nem chegávamos a falar pessoalmente”, conta ela que está trabalhando como consultora na área de qualidade da Mundipharma.
A chefe de recursos humanos da Mundipharma Brasil para a América Latina, Karina Freitas, diz que recrutar profissionais mais experientes tem sido um sucesso. Além de Marisa, mais um colaborador conseguiu emprego no setor de finanças da empresa com a conexão via Maturijobs. “Nosso aprendizado é que a maturidade traz sabedoria de vida, além das competências técnicas e isso é muito enriquecedor para todos”, diz Karina.
O que eles ensinam e o que aprendem
A seguir confira o que quatro profissionais, de 50 a 70 anos, de diferentes áreas e empresas dizem ensinar e aprender com as novas gerações:
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